O Estado de São Paulo, n.46250, 03/06/2020. Política, p.A8

 

Inquérito vai apurar vazamento de dados de Bolsonaro

Jussara Soares

03/06/2020

 

 

Perfis que divulgaram as informações dizem ser ligados a grupo hacker; presidente fala em tentativa de ‘intimidação’

O Ministério da Justiça determinou a instauração de um inquérito para apurar o vazamento de supostos dados do presidente Jair Bolsonaro, de seus filhos, de ministros e aliados. O pedido da investigação pela Polícia Federal foi confirmado ao Estadão pelo ministro da Justiça, André Mendonça, ontem.

A divulgação dos dados ocorreu na noite de anteontem, em perfis no Twitter que dizem ser ligados ao grupo hacker Anonymous Brasil. Além de Bolsonaro, dados atribuídos a Carlos, Eduardo e Flávio e aos ministros Damares Alves e Abraham

Weintraub também foram expostos. Uma das contas que vazaram informações foi suspensa logo depois e o site em que estavam armazenadas saiu do ar. Entre os dados vazados estão emails, telefones, endereços, perfil de crédito, renda, nomes de familiares e bens declarados.

O Anonymous atua em outros países e ressurgiu no domingo, após a morte de George Floyd durante uma abordagem policial nos Estados Unidos. A conta que vazou supostos dados de autoridades brasileiras ontem estava sem publicar no Twitter desde outubro de 2018. No domingo, anunciou a volta.

No Twitter, Mendonça afirmou que “as investigações (sobre o vazamento de informações) devem apurar crimes previstos no Código Penal, na Lei de Segurança Nacional e na Lei das Organizações Criminosas”. O Palácio do Planalto e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) não se manifestaram oficialmente sobre o vazamento até a conclusão desta edição. Em reservado, auxiliares, no entanto, confirmaram que os dados são de Bolsonaro, mas disseram que estão desatualizados.

O presidente afirmou, via redes sociais, que o episódio de vazamento é “clara medida de intimidação” do grupo hacker. “Medidas legais estão em andamento, para que tais crimes não passem impunes”, disse Bolsonaro no Facebook.

O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) confirmou que os dados são verdadeiros. “A turma ‘pró-democracia’ vazou meus dados pessoais e de outros na internet. Após termos violações do direito à livre expressão, agora ferem a privacidade. Sob a desculpa de ‘combater o mal’, justificam seus crimes e fazem aquilo que nos acusam, mas nunca provam”, disse Carlos, em referência ao inquérito no Supremo Tribunal Federal que apura fake news.

Na tarde de ontem o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) afirmou que, assim como o irmão e senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), iria à polícia registrar queixa. Flávio, no Twitter, atribuiu o vazamento a “marginais ‘pró-democracia’” e disse que a PF já começou a identificar os responsáveis.

‘Risco’. Além de Bolsonaro e seus filhos, teriam sido alvo do grupo hacker o deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP), aliado do presidente, e o empresário Luciano Hang, dono da Havan. Garcia também já havia confirmado o vazamento de seus dados pelo grupo. “Anonymous Brasil, de forma criminosa, acaba de divulgar todos os meus dados nas redes sociais. Para que colocar os meus familiares em risco? Para que divulgar o endereço de minha casa? Os lugares em que trabalhei? Estou indo agora mesmo na delegacia fazer um boletim de ocorrência”, escreveu o deputado.

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos não confirmou a autenticidade dos dados atribuídos a Damares, mas divulgou nota na qual fala em “clara violação aos direitos fundamentais à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem”.

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Decano nega pedido de apreensão de celular de presidente

Rafael Moraes Moura

03/06/2020

 

 

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, arquivou anteontem o pedido apresentado por partidos da oposição para apreender os celulares do presidente Jair Bolsonaro e de seu filho, vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Celso, no entanto, alertou o presidente de que descumprir ordem judicial implica “transgredir a Constituição, qualificandose, negativamente, tal ato de desobediência presidencial”, o que configuraria crime de responsabilidade. No fim de maio, Bolsonaro disse que, mesmo que houvesse decisão judicial, não entregaria seu aparelho. “Tá na cara que eu jamais entregaria meu celular. A troco de quê?”, afirmou.

PDT, PSB e PV haviam solicitado ao STF a apreensão dos aparelhos na investigação sobre suposta interferência política do presidente na Polícia Federal. Celso concordou com a posição do procurador-geral da República, Augusto Aras, de que cabe ao Ministério Público solicitar diligências, e não a terceiros.