Correio braziliense, n. 20858 , 01/07/2020. Economia, p.10

 

Mais dois meses de auxílio emergencial

Rosana Hessel

Marina Barbosa

Augusto Fernandes

Ingrid Soares

01/07/2020

 

 

Bolsonaro assina decreto que autoriza parcelas adicionais de R$ 600, mas ainda há dúvidas sobre a realização de pagamentos. Há possibilidade de fracionamento dos benefícios. Guedes chegou a falar em quatro fases, mas ideia é mal recebida no Congresso

Em cerimônia ontem, no Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro assinou decreto que prorroga por mais dois meses o auxílio emergencial de R$ 600, mas gerou nova polêmica. O benefício é destinado a desempregados, trabalhadores informais e cadastrados no Bolsa Família como forma de compensar as perdas na renda durante a crise provocada pela covid-19. Inicialmente, seriam três parcelas e a última estaria sendo paga neste mês.

O anúncio da prorrogação proporcionou um ganho político para o presidente, mas gerou confusão. Apesar de o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, falar que seriam duas parcelas de R$ 600, o ministro da Economia, Paulo Guedes, cogita uma divisão desse montante em até quatro parcelas, mas não deu detalhes.

Aconselhado por Guedes, Bolsonaro vinha defendendo a prorrogação do auxílio emergencial com parcelas de R$ 500, R$ 400 e R$ 300. Porém, decidiu manter o valor mensal em R$ 600 para não correr o risco de ver o benefício ser ampliado pelo Congresso, como ocorreu na proposta original do benefício, que previa pagamento mensal de apenas R$ 200.

Coube ao presidente da Caixa, Pedro Guimarães, explicar o que o ministro queria dizer sobre o parcelamento dos benefícios adicionais em até quatro vezes. “Oficialmente, são mais dois meses de R$ 600. Isso é o que a lei permite. Mas, se nós tivermos a percepção quanto à possível duração um pouco mais extensa ou não dessa crise, podemos pegar os dois pagamentos de R$ 600 e fasear de uma forma que cubram três meses”, disse. Segundo ele, a ideia é pagar R$ 500 no início e R$ 100 no fim de julho. E, depois, pagar R$ 300 no início e mais R$ 300 no fim de agosto. Porém, os valores exatos desse faseamento ainda não foram confirmados pelo governo federal, e ainda não há um cronograma dos pagamentos.

Guimarães acrescentou, no entanto, que para os beneficiários do Bolsa Família, as liberações seguirão o calendário normal e serão depositados os R$ 600 em duas parcelas.

Reações

No Congresso, a proposta de parcelamento sofreu resistência logo em seguida à cerimônia, que teve a presença dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ao retornar ao parlamento, Maia afirmou que, se o governo pensa em lançar um programa de transferência de renda, deve agir logo. “São duas parcelas de R$ 600. É isso que está assinado, certamente, no decreto, e é isso que a lei autoriza. Se tem a vontade, como tem dito, de consolidar programas sociais, o governo deve sentar à mesa com o Parlamento e começar a discutir esse tema durante esses próximos 60 dias. Senão, daqui a 60 dias vai ter um outro debate para prorrogação dos R$ 600”, disse.

Para Maia, o fracionamento pode gerar insegurança para as pessoas e também “em alguns casos, uma aglomeração desnecessária na rede bancária”.  O deputado Marcelo Ramos (PL-AM), vice-líder do bloco dos partidos do Centrão criticou a forma de pagamento escalonada em até quatro vezes.  “Quero fazer um apelo à liderança do governo e ao ministro Guedes que não executem o pagamento nesse formato. Vamos obrigar o cidadão humilde, em vez de duas, ir quatro vezes ao banco. É uma forma de pagamento mais dolorosa para o trabalhador e mais arriscada do ponto de vista sanitário”, observou.

O impacto fiscal com a prorrogação desse socorro, que tem 64 milhões de cadastrados e identificou um exército de 38 milhões de “invisíveis”, será de R$ 100 bilhões nos cofres públicos, pelos cálculos do Tesouro Nacional. Durante a cerimônia no Planalto, Bolsonaro afirmou que está preocupado com a população mais humilde. “A simplicidade desse povo realmente nos faz cada vez ter mais força para lutar por ele”, afirmou. 

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Novos programas em estudo

Marina Barbosa

01/07/2020

 

 

O período de prorrogação do auxílio emergencial deve ser usado pelo governo para planejar a retomada da atividade econômica, mas também os programas sociais que virão no pós-pandemia. A ideia é que os brasileiros de baixa renda e os trabalhadores informais sejam assistidos de outra forma depois do coronavírus. Por isso, o Executivo avalia criar dois programas: o Renda Brasil e o Verde e Amarelo.

“Dentro de dois, três meses, assim que acabar o período do auxílio emergencial, novos programas sociais, o Renda Brasil e o Verde Amarelo, virão para estimular a retomada do crescimento”, afirmou o ministro Paulo Guedes, em audiência pública do Congresso Nacional ontem.

