Valor econômico, v.21, n.5019, 11/06/2020. Brasil, p. A2

 

Bolsonaro é democrata, diz embaixador a congressistas

Daniel Rittner

11/06/2020

 

 

O encarregado de negócios da Embaixada do Brasil em Washington, Nestor Forster, enviou ontem uma carta para 24 congressistas democratas em resposta às "fortes objeções" que eles manifestaram ao aprofundamento da parceria econômica e comercial dos Estados Unidos com o governo Jair Bolsonaro.

Os congressistas do Partido Democrata, que têm assento no Comitê de Orçamento e Tributos da Câmara dos Representantes, enviaram na semana passada ofício ao USTR (escritório de representação comercial da Casa Branca) com duras críticas à gestão Bolsonaro e se opondo a "parcerias econômicas de qualquer tipo" com o Brasil neste momento.

Para os parlamentares, o governo Bolsonaro demonstra, por meio da retórica e de ações, uma "completa desconsideração por direitos humanos básicos, pela necessidade de proteger a Floresta Amazônica, os direitos e a dignidade dos trabalhadores e [mantém] uma série de práticas econômicas "anticompetitivas".

Forster, cuja indicação como embaixador nos EUA aguarda aval do plenário do Senado, respondeu com uma carta de quatro páginas. Ela foi endereçada ao presidente da comissão, Richard Neal, com cópia para os demais 23 congressistas e para o chefe do USTR, Robert Lighthizer. O Valor teve acesso à correspondência.

O representante diplomático começa avaliando como "errôneas" afirmações contidas no ofício dos congressistas, que "parecem ser baseadas em deturpações e desinformação". "Por essa razão, eu gostaria de aproveitar a oportunidade para fornecer dados factuais que podem esclarecer mal entendidos", introduz Forster.

Na carta de resposta, o embaixador divide o texto em três pontos: democracia, estado de direito e relações Brasil-Estados Unidos; proteção de direitos constitucionais; e proteção da Amazônia e agricultura sustentável.

Na primeira parte, lembra que "55% dos brasileiros votaram por uma agenda de mudanças" e argumenta que Bolsonaro tem reafirmado seu "compromisso inequívoco" com valores democráticos. Na segunda parte, afirma que as políticas públicas do governo brasileiro estão "rigorosamente em linha" com a legislação nacional e internacional. "Nenhuma proteção de comunidades indígenas foi revogada pela atual administração", diz trecho da carta.

Na terceira parte, sobre a Floresta Amazônica, Forster cita operações de combate a queimadas e a criação do Conselho da Amazônia Legal como evidências da importância que o governo Bolsonaro atribui ao assunto. Afirma ainda que US$ 28 milhões em multas foram emitidas e cerca de 50 pontos usados para atividades ilegais foram destruídos.

A carta omite, no entanto, dados desfavoráveis à política ambiental no Brasil: o volume de multas aplicadas pelo Ibama caiu 25% em 2019, o desmatamento atingiu os maiores índices em dez anos e continua crescendo, Bolsonaro mandou ao Congresso um polêmico projeto de lei para regulamentar a exploração mineral em terras indígenas.

Forster ressaltou números positivos: "Agricultores na Amazônia são obrigados por lei a preservar 80% de vegetação nativa dentro de suas propriedades privadas. Como resultado, menos de 5% da produção brasileira de grãos é produzida na região". Ele também menciona que, entre 1990 e 2018, a produção de carne bovina cresceu 139% no Brasil, mas a área de pastagens de gado caiu 15% nesse mesmo período.

Ao concluir sua carta, o embaixador escreve que o intercâmbio comercial Brasil-Estados Unidos alcançou US$ 105 bilhões no ano passado, com mais de US$ 30 bilhões em superávit a favor dos americanos. Aponta ainda que multinacionais brasileiras aumentaram em 350% seus investimentos nos Estados Unidos na última década e hoje são responsáveis por mais de 100 mil empregos no país.

Termina dizendo que esses fatos que lhe fazem acreditar que uma ampliação da parceria econômica e comercial "se traduzirá em prosperidade e oportunidade para trabalhadores brasileiros e americanos". "Eu sinceramente espero que esta carta nos permita iniciar um diálogo amplo e frutífero", despede-se Forster.