O Estado de São Paulo, n.46245, 29/05/2020. Política, p.A6

 

Alcolumbre pede a Bolsonaro para reduzir ataques

Camila Turtelli

Tânia Monteiro

29/05/2020

 

 

Senador se reuniu com Bolsonaro após chefe do Executivo falar em não cumprir ordem do STF, mas ouviu novas críticas dele à Corte

Agenda. Davi Alcolumbre durante sessão deliberativa; presidente do Senado conversou com Rodrigo Maia antes de se encontrar com Jair Bolsonaro

Diante do acirramento da crise entre o presidente Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal, coube ao chefe do Legislativo, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), o papel de bombeiro para tentar apaziguar os ânimos. O parlamentar foi ao Palácio do Planalto dizer a Bolsonaro ser preciso “pacificar o País” e que os confrontos diários não levariam a lugar algum. Como resposta, ouviu do presidente mais reclamações sobre a atuação de ministros da Corte.

O encontro, fora da agenda, ocorreu horas após Bolsonaro ameaçar descumprir decisões do Supremo Tribunal Federal. Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, a reunião teve momentos tensos e, inicialmente, contou com a participação dos ministros André Mendonça (Justiça) e José Levi (Advocacia-Geral da União).

Antes de se reunir com Bolsonaro, Alcolumbre conversou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e ministros do Supremo. O recado que levou ao presidente foi de que algumas atitudes do chefe do Executivo tem causado desconforto, como a participação frequente nos fins de semana em atos que pedem o fechamento do Congresso e do STF.

O presidente do Senado também relatou a Bolsonaro que mais uma vez houve incômodo com a conduta do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que na quarta-feira comparou uma operação contra apoiadores do presidente ao nazismo. A comunidade judaica reagiu ontem (mais informações nesta página). Alcolumbre é judeu.

Em outro episódio que acirrou a crise com o STF, Weintraub defendeu em reunião ministerial no mês passado a prisão dos magistrados da Corte. Após a declaração se tornar pública, o ministro da Educação foi convocado para prestar depoimento. Anteontem, o governo entrou com um habeas corpus para que ele não precise comparecer.

Ponte. O encontro com Alcolumbre fez parte de um esforço, que envolveu também ministros do próprio governo, para reconstruir pontes com o Supremo. Bolsonaro tem uma relação mais próxima com o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, que está internado com suspeita de covid-19.

Com isso, Alcolumbre fez a interlocução com o presidente em exercício do STF, ministro Luiz Fux, e indicou a Bolsonaro que o clima do outro lado da Praça dos Três Poderes estava ruim para ele.

A avaliação é de que os ataques que o presidente faz aos ministros Alexandre de Moraes e Celso de Mello atingem todos os demais integrantes da Corte, sugerindo que poderia partir do colegiado uma resposta coletiva.

“O Congresso atua em prol do Brasil, como intermediário na construção da paz, e em favor dos brasileiros, nesta quadra difícil da história nacional”, publicou o presidente do Senado no Twitter no início da noite.

Antes da reunião de Alcolumbre no Palácio do Planalto, Maia criticou as ameaças feitas por Bolsonaro. “As declarações de hoje (ontem) do presidente são muito ruins. Vão no caminho contrário de tudo o que a gente começou a construir”, afirmou, em entrevista na Câmara. “Qualquer cidadão pode recorrer de decisão de qualquer ministro do STF, mas tem que ser pelos caminhos legais, não pela forma de tentar intimidar ou acuar outro Poder”, completou.