O Estado de São Paulo, n.46251, 04/06/2020. Metrópole, p.A14

 

2 mil voluntários brasileiros vão testar vacina de Oxford contra covid-19

Roberta Jansen

04/06/2020

 

 

Brasil é o primeiro país fora do Reino Unido a participar da testagem. Os testes serão coordenados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e vão incluir mil pessoas em São Paulo e outras mil no Rio. Expectativa é de que resultados saiam ainda neste ano

Fases. Resultado será essencial para registro do produto

O Brasil é o primeiro país fora do Reino Unido a participar da testagem. Os testes serão coordenados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Serão mil voluntários em São Paulo e outros mil no Rio, os dois Estados que concentram a maioria dos casos. O País foi escolhido para participar do teste porque a epidemia ainda está em ascensão por aqui – diferentemente do Reino Unido – e o vírus está circulando ativamente na população. Preferencialmente, serão escolhidos profissionais de saúde na linha de frente do combate à doença. Os voluntários devem ter entre 18 e 55 anos e nunca terem sido contaminados pelo novo coronavírus.

O recrutamento dos voluntários deve começar entre a segunda e a terceira semana de junho. Metade dos voluntários receberá a substância candidata à vacina e a outra metade, um outro imunizante. Ninguém será informado sobre que produto está recebendo.

Prazo. Cada um dos participantes será avaliado por até um ano. Como se trata de uma situação emergencial, resultados iniciais positivos podem acelerar o processo. “Até agora não houve nenhum problema de segurança com a vacina, que está na fase 3, para testar sua eficácia; é uma vacina extremamente promissora, que pode ser liberada para o uso ainda este ano”, explicou a imunologista Lily Yin Weckx, da Unifesp, que está coordenando o estudo no Brasil. “É uma honra participarmos da testagem de uma vacina que pode mudar o rumo da história mundial.”

A expectativa é de que, ao participar do teste, o Brasil ganhe alguma primazia no recebimento das primeiras doses do imunizante, no caso de o produto ser aprovado. Existe também a expectativa de que o País possa até mesmo participar, futuramente, da produção do imunizante em larga escala. “Isso não está acertado ainda, mas existe essa expectativa”, afirmou a reitora da Unifesp, Soraya Smali. “E o Brasil tem uma grande tradição na produção de imunizantes, tanto na Fiocruz quanto no Instituto Butantã.”

A vacina é feita a partir de um vírus (adenovírus) atenuado da gripe comum que infecta macacos. Esse vírus serve de vetor para levar ao organismo humano uma cópia produzida em laboratório de uma proteína presente no novo coronavírus. A ideia é que o organismo começará a produzir anticorpos capazes de reconhecer e atacar o vírus verdadeiro em caso de uma infecção real. O objetivo é testar a vacina em 10 mil pessoas nesta fase 3. Há outros países cuja participação está em processo de análise e aprovação. Os resultados desses testes serão primordiais para o registro da vacina no Reino Unido, previsto para o fim deste ano. Entretanto, o registro formal deve acontecer apenas após a conclusão dos estudos realizados em todos os países participantes.

Marco. Para Denis Mizne, diretor executivo da Fundação Lemann, organização que ofereceu os recursos (cujo montante não foi divulgado) necessários à realização de parte do estudo, “inserir o Brasil no panorama de vacinas contra a covid-19 é um marco importante para nós, brasileiros, e acredito que poderemos acelerar soluções que tragam bons resultados e rápidos”.

Em fase clínica

10 mil

Voluntários já testam a vacina na Europa.

2 mil

Voluntários serão testados no Brasil.

AS ETAPAS

•  Laboratório

Primeiro, são avaliadas em laboratório milhares de moléculas para se definir a melhor composição de uma vacina. No caso de Oxford, o imunizante é feito a partir de um vírus (adenovírus) atenuado da gripe comum que infecta macacos.

•  Fase pré-clínica

Após a definição dos melhores componentes para a vacina, são realizados testes em animais para comprovação dos dados obtidos em experimentações in vitro. Também é checada a segurança do produto, em geral em primatas não humanos.

•  Testes em humanos

Centenas de voluntários são escolhidos de forma aleatória, incluindo alguns pertencentes a grupos de risco, para receber a dose. No caso do Brasil, serão mil voluntários em São Paulo e mil no Rio. Se obtiver sucesso, a vacina será submetida às autoridades regulatórias.

•  Fabricação

É feita a produção em larga escala, controle de qualidade e acompanhamento para detectar possíveis efeitos adversos.