O Estado de São Paulo, n.46249, 02/06/2020. Metrópole, p.A17

 

Distância de 2 metros, máscaras e óculos podem reduzir contágio

Giovana Girardi

02/06/2020

 

 

Análise publicada pela ‘Lancet’ com base em mais de 200 estudos em 16 países indica benefício dessas estratégias

No momento em que vários países e Estados brasileiros iniciam seus processos de reabertura, após período de isolamento para conter o coronavírus, um novo estudo traz evidências sobre o quanto o distanciamento, o uso de máscaras e proteção para os olhos ajudam a reduzir a dispersão da covid-19.

A análise, publicada ontem na revista médica Lancet, traz uma revisão de mais de 200 estudos observacionais e comparativos que avaliaram a efetividade dessas medidas protetivas em 16 países. Os autores apontam que manter um distanciamento social de pelo menos 1 metro – mas, idealmente, de 2 –, usar máscaras faciais e proteção para os olhos têm bons efeitos contra a covid-19, a Sars e a Mers (doenças causadas por outros coronavírus).

O distanciamento é, sozinho, o que mais protege. Mas os autores alertam que mesmo a combinação de todas as intervenções não é garantia de não haver contaminação. “Outras medidas básicas, como higiene das mãos, são necessárias em conjunto”, escrevem os autores.

A equipe internacional de pesquisadores, liderada por Holger Schünemann, da Universidade McMaster, no Canadá, avaliou a capacidade dessas medidas de proteção em evitar a transmissão entre pacientes com infecção confirmada ou provável pelas três doenças e indivíduos próximos, como cuidadores, parentes e profissionais de saúde.

Em nove estudos, com 7.782 pessoas, que analisaram para a covid-19, a Sars e a Mers no impacto da distância na transmissão dos vírus, observou-se que manter uma distância superior a 1 metro de outras pessoas estava associado a um risco muito menor de infecção (2,6%) em comparação com quem estava a menos de 1 metro (12,8%).

A modelagem sugere ainda que para cada metro mais longe, até 3 metros, o risco de infecção ou de transmissão pode cair pela metade. Nenhum estudo mediu se distâncias superiores a 2 metros eram mais efetivas, mas a análise permite pressupor que sim.

Sobre a proteção para os olhos, como o uso de viseiras (face shields), óculos de proteção e óculos normais, também se notou que eles ajudam a reduzir as chances de transmissão: 5,5% para quem usava, ante 16% em que estava sem nada. Foram avaliados 13 estudos, com 3.713 pacientes, para os três vírus.

Outros dez trabalhos, com 2.647 participantes, indicam que a chance de transmissão em quem usa máscara é de 3,1%, ante 17,4% para quem não usava. Máscaras do tipo N95 conferem maior proteção que as máscaras cirúrgicas ou similares.

Mas para o público mesmo máscaras cirúrgicas descartáveis ou de algodão reutilizáveis, com 12 a 16 camadas, são recomendáveis. Os pesquisadores alertam, porém, para o risco de esses suprimentos faltarem para os profissionais de saúde.

Extra. “As pessoas também devem ter em mente que usar uma máscara não é uma alternativa ao distanciamento físico, proteção para os olhos ou medidas básicas, como higiene das mãos, mas pode adicionar uma camada extra de proteção”, comentou Derek Chu, da Universidade McMaster e primeiro autor do trabalho. Os autores ponderam que o grau de confiança nos dados é moderado para o distanciamento físico e baixo para máscaras e protetores visuais. Isso porque os estudos revisados não são randomizados (em que existe grupo controle, por exemplo). Mas eles destacam que o trabalho pode servir como guia de políticas públicas.

Para a pesquisadora Raina MacIntyre, da Universidade de New South Wales, na Austrália, que não participou do estudo, mas assina um comentário na Lancet, o trabalho representa um marco. “Eles apontam que máscaras multicamadas são mais protetoras. Essa descoberta é vital para orientar a proliferação de modelos de máscaras de pano caseiras, muitas das quais são de camada única.”

Recomendação

“Uma máscara de pano bem projetada deve ter tecido resistente à água, várias camadas e bom ajuste facial.”

Raina MacIntyre

PESQUISADORA DA NEW SOUTH WALES