Valor econômico, v.21, n.5029, 25/06/2020. Brasil, p. A6

 

Governo quer redução escalonada do auxílio

Fabio Graner

Raphael Di Cunto

25/06/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro orientou o Ministério da Economia a trabalhar uma redução escalonada do auxílio emergencial em três parcelas: R$ 500, R$ 400 e R$ 300. O custo fiscal é alto, da ordem de R$ 100 bilhões, o mesmo que haveria se fosse à frente a proposta inicialmente apresentada pelo Congresso, de renovar por duas parcelas de R$ 600. Bolsonaro deve discutir essa ideia com os presidentes da Câmara e do Senado, segundo apurou o Valor.

O chefe do Executivo está pressionado politicamente, correndo risco de uma derrota caso insista na proposta original de duas parcelas de R$ 300. O auxílio de R$ 600 hoje é uma das âncoras de popularidade de Bolsonaro, que de outro lado é pressionado pelo aumento da dívida pública. Por isso surge essa proposta alternativa de escalonamento, embora também já surjam resistências no Congresso.

A despeito do custo elevado, interlocutores da área econômica apontam algumas vantagens na nova ideia em debate. "Serão três meses de cobertura, com R$ 500, R$ 400 e R$ 300 em vez de duas de R$ 600 e prepara aterrissagem entre R$ 600 de emergencial e R$ 200 de Bolsa Família", disse uma fonte.

Enquanto o auxílio é pago e reduzido gradualmente, a equipe econômica prepara o "aperfeiçoamento" do Bolsa Família, que já ganhou preliminarmente o nome de "Renda Brasil" e que deve incorporar outros programas. O valor a ser pago no Bolsa Família repaginado deve ficar entre R$ 200 e R$ 300.

O Congresso, porém, já levanta dificuldades. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que ainda não foi procurado por Bolsonaro, mas manteve a defesa de duas parcelas de R$ 600. "Fiquei feliz porque a proposta do governo representa o mesmo impacto que a proposta que eu estou fazendo. Mas acho mais transparente com o cidadão manter as duas de R$ 600 porque não precisa de uma nova lei, nós já autorizamos a prorrogação por decreto", afirmou.

Maia disse que Bolsonaro deveria também abrir um "debate sério" com o Congresso sobre a criação de uma renda mínima permanente para a população carente, numa reformulação dos programas assistenciais. "A crise não acabou e vai se agravar. Precisa de uma renda permanente a partir de 2021", afirmou.

A oposição também se disse contra a ideia de escalonar o pagamento adicional do auxílio. "Não faz sentido. A população continua sem renda e o governo propõe dividir o pagamento. Defendemos que sejam duas parcelas de R$ 600, prorrogáveis se for necessário", disse o deputado André Figueiredo (PDT-CE), líder da oposição.

A economista Monica de Bolle, da Universidade Johns Hopkins e pesquisadora do Peterson Institute, considera que houve uma evolução do governo com a nova ideia, mas avalia que ela ainda é insuficiente. Por isso, ela reforça a defesa para que os R$ 600 sejam mantidos. "Não vai dar para fazer isso que o governo quer não. Vai ter que haver manutenção dos R$ 600 até a gente ter maior clareza sobre a pandemia. Eu defendo que continue em R$ 600 até o fim do ano".

Ela levanta como possível alternativa manter os R$ 600 até setembro, com base em uma hipótese de que a curva epidemiológica poderá estar chegado ao platô, reduzindo o auxílio de forma escalonada nos meses seguintes. Mas Monica mesmo descarta a ideia e reitera a defesa de R$ 600 até o fim do ano. "Acho positivo que o governo não esteja mais falando em acabar com o benefício, mas reduzir hoje não é solução. A crise continua aguda", afirma ela.

Enquanto discute o que fazer com o auxílio emergencial, o Ministério da Economia continua preocupado em buscar fazer o crédito chegar à ponta. A área reconhece que a atuação nesse flanco estava insatisfatória e nas últimas semanas adotou medidas para reverter o quadro, principalmente para as empresas de menor porte.

Uma fonte mostrou-se satisfeita com a informação de que mais de 5 mil empresas tiveram suas propostas aprovadas no Pronampe, a nova linha para pequenas, só no Banco do Brasil, com um volume de quase R$ 300 milhões.

Mas o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, disse ontem que o governo poderá eventualmente ter mais um programa de crédito para fazer com que o dinheiro chegue à ponta. (Colaborou Marcelo Ribeiro)