Valor econômico, v.21, n.5038, 08/07/2020. Política, p. A7

 

Bolsonaro diz que está com Covid-19 e minimiza a doença

Matheus Schuch

Fabio Murakawa

08/07/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que contraiu a covid-19. A declaração foi feita pelo presidente em uma minientrevista coletiva no Palácio da Alvorada transmitida ao vivo por algumas emissoras de TV. Bolsonaro fez do anúncio uma propaganda da cloroquina, remédio que vem patrocinando no combate ao novo coronavírus, além de desobedecer recomendações sanitárias e minimizar a gravidade da doença.

Na coletiva às redes Record, CNN e TV Brasil, o presidente reforçou a tese de que a reação à doença no país foi exagerada. Bolsonaro retirou a máscara perto dos repórteres para mostrar que está com “cara boa” e afirmou que a ingestão de hidroxicloroquina melhorou seu estado de saúde.

Horas depois, o presidente postou um vídeo ingerindo uma dose do remédio, que não tem eficácia comprovada para covid-19. Nos próximos dias, Bolsonaro deve despachar de forma remota, a partir da residência oficial.

Logo após a entrevista, o Planalto apresentou uma cópia do exame realizado pelo presidente em um laboratório particular de Brasília. O documento apresentava seu nome verdadeiro, diferente dos testes com identificação fictícia realizados em março, quando as suspeitas de que Bolsonaro estava com o vírus não se confirmaram. À época, ele só mostrou os resultados após ser obrigado pela Justiça.

No início desta semana, o presidente começou a sentir um mal-estar, mas manteve as agendas de segunda-feira. Ao perceber uma piora no quadro, decidiu ir ao hospital.

“Começou domingo, com certa indisposição, e se agravou na segunda, com mal-estar, cansaço, com um pouco de dor muscular e a febre no final da tarde chegou a bater 38 graus”, contou.

Os exames de imagem, segundo o presidente, mostraram “pulmões limpos”. Na madrugada seguinte, ele relatou que já não sentia dores.

“Estou muito bem, credito isso não só ao atendimento dos médicos, mas pela forma como ministraram a hidroxicloroquina, que a reação foi quase de imediato”, disse. “Reforço aqui o que médicos têm dito pelo Brasil todo, eu não sou médico, sou capitão do Exército. A hidroxicloroquina, na fase inicial, a chance de sucesso chega perto de 100%.”

A defesa enfática do uso do medicamento opôs Bolsonaro e os dois titulares que passaram pelo Ministério da Saúde em seu governo. Por essa e outras divergências, Nelson Teich e Luiz Henrique Mandetta deixaram o cargo, hoje ocupado de forma interina pelo general Eduardo Pazuello.

Bolsonaro disse ter recebido o diagnóstico com “naturalidade” e afirmou que acredita que será algo inevitável para a maioria da população. “Eu confesso que achava que já tinha pego lá atrás, tendo em vista minha atividade muito dinâmica perante a população”, admitiu.

O presidente, que já chamou a doença que matou mais de 66 mil pessoas no país de “gripezinha” e disse ser resistente por ter “histórico de atleta”, voltou a criticar as medidas de isolamento social.

“O pânico também mata, este vírus é quase como uma chuva, vai atingir você, alguns têm que tomar o maior cuidado, mas ele infelizmente acontece”, afirmou.

Nos últimos dias, Bolsonaro encontrou-se com dezenas de integrantes do governo, empresários, autoridades e apoiadores. No sábado, o presidente participou de um almoço na residência do embaixador dos Estados Unidos, Todd Chapman, onde eles posaram para fotos sem máscaras. Chapman e sua esposa testaram negativo para a doença. Também presentes à confraternização, os ministros Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) fizeram testes que não detectaram o vírus. Outros integrantes do governo estão sendo testados.

Questionado sobre o afastamento preventivo de quem esteve com Bolsonaro, o Planalto alegou que “não há protocolo médico, seja do Ministério da Saúde ou da OMS, que recomende medida de isolamento pelo simples contato com casos positivos”.