O Estado de São Paulo, n.46244, 28/05/2020. Política, p.A8

 

O resultado prático deste inquérito é três vezes zero

J. R. Guzzo

28/05/2020

 

 

O Supremo Tribunal Federal, como se sabe, abriu em março do ano passado uma investigação para apurar possíveis delitos – e os culpados por eles – na divulgação de “fake news” que têm ou teriam ocorrido contra o próprio STF, seus integrantes e membros de suas famílias. É uma dessas coisas que começou no escuro e caminha em direção ao escuro. Sua manifestação mais ruidosa acaba de acontecer com a realização de cerca de 30 buscas e apreensões, executadas por agentes da PF numa inédita missão a serviço do Supremo. Os alvos foram editores de blogs pró-governo e anti-STF, indivíduos diversos e oito deputados no exercício dos seus mandatos, seis deles federais. Pode isso?

Não foi uma decisão dos 11 ministros que compõem o plenário do tribunal. Quem resolveu assim foi o presidente do STF, Dias Toffoli, e desde o início o Ministério Público foi contra. O STF, segundo entendia o MP de então, não tinha o direito de abrir e operar uma investigação de crimes supostamente cometidos contra ele mesmo – ou, na verdade, contra ninguém. Muitos dos mais respeitados juristas brasileiros têm exatamente a mesma posição. Mas por uma dessas coisas que tornam o Brasil, com frequência, um país incompreensível, a PGR mudou de opinião e começou a achar que o procedimento era legal, sim, desde que o presidente Jair Bolsonaro nomeou o novo e atual chefe, Augusto Aras. Como assim?

O ministro Luís Roberto Barroso tinha dito, dois dias antes, que o STF é quem garante a manutenção da democracia no Brasil, e as críticas a ele são livres – o que não se pode é deixar de cumprir as suas decisões. Onde se encaixa, então, o rapa de hoje? Se as críticas são realmente livres, por que as apreensões de celulares e outros atos de repressão contra editores de blogs e, mais que isso, seis deputados federais, que fazem parte de um Poder independente?

O resultado prático de todo esse som e fúria vai ser três vezes zero: ninguém vai para a cadeia, nenhum deputado será cassado e não haverá órgãos de imprensa proibidos de funcionar.

_______________________________________________________________________________________________________________________

Supremo está vigilante contra agressão, diz Fux

Julia Lindner

28/05/2020

 

   
Presidente interino afirma que ataques à Corte representam ‘notório desprezo pela democracia’

Ao abrir a sessão do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), ontem, o vice-presidente Luiz Fux afirmou que a Corte continua “vigilante contra qualquer forma de agressão à instituição”. A afirmação foi feita dias depois da divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, na qual o ministro da Educação, Abraham Weintraub, foi flagrado defendendo a prisão de ministros do STF.

Fux destacou que ofender a instituição representa “notório desprezo pela democracia”. Ele assumiu o comando do tribunal durante o afastamento de Dias Toffoli, internado desde sábado em hospital em Brasília. Apesar dos recados contra ataques ao Supremo, Fux também fez um gesto de conciliação, ao dizer que “o diálogo entre os diferentes faz parte do espírito democrático”.

O discurso ocorre horas depois da operação deflagrada pela Polícia Federal para cumprir mandados de busca e apreensão no âmbito do inquérito do STF que apura suspeitas de fake news. Entre os alvos, estão aliados do governo Jair Bolsonaro.

“Imbuído dessa ponderação, este Supremo Tribunal Federal, no exercício de seu nobre mister constitucional, trabalha para que, onde houver hostilidade, construa-se respeito; onde houver fragmentação, estabeleça-se diálogo; e onde houver antagonismo, estimulem-se cooperação e harmonia”, disse Fux.

Ele também fez gesto de apoio ao decano da Corte, ministro Celso de Mello, que também foi alvo de ataques de integrantes do governo e de seus apoiadores nos últimos dias. Na semana passada, Celso de Mello determinou a divulgação do vídeo da reunião na íntegra. A gravação faz parte do inquérito que apura a acusação do exministro da Justiça Sérgio Moro de que Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal.

“Faço especial menção ao nosso decano, ministro Celso de Mello, líder incansável desta Corte na concretização de tantos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos brasileiros. Se hoje podemos usufruir liberdades e igualdades dos mais diversos tipos, sem nenhuma dúvida isso se deve, em grande medida, aos mais de 30 anos de judicatura do ministro Celso de Mello neste Tribunal”, afirmou Fux.

Trabalho

“Este Supremo Tribunal Federal, trabalha para que, onde houver hostilidade, construa-se respeito; onde houver fragmentação, estabeleça-se diálogo; e onde houver antagonismo, estimulem-se cooperação.”

Luiz Fux

VICE-PRESIDENTE DO STF