Correio braziliense, n. 20849 , 22/06/2020. Política, p.2

 

Efeitos colaterais de Queiroz e Weintraub

Alessandra Azevedo

Augusto Fernandes

22/06/2020

 

 

PODER » Ideia do Planalto é de tentar manter uma agenda positiva, mas aliados admitem que a pressão da oposição vai aumentar após a prisão do ex-assessor e da “fuga” do ministro da Educação. Wassef deixa defesa de Flávio Bolsonaro

A carteirada do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub para entrar nos Estados Unidos e a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-SP), prometem esquentar a temperatura política em Brasília na semana que se inicia. A ideia do Palácio do Planalto é tentar manter uma agenda positiva, mas parlamentares admitem, em conversas reservadas, que legendas do Centrão devem aproveitar para cobrar uma presença maior em cargos na Esplanada, em troca de uma blindagem no Congresso para apagar qualquer incêndio que possa surgir contra o governo.

Os desdobramentos da investigação que levou à prisão de Queiroz preocupam o Planalto em vários níveis. Não só pelas evidências de que o filho mais velho seria o líder de uma organização criminosa, mas pela teia que liga a família a Queiroz — que, pelo que o Ministério Público do Rio de Janeiro tem apurado, vai além da rachadinha dos salários de servidores na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Próximo de Queiroz há pelo menos 30 anos, o presidente Jair Bolsonