O globo, n. 31717, 08/06/2020. Economia, p. 15

 

Reforço no caixa

Luciana Casemiro

08/06/2020

 

 

BNDES lança linha de R$ 2 bi para capital de giro de hospitais 

ALEXANDRE CASSIANO/22-4-2020Pandemia. A crise do coronavírus afetou as finanças dos hospitais, que têm maiores ganhos com procedimentos eletivos, como cirurgias. Impacto é maior para instituições de pequeno e médio portes

 Quase três meses após o início da pandemia, a crise já afeta o caixa dos hospitais. Diante da necessidade de recursos para fechar as contas, o BNDES lança nesta semana uma linha orçada em R$ 2 bilhões para capital de giro —dinheiro para bancar a continuidade do funcionamento da empresa — voltada a grandes hospitais e laboratórios. A medida se soma a outras iniciativas do banco para a área de saúde, como a criação, em março, de uma linha para compra de equipamentos usados no combate ao coronavírus e ampliação de leitos de UTI, uma campanha de financiamento coletivo em parceria com santas casas e hospitais e a suspensão pelo prazo de até seis meses do pagamento de empréstimos com o banco — neste último caso, em ação que abrange todos os setores da economia.

Em entrevista ao GLOBO publicada no último sábado, o fundador da Rede D’Or, Jorge Moll, afirma que a pandemia prejudicou o caixa das empresas do setor. Segundo ele, todos os hospitais perderam dinheiro porque o paciente de Covid-19, em geral, gasta pouco, embora use respiradores e remédios que ficaram mais caros na crise. Do ponto de vista financeiro, os hospitais ganham mais com cirurgias — muitas das quais adiadas durante a pandemia — e atendimentos de emergência.

META PARA EMPREGOS

De acordo com o relato de executivos do setor de saúde, além do aumento do custo de medicamentos e equipamentos, hospitais e laboratórios viram seu faturamento cair entre 30% e 70% com a suspensão de procedimentos eletivos. Eles afirmam que boa parte dos hospitais não está faturando o suficiente para arcar com os custos fixos da operação.

Para Luiz Fernando Silva, superintendente da Federação Brasileira de Hospitais (FBH), é preciso agilidade na liberação de recursos para evitar o fechamento de empresas do setor Brasil afora.

— Os pequenos e médios hospitais estão numa situação desesperadora. Estamos desde março conversando com o BNDES, precisamos de recursos. Já temos notícias de hospitais que fecharam as portas, pois estão com movimentação praticamente zero. É o caso, por exemplo, de clínicas especializadas —afirma Silva.

A nova linha de crédito será voltada para hospitais e laboratórios com faturamento anual de ao menos R $300 milhões. O valor mínimo do timo é de R$10 milhões, e o máximo, de R$ 200 milhões. O prazo de pagamento é de 48 meses, com até um ano de carência, podendo ser prorrogado por mais seis meses caso o tomador cumpra metas de emprego e renda.

Par ater direito aprazo mais longo e condições melhores de empréstimo, a empresa tem que manter 90% da mão de obra que tinha na data de assinatura do contrato por dois meses e, em 12 meses, manter a média de funcionários. O custo do empréstimo é de Taxa de Longo Prazo (TLP) ou Selic (atualmente em 3%) mais taxa de risco e a remuneração do BNDES, de 1,5% ao ano. Este percentual pode cair a 1,1% coma manutenção de postos de trabalho. Hospitais beneficentes poderão usar recursos recebidos pelo SUS como garantia para a operação de financiamento.

Segundo fontes do setor de saúde, grupos como o Hospital Moinho de Ventos, de Porto Alegre, a Rede D'Or, o Mater Dei, a Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e o Real Hospital Português de Beneficência em Recife já estariam habilitados para o novo crédito.

CUSTO ELEVADO

Mesmo assim, parte do setor ainda avalia que o custo da linha é alto. O diretor financeiro da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Ricardo Englert, avalia que, embora esteja habilitada apegar o empréstimo, a instituição não usará os recursos do BNDES. O hospital tem 71% de seu atendimento destinados ao SUS. O faturamento médio mensal caiu de R$ 100 milhões para R$ 58 milhões em abril, afetado pela queda nos atendimentos particulares e por convênios. Para enfrentara crise, o hospital já levantou R$ 15 milhões com bancos.

— Além de ter demorado a sair, a linha do BNDES, nas condições que tinham nos apresentado, pode sair por um custo igual ou maior do que a que encontramos no mercado. Considerando a taxa de risco, o custo anual fica próximo aos 10% ao ano —diz Englert.

Além disso, a maioria dos 4.200 hospitais do país é de pequeno ou médio porte e pode não reunir as condições necessárias para obter o crédito. Para eles, a saída é esperara mudança do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI). O governo resolveu reforçar este fundo para ampliara participação da União nas garantias de empréstimos. Este foi o caminho encontrado para fazer deslanchar o crédito a médias empresas, que esbarram no receio dos bancos privados de contrair risco em um momento de turbulência.

MEDIDAS PARA O SETOR

1 Apoio emergencial ao combate ao novo coronavírus

Em março, o banco lançou uma linha orçada em R$ 2 bilhões destinada a hospitais. O objetivo é ampliar a oferta de leitos de UTI, materiais e equipamentos médico-hospitalares. Cada grupo poderia pegar emprestado no máximo R$ 150 milhões a cada seis meses. O valor mínimo do crédito é de R$ 10 milhões.

2 Campanha de financiamento ‘Salvando vidas’

O banco lançou campanha de financiamento coletivo para compra de material, insumos e equipamentos de proteção para médicos e enfermeiros. O BNDES vai dobrar o valor da contribuição de cidadãos e empresas até o limite de R$ 50 milhões, ou seja, a cada R$ 1 doado, o banco acrescenta R$ 1.

3 Suspensão de pagamento de empréstimos

Em março, o banco aprovou a suspensão por até seis meses do pagamento de empréstimos contratados em operações diretas com o BNDES ou indiretas (por meio de outros bancos). A iniciativa não é voltada especificamente para a área de saúde, mas também abrange empresas do setor.

4 Nova linha para capital de giro no setor de saúde

O banco está lançando uma linha para capital de giro de hospitais e laboratórios orçada em R$ 2 bilhões. Os recursos serão usados para as necessidades financeiras, em razão da queda do faturamento com a pandemia. O valor mínimo do crédito é de R$ 10 milhões, e o máximo, de R$ 200 milhões.