O Estado de São Paulo, n.46168, 13/03/2020. Política, p.A4

 

Sob risco de coronavírus, Bolsonaro desmobiliza atos

Jussara Soares

13/03/2020

 

 

Saúde. Após tratar pandemia como “fantasia”, presidente sugere em pronunciamento na TV o adiamento de manifestações de rua que têm como alvo Congresso e Judiciário

Alvorada. Bolsonaro caminha ao lado de funcionário com máscara e do filho Eduardo após fazer teste para coronavírus

Tratado como “fantasia” pelo presidente Jair Bolsonaro há três dias, o coronavírus contaminou um dos principais auxiliares do Planalto e levou ao adiamento de atos em defesa do governo marcados para domingo. O secretário de Comunicação da Presidência, Fabio Wajngarten, que viajou com Bolsonaro para os Estados Unidos, foi diagnosticado com a doença ontem, como antecipou o Estadão.com.br. O presidente deve receber hoje o resultado do exame que dirá se ele também contraiu a enfermidade. No fim do dia, Bolsonaro foi à TV para sugerir que as manifestações fossem adiadas.

A comitiva brasileira viajou no sábado e voltou para o Brasil entre terça e quarta-feira. Além de Bolsonaro e Wajngarten, outros ministros e políticos estiveram nos Estados Unidos.

Depois de resistir à ideia de cancelar os atos ao longo do dia, líderes dos principais movimentos que convocaram protestos contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) concordaram com o adiamento. Eles pretendem fazer mobilizações virtuais na internet no domingo. “Vamos seguir o pedido do governo federal. Decidimos criar uma hashtag (palavra-chave) no dia 15 e pedir que todos usem camiseta do Brasil”, disse Tomé Abduch, porta voz do movimento Nas Ruas. “É um adiamento, não um cancelamento. Ainda não temos data para a próxima manifestação.”

Embora tenha sugerido o adiamento dos atos, o presidente afirmou ontem que eles “atendem aos interesses da nação” e foram “um tremendo recado para o Parlamento”. Ontem, Bolsonaro tratou do adiamento das manifestações em dois momentos. Primeiro, na transmissão ao vivo que faz todas as quintas-feiras nas redes sociais , sugeriu adiar ou suspender as manifestações pró-governo para daqui “um ou dois meses”. “Uma das ideias é adiar, suspender, e daqui um mês, dois meses se faz. Já foi dado tremendo recado ao parlamento no tocante daquelas emendas de relator, se ele vai ter autonomia para movimentar em média R$ 15 milhões”, disse.

Na transmissão, o presidente, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e a intérprete de libras estavam usando máscaras cirúrgicas.

A segunda manifestação de Bolsonaro sobre o assunto foi em rede nacional de rádio e TV, sem máscara. “Os atos de domingo precisam, diante dos fatos recentes, serem repensados”. disse o presidente, que prosseguiu dizendo que o momento é de “união, serenidade e bom senso”. “Não podemos esquecer, no entanto, que o Brasil mudou, o povo está atento exige de nós respeito à Constituição e zelo pelo dinheiro público. Por isso, as motivações da vontade popular continuam vivas e inabaláveis”, finalizou.

Vídeo. Em 25 de fevereiro, Bolsonaro enviou vídeos com convocações para os atos de seu contato pessoal do Whatsapp, como revelou o site BR Político, do Grupo Estado. O pano de fundo para os atos era a discussão no Congresso sobre o controle de até R$ 19 bilhões do Orçamento federal. Os parlamentares queriam ser responsáveis por decidir onde o dinheiro seria usado, mas o presidente vetou esse dispositivo. No sábado, Bolsonaro gravou um vídeo para convocar a população às ruas. Anteontem, negou que tenha chamado para o ato.

Ao falar sobre a crise que envolve o avanço do coronavírus no País, Bolsonaro disse que a Organização Mundial da Saúde (OMS) mudou a classificação da doença para pandemia e que é provável que novos casos apareçam no Brasil, o que não dá motivos para pânico.

“Problemas estamos tendo pela frente: a questão da Bolsa de Valores, que despenca, dólar que sobe. Isso está acontecendo no mundo todo”, disse. “Medidas econômicas a equipe tem tomado; agora, não somos aquelas potências que têm recursos em abundância, como os EUA, que podem socorrer com muito mais propriedade as pequenas empresas. Temos orçamento bastante engessado.”

'Recados'

“(Os atos) atendem aos interesses da nação e demonstram amadurecimento da democracia.” 

“Já foi dado tremendo recado ao parlamento no tocante daquelas emendas de relator.”

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA