Valor econômico, v.21, n.5026, 22/06/2020. Brasil, p. A4

 

Estudo aponta oportunidades de recuperar áreas em Mariana

Daniela Chiaretti 

22/06/2020

 

 

A Fundação Renova, criada para reparar o desastre socioambiental do rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, encomendou um estudo de oportunidades, custos e ganhos da recuperação de áreas degradadas na região mais atingida em 2015 pela lama de Mariana, em Minas Gerais.

Com técnicas de restauração florestal e práticas sustentáveis agrícolas, 77,2 mil hectares de áreas perdidas poderiam ser recuperadas e gerar um valor adicionado de R$ 23,5 milhões ao ano, no longo prazo, distribuídos entre oito municípios mais afetados.

Além disso, o esforço resultaria em redução de 281,2 mil toneladas de emissões de gases-estufa.

Essas são as grandes linhas do relatório de oportunidades de restauração, de 108 páginas, encomendado ao instituto WRI-Brasil. Foi aplicada a metodologia global Roam, de avaliação de recuperação de áreas degradadas, ouvindo as comunidades locais das regiões mais afetadas da bacia do Gualaxo do Norte, afluente do rio Doce.

Existem mais de mil propriedades rurais ao longo da calha do rio Doce. O foco inicial foi na região que concentra 230 proprietários. "Começamos onde o impacto foi mais intenso", diz Vitor Hermeto Coutinho Campos, especialista do Programa de Uso Sustentável da Terra da Renova e líder do projeto. A iniciativa buscou "integrar a produção e a conservação, reinventando o território", como ele diz.

A ideia é aumentar o valor econômico da atividade agropecuária, tradicional na região, com práticas sustentáveis e de baixa emissão de carbono, adicionando renda com produtos madeireiros e não-madeireiros. Há ainda benefícios indiretos, como melhoria da qualidade da água, solo e clima, cita Mariana Oliveira, pesquisadora de restauração do WRI Brasil.

Depois do desastre, os produtores perderam sua terra para a lama, principalmente áreas próximas ao rio, onde o boi costumava pastar e tomar água, diz Coutinho Campos. A recuperação tinha que respeitar as normas do Código Florestal, com plantio de mata ciliar e áreas de preservação ambiental (APPs). O desafio está em adequar o produtor à legislação e aumentar sua renda com novas práticas.

A região tem histórico de degradação com séculos de exploração de ouro e pecuária de baixa produtividade, diz Rafael Feltran-Barbieri, economista do WRI Brasil. "Não basta recuperar, porque isso está na lei. O produtor precisa produzir. Já havia degradação secular do uso extensivo do solo", segue. "Depois da desgraça, é possível fazer algo que não só repare o dano, mas dê nova perspectiva às pessoas."

A pecuária extensiva, além da renda limitada, "depende cada vez mais de insumos e tem externalidades associadas como o assoreamento do rio, os custos de tratamento de água, a falta de resiliência da propriedades", lembra Coutinho Campos, da Renova.

Os bois foram colocados em áreas menores e se faz rodízio das áreas, para aumentar a produtividade. Um dos proprietários está conseguindo aumentar a renda com plantio de abacate. Há potencial para sistemas agroflorestais, silvicultura com espécies nativas e pastagens ecológicas. Um exemplo é a diversificação de árvores nativas como candeia, guapuruvu e jequitibá, e utilizá-las, no futuro, para produção de óleos e madeira.

"O contexto dessa região é de muito conflito, uma agenda muito delicada", diz Mariana, líder do projeto pelo WRI. A vocação da região é florestal e leiteira. A iniciativa quer construir casos de negócios e cadeias de produtos, ampliando a comercialização. O estudo está sendo levado às prefeituras para incentivar políticas públicas.