Correio braziliense, n. 20870 , 14/07/2020. Cidades, p.15

 

Risco para todas as faixas etárias

Alan Riosa

Mariana Machado

14/07/2020

 

 

CORONAVÍRUS » A covid-19 provocou a morte de 219 moradores do Distrito Federal com menos de 60 anos, reforçando que a doença não é letal somente para idosos. Diante desse cenário, especialistas alertam para a importância do isolamento social durante a pandemia

Boa parte dos moradores do Distrito Federal flexibiliza o isolamento social com atividades não essenciais, como saídas desnecessárias, encontros com amigos e até festas durante a pandemia do novo coronavírus. Mas especialistas ressaltam que a doença não atinge somente idosos. No total, 64.575 pessoas com menos de 60 anos contraíram o vírus na capital. Dessas, 227 não sobreviveram. Mais de 200 vidas que se foram e deixaram histórias, famílias, amigos e sonhos. “A doença não escolhe e não há como prever quais contaminados vão ter um caso evoluindo para algo grave. Então, ninguém pode se descuidar”, alerta Valéria Paes, infectologista do Hospital Universitário de Brasília (HUB).

Os boletins epidemiológicos da Secretaria de Saúde mostram que duas crianças, cinco jovens de até 29 anos e 220 adultos de até 59 anos morreram em decorrência da covid-19 no DF. Além disso, a média de idade do total de casos confirmados é de 38 anos. “Qualquer pessoa pode contrair o vírus, tanto que temos observado vários profissionais da saúde jovens falecendo. Também temos de lembrar que há uma parcela considerável de pessoas com menos de 60 anos que têm comorbidades, como obesidade, câncer, doenças respiratórias e outras”, explica a infectologista. Valéria ressalta que a probabilidade de internação em casos de infecção em pessoas com doenças preexistentes é maior, o que deixa essas pessoas vulneráveis.

No Distrito Federal, o percentual da população com asma e câncer — 6% e 2,7%, respectivamente —, por exemplo, é maior do que média nacional, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), de 2013, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A capital tem, ainda, 5,8% de moradores com diabetes e 3,5% com doenças cardíacas. “E, mesmo que o jovem seja contaminado e a doença não se torne grave, ele pode participar da cadeia de transmissão e levar o vírus para alguém, que pode acabar tendo complicações. Por isso, não podemos nos arriscar ou confiar em medicações que não foram confirmadas como benéficas. O melhor para si e para o próximo é se prevenir”, reforça Valéria.

Valor da vida

Quem infectou-se com o novo coronavírus sabe que a condição é arriscada. O morador de Águas Claras Izaildo Feltrini tem 38 anos e foi internado em uma unidade de terapia intensiva (UTI) por complicações da doença. “Não sei ao certo se peguei o vírus no trabalho ou em algum supermercado, porque eu sempre cumpri as orientações certinho, mas sei que comecei a ter sintomas em 11 de junho. Quando fui ao hospital, descobri que tinha a covid-19 e 25% do meu pulmão estava comprometido. Então, mandaram-me para UTI”, conta o servidor público. Izaildo ficou 12 dias internado, com febre, falta de ar e medo.

“Foram dias dolorosos, o pulmão chegou a ficar quase 70% comprometido e, por pouco, não precisei ser entubado. Passava na minha cabeça que eu era jovem, saudável, só tinha uma asma, que estava controlada. Mas, graças a Deus, a equipe médica foi muito competente, conseguiu controlar o quadro na terceira medicação que tentaram e eu tive ajuda da fisioterapia para me recuperar”, revela.

Depois do susto, Izaildo virou exemplo para amigos, que passaram a redobrar os cuidados. “Vejo gente confraternizando, bebendo sem máscara, fazendo festa, mas só peço que essas pessoas tomem cuidado, porque, quem entra em uma UTI, não sabe se sai. Eu dou graças a Deus que consegui me livrar dessa doença e tive a oportunidade de viver mais, mas vi gente jovem morrendo, porque é um vírus que não sabemos como reagirá no corpo. Os cuidados que pedem, como usar máscara e se isolar, são poucos perto do valor da vida”, ressalta.

Além de jovens, pessoas que tiveram uma vida saudável podem não resistir ao novo coronavírus. A moradora de Planaltina Michele Venâncio, 35, perdeu o pai, de 53, para a covid-19. “Ele não tinha nenhuma comorbidade. Diabetes, hipertensão, nada. Era supersaudável, com aparência tão jovem, que as pessoas achavam que era meu namorado. Então, não dá para falar que é uma doença fraca ou que só vai ser ruim para quem é do grupo de risco, porque não era o caso dele”, diz a gerente.

Luto

O pai de Michel foi ao hospital quando teve um quadro de dengue, e a família acredita que ele contraiu o vírus na unidade de saúde. “Ele foi internado no Hospital Regional de Planaltina, mas não tinha leito. Entramos na Justiça e lutamos, mas não teve jeito, então, transferimos para um hospital particular de Taguatinga. Mas, infelizmente, o pulmão dele já estava muito comprometido”, lembra Michele.

Além da perda repentina, a família encarou o luto com distanciamento. “O sepultamento é a pior coisa do mundo. Eles colocam o caixão na capela e você tem de olhar do lado de fora. O corpo é enrolado em saco plástico. Você enterra um ente querido como se fosse um saco de lixo. É muito sofrimento”, desabafa a gerente. Michele também conta que a mãe foi infectada dias depois do pai e que os filhos tiveram que se manter fortes para cuidar dela. “Só depois que isso tudo passar, a gente vai poder sentir, mesmo”, lamenta.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

DF tem 930 mortes e 72,2 mil infectados

Alan Rios

14/07/2020

 

 

O número de mortes em decorrência do novo coronavírus no Distrito Federal aproxima-se dos milhares. Com mais 28 mortes ontem, no total, 930 pessoas morreram por causa da covid-19, sendo que 853 moravam na cidade e 77, em outras unidades da Federação, mas buscaram tratamento na capital. Homens são os que morreram mais, representando 58,8% dos falecimentos.

O perfil dos pacientes que não resistiram à doença também mostra que doenças cardíacas são as que mais agravam o quadro, pois, em 70,2% dos óbitos, a vítima tinha esse tipo de comorbidade. As confirmações da doença chegaram a 72.284 — 1.572 somente ontem —, com 58.385 infectados, mas recuperados. O dado representa 81% de curados.

Entre as regiões mais atingidas pela pandemia, Ceilândia, Plano Piloto, Taguatinga e Samambaia são, respectivamente, as cidades com mais casos. Proporcionalmente, porém, Sobradinho e Paranoá concentram mais diagnósticos positivos a cada 100 mil habitantes. Outro recorte importante é relativo à letalidade do vírus. Ele é mais fatal em Planaltina, Estrutural e Ceilândia, locais onde a porcentagem de mortes a cada infecção é maior, chegando a 2% dos casos. Para comparação, em regiões como Riacho Fundo 2 e Jardim Botânico, cerca de 0,5% dos contaminados falece.