Correio braziliense, n. 20850 , 23/06/2020. Política, p.4

 

Flávio Bolsonaro vai depor nesta semana

Sarah Teófilo

Luiz Calcagno

23/06/2020

 

 

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) deve ser ouvido, ainda nesta semana, no âmbito das investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) que apuram esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). É o que espera o novo advogado do senador, Rodrigo Roca. O defensor disse ao Correio que já foi solicitado à Polícia Federal que o parlamentar preste depoimento, e que isso deve ocorrer na sexta-feira. Data será confirmada hoje.

Para criminalistas, são robustas as provas contra Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Alerj e que foi detido na semana passada. Eles argumentam que é preciso um conjunto probatório forte para solicitar a prisão preventiva. Queiroz é suspeito de ter atuado como operador da rachadinha — esquema em que o parlamentar fica com parte do salário de funcionários — no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro.

Na opinião de Celso Vilardi — professor do curso de pós-graduação na Fundação Getulio Vargas —, “o MP parece ter uma história já pronta”. “Uma das razões para se decretar uma prisão preventiva é o sujeito indicar que vai se evadir. Queiroz não tinha mandado de prisão ou não comparecimento injustificado que pudesse dizer que ele estava evadindo. Mas, segundo eu acompanhei, existem mensagens que ele se portava como se foragido fosse”, avaliou.

Para Cristiano Noronha, cientista político da Arko Advice, o inquérito contra Queiroz envolvendo Flávio Bolsonaro atinge o coração da narrativa do combate à corrupção, uma das bandeiras que elegeram o clã Bolsonaro.

Advogado

Rodrigo Roca, novo advogado de Flávio, tem mais de 20 anos de carreira e já atuou para militares acusados de tortura e assassinatos na ditadura. Até 2018, defendeu o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB), condenado a mais de 280 anos de prisão na Operação Lava-Jato.

Roca assumiu o posto no lugar de Frederick Wassef, que deixou a defesa do parlamentar no caso que apura esquema de rachadinha.

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"Indícios de associação criminosa", diz Moraes

Augusto Fernandes

23/06/2020

 

 

BRASIL EXTREMO » Ministro derruba sigilo de decisão sobre protestos antidemocráticos, na qual aponta sinais da existência de organização ilegal. Deputados são suspeitos de financiar atos com dinheiro público

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que a “manifestação apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) confirma a real possibilidade de existência de uma associação criminosa” nos atos antidemocráticos que são investigados no inquérito em andamento na Corte. Ontem, o magistrado derrubou o sigilo da decisão proferida por ele em 27 de maio. Na ocasião, autorizou que a Polícia Federal cumprisse mandados de busca e apreensão contra blogueiros e empresários e a quebra de sigilo bancário de parlamentares bolsonaristas.

“Em face desses indícios apresentados, torna-se imprescindível o deferimento das diligências, inclusive, com afastamento excepcional de garantias individuais que não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito”, escreveu Moraes.

As investigações sobre atos antidemocráticos de grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro apresentaram indícios, inclusive, de que as manifestações podem ter sido financiadas com dinheiro público liberado por quatro deputados federais do PSL, conforme o jornal O Globo. Segundo a PGR, Aline Sleutjes (PR), Bia Kicis (DF), General Girão (RN) e Guiga Peixoto (SP) teriam contratado uma empresa de publicidade para promover conteúdos dos protestos inconstitucionais nas suas redes sociais.

A empresa usada pelos quatro parlamentares bolsonaristas seria a Inclutech Tecnologia da Informação Ltda, que pertence ao publicitário Sérgio Lima, marqueteiro do Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro tenta criar. Desde março, os congressistas usaram a cota parlamentar para repassar R$ 58,11 mil à agência publicitária.

“No ecossistema de redes sociais e propagação de ideias de mobilização social e realização de manifestações ostensivas nas ruas, há participação de parlamentares tanto na expressão e formulação de mensagens quanto na sua propagação e visibilidade, quanto no convívio e financiamento de profissionais na área”, disse o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques, no inquérito aberto em 20 de abril pela PGR para investigar o caso.

De acordo com informações do Portal da Transparência da Câmara, Bia Kicis foi a primeira a contratar os serviços da Inclutech, em 20 de março, tendo usado R$ 6,41 mil. Depois, no dia 30 daquele mês, General Girão liberou R$ 7,4 mil para a agência. O deputado ainda destinou o valor à Inclutech mais duas vezes, em 17 de abril e 15 de maio. Por sua vez, Aline Sleutjes pagou R$ 10 mil em dinheiro público para a empresa, em 7 de abril. Já Guiga Peixoto fez três repasses de R$ 6,5 mil, em 1º de abril, 29 de abril e 1º de junho.

“Negócio lucrativo”

O inquérito da PGR ainda indicou que aliados de Bolsonaro podem ter lucrado mais de R$ 100 mil com a divulgação de atos antidemocráticos. Veículos da imprensa que tiveram acesso à peça, como CNN Brasil e Estado de S. Paulo, destacaram que dois canais pró-governo no YouTube — Folha Política e Foco do Brasil — podem ter embolsado até R$ 157 mil com transmissões dos discursos de Bolsonaro em manifestações recentes. A Folha Política, especificamente, faturou entre US$ 6 mil e US$ 11 mil com a live do presidente no ato de 3 de maio.

Os quatro deputados do PSL se defenderam das acusações. Bia Kicis respondeu que “ao contrário das ilações feitas nesse inquérito ilegal e abusivo, os gastos são para divulgação de mandato parlamentar, são legais e estão previstos no regimento da Câmara”. “Não houve qualquer manifestação antidemocrática de minha parte. O que há é uma investigação que se reveste de perseguição política contra apoiadores do presidente Jair Bolsonaro”, reclamou.

Guiga Peixoto disse desconhecer o conteúdo da manifestação do vice-procurador-geral da República. “Assim, por ora, não me cabe entrar no mérito da correção ou não da informação de que contratei a Inclutech Tecnologia para divulgar em redes sociais manifestações consideradas antidemocráticas. Com certeza, essa é uma presunção que não resiste às provas sob meu poder e que apresentarei em momento oportuno”, informou.

Aline Sleutjes afirmou que, por parte dela, “em momento algum houve financiamento econômico ou qualquer forma de apoio a atos de cunho antidemocrático, muito menos incitação à prática de violência contra as instituições da República ou seus integrantes”. A assessoria de General Girão informou que o deputado não financiou “nenhuma manifestação, muito menos antidemocrática”.