Valor econômico, v.21, n.5042, 14/07/2020. Brasil, p. A10

 

Evasão escolar gera perda anual de R$ 214 bilhões

Hugo Passarelli

14/07/2020

 

 

A evasão escolar gera uma perda de R$ 214 bilhões ao ano para os jovens e a sociedade, segundo estudo da Fundação Roberto Marinho e do Insper. Mantido o ritmo atual, 17,5% dos que hoje têm 16 anos não irão completar a educação básica até os 25 anos. Isso representa um contingente de 575 mil pessoas sem escolaridade completa todos os anos. O tema ganha mais relevância em meio à pandemia da covid-19, que deve puxar outra onda de abandono.

A estimativa considera o impacto monetário da interrupção dos estudos ao longo da vida do jovem, trazido a valores de hoje. Cada jovem tem um prejuízo para si e para a sociedade que totaliza R$ 372 mil ao ano. É quatro vezes mais o que o Estado investe por estudante, da educação infantil ao ensino médio.

“Custa muito menos fazer a coisa certa, manter o jovem estudando, ter escola de boa qualidade e ter uma agenda que enfrente os problemas que realmente existem, sem criar outros” diz Wilson Risolia, secretário-geral da Fundação Roberto Marinho. O estudo “Consequências da Violação do Direito à Educação” será lançado hoje.

Ricardo Paes de Barros: “É como uma obra inacabada, que se tivesse acabado teria um tremendo impacto” — Foto: Silvia Zamboni/Valor

O cálculo evidencia a baixa qualidade dos gastos do governo. “A máquina pública, em geral, é ineficiente. Na educação, há problemas diversos, como formação inadequada dos professores e indicação política de diretores. É difícil quebrar isso, mas não podemos perder R$ 214 bilhões ao ano em um sistema que não funciona”, afirma Risolia.

A cifra total equivale a 70% do que a União, Estados e municípios investem todos os anos na educação pública, sem contar o ensino superior, ou o mesmo que 3% do Produto Interno Bruto (PIB). “É como uma obra inacabada, que se tivesse acabado teria um tremendo impacto. A sociedade perde uma coisa gigante cuja maior parte dos recursos já foi até gasta”, afirma Ricardo Paes de Barros, economista e responsável técnico da pesquisa.

O maior revés da evasão aparece na remuneração futura do jovem no mercado de trabalho, cujo salário é até 25% menor do que seria se tivesse terminado a educação básica. Acumulado ao longo da vida, isso se traduz em uma diferença de R$ 159 mil (ou 37% a menos) em relação à remuneração de pessoas com a mesma idade e estudo completo.

“Mas se trata de um cálculo do que ele vai ganhar de dinheiro espaçado ao longo da vida. Isso ainda não aconteceu, logo ainda dá tempo de salvar esse jovens”, afirma Paes de Barros. Além de salários menores, essa parcela da população vai passar 10% a menos da vida produtiva ocupada. E, mesmo com emprego, o período em vagas formais deverá ser 20% menor. O estudo simulou os impactos da evasão escolar a partir do Censo Escolar e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), entre outras fontes.

O abandono escolar também influencia a expectativa de vida: são quatro anos a mais para quem conclui a educação básica. Ainda há efeitos que atingem os jovens e também são compartilhados com toda a sociedade, como a qualificação da força de trabalho e os índices de violência.

O estudo lembra que os que terminam a escola tendem a ter menor envolvimento com atividades violentas. Trazido para o ambiente escolar, cada ponto percentual de redução da evasão significa 550 homicídios a menos por ano. Segundo o levantamento, a violência entre jovens tem custo anual de R$ 26 bilhões. Logo, a perda a ser evitada pela redução da criminalidade seria de R$ 45 mil por jovem.

A falta de contato com o ensino durante a quarentena ameaça piorar o quadro. Segundo a pesquisa “Juventudes e a Pandemia do Coronavírus”, 28% dos jovens pensam em não voltar para a escola quando a pandemia acabar. E, entre os que planejam fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), 49% já cogitam desistir, mostra o estudo, promovido pelo Conselho Nacional da Juventude (Conjuve), em parceria com Em Movimento, Fundação Roberto Marinho, Mapa Educação, Porvir, Rede Conhecimento Social, Unesco e Visão Mundial.