Valor econômico, v.21, n.5044, 16/07/2020. Política, p. A15

 

Moraes dá à PF acesso a dados sobre perfis falsos no Facebook

Isadora Peron

16/07/2020

 

 

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a Polícia Federal (PF) a ter acesso aos dados da investigação do Facebook que derrubou uma rede de contas e perfis falsos ligados a integrantes do gabinete do presidente Jair Bolsonaro, seus filhos e aliados.

A decisão de Moraes é da semana passada, mas só foi tornada publica ontem.

A ideia é que os dados, que ainda precisam ser repassados pelo Facebook, sejam usados tanto no inquérito das “fake news”, que apura ofensas e ataques a ministros da Corte, quanto no que investiga a organização e o financiamento de manifestações antidemocráticas.

Os dois inquéritos são relatados por Moraes, correm sob sigilo e miram aliados de Bolsonaro.

A decisão do ministro se deu após um pedido feito pela delegada Denisse Dias Ribeiro, no âmbito do inquérito que investiga os atos antidemocráticos. Na peça enviada ao Supremo, a PF argumentou que a decisão precisava ser urgente, para que os dados não fossem apagados.

Para uma fonte da PF, trata-se de uma pedido natural e necessário para aprofundar as investigações em curso.

Na semana passada, o Facebook excluiu 35 contas, 14 páginas e 1 grupo da rede social sob a justificativa de “comportamento inautêntico coordenado”, termo usado para designar a prática de atuar em conjunto para enganar quem consome conteúdo nas plataformas da empresa. A tática está associada à disseminação de notícias falsas. Essa mesma rede bolsonarista teve conteúdos removidos antes, por pregar “discurso de ódio”.

Segundo a empresa, a rede desarticulada era acompanhada por 883 mil pessoas no Facebook, 917 mil no Instagram e reunia 350 participantes em um grupo no Facebook.

De acordo com a investigação, as pessoas envolvidas na rede usavam recursos para ocultar a identidade. Foram encontradas ligações entre os coordenadores dos perfis e páginas e os gabinetes do presidente e de seus filhos, Flávio e Eduardo Bolsonaro, além dos deputados estaduais Alana Passos e Anderson Moraes (PSL-RJ), e de nomes ligados ao PSL, partido pelo qual o presidente se elegeu.

Estudo do Atlantic Council’s Digital Forensic Research Lab (DFRLab), feito em parceria com o Facebook, mostra ainda que há ao menos um funcionário direto de Bolsonaro envolvido no esquema. É o assessor especial da Presidência Tercio Arnaud Tomaz, que recebe salário mensal de R$ 13,6 mil. Arnaud trabalhou antes para o gabinete do vereador Carlos Bolsonaro, e é apontado como líder do chamado "gabinete do ódio", estrutura paralela de comunicação do Palácio do Planalto que seria usada para atacar adversários do governo.

Paulo Eduardo Lopes, conhecido como Paulo Chuchu, também aparece no estudo como um dos coordenadores da rede de disseminação bolsonarista. Ele é funcionário do gabinete de Eduardo Bolsonaro na Câmara e líder do Aliança pelo Brasil em São Bernardo do Campo (SP) - partido que os Bolsonaros tentam tirar do papel.

As investigações do inquérito das “fake news” apontam para a “real possibilidade de existência de uma associação criminosa”, que Moraes relaciona ao chamado “gabinete do ódio”. Em maio, o ministro autorizou uma série de diligências e disse que há indícios de que um grupo de empresários atua de maneira velada financiando a disseminação de notícias falsas e ataques contra integrantes da Corte e outras instituições.