O governo já mostrou a intenção de criar o Renda Brasil para unificar os atuais programas e, assim, tirar a marca do PT da política de assistência social. Para isso, promete ampliar transferências à população de baixa renda atendida pelo Bolsa Família. O programa paga cerca de R$ 200 por mês a 14 milhões de famílias. O governo fala em ampliar a base de beneficiários e deixar o valor “um pouco acima” do nível atual.

Invisíveis

O programa Verde e Amarelo pretende oferecer melhores condições de trabalho aos informais, que eram “invisíveis” para o governo antes da pandemia. “Vamos criar o Verde e Amarelo para esses 30 milhões de brasileiros que só querem o direito de trabalhar sem serem impedidos pelo governo”, prometeu Guedes.

Nesse sentido, estão em estudo programas de microcrédito para os microempreendedores e o “Imposto de Renda negativo”, que reduziria a tributação da folha para incentivar a ampliação do emprego formal. O programa não deve, portanto, se limitar à Carteira de Trabalho Verde e Amarela, criada no ano passado com o intuito de facilitar a contratação dos mais jovens, e acabou não tendo o resultado esperado.

Segundo Guedes, o governo vai criar uma “rampa de ascensão social”, oferecendo renda básica para os mais pobres e condições de negócio e trabalho para os informais. “Qualquer trabalhador que cair vai receber o Renda Brasil, mas tem o direito de se levantar e começar a trabalhar a qualquer salário que consiga até chegar de novo à CLT”, imagina o ministro.

Ele admitiu, contudo, que tudo o que está sendo estudado precisará ser negociado com o Congresso Nacional, de quem o governo também espera a aprovação de reformas econômicas que propiciem a geração de empregos no pós-pandemia. “É isso que nos espera nos dois, três meses à frente”, disse Guedes. 

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7,8 milhões perdem emprego

Marina Barbosa

Fernanda Strickland*

01/07/2020

 

 

A crise econômica causada pelo novo coronavírus já destruiu 7,8 milhões de postos de trabalho formais e informais no Brasil. Com isso, elevou para 12,9% a taxa de desemprego no país e provocou uma situação inédita no mercado de trabalho: pela primeira vez na história, mais da metade da força de trabalho brasileira ficou sem trabalhar.

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A Pnad avaliou exatamente os três meses mais intensos da pandemia no país —março, abril e maio. E revelou que, nesse período, 5,8 milhões de trabalhadores informais ficaram sem condições de trabalho e mais 2 milhões de empregados formais perderam as vagas por conta das medidas de distanciamento social impostas pela pandemia.

Esse movimento provocou um recuo recorde de 8,3% da população ocupada. E a taxa de ocupação despencou de 54,5%, no trimestre encerrado em fevereiro, para 49,5% no trimestre encerrado em maio. “Pela primeira vez na série histórica da pesquisa, o nível da ocupação ficou abaixo de 50%. Isso significa que menos da metade da população em idade de trabalhar está trabalhando. É uma redução inédita na pesquisa e atinge principalmente os trabalhadores informais”, destacou a analista da Pnad, Adriana Beringuy.

Segundo o IBGE, além de provocar uma redução de 7,5% do número de trabalhadores com carteira de trabalho, essa situação derrubou a taxa de informalidade brasileira de 40,6% para 37,6%. Este também é o menor nível da séria histórica do IBGE, segundo Adriana. Ela lembrou que a redução da informalidade "não necessariamente é um bom sinal". "Significa que essas pessoas estão perdendo ocupação e não estão se inserindo em outro emprego. Estão ficando fora da força de trabalho”, explicou.

A estudante Aline Moreira, de 21 anos, sabe bem disso. Ela foi demitida da editora em que trabalhava há um ano com carteira assinada depois da pandemia ter derrubado a venda de revistas. E aí precisou recorrer aos pais para se sustentar. Só que tanto a mãe, quanto o pai de Aline são informais e também acabaram sem renda durante a crise. Por isso, toda a família precisou fazer cortes de gastos e aprender a viver com o estritamente necessário. "Minha mãe trabalha com uma loja de roupa e meu pai com uma loja de material de construção. Meu pai conseguiu voltar a trabalhar agora em junho, porém minha ainda está com a loja fechada devido ao isolamento", conta Aline.

Segundo o IBGE, por conta de situações como essa, a massa de rendimento gerada pelo mercado de trabalho brasileiro perdeu R$ 11 bilhões no trimestre encerrado em maio.

Apesar disso, a taxa de desemprego não explodiu nos três primeiros meses de pandemia. Ela avançou de 11,6% para 12,9%, mas deve subir bastante nos próximos meses. Segundo especialistas, muitos dos trabalhadores que ficaram sem trabalho ainda não começaram a buscar uma vaga, devido às medidas de distanciamento social. 

*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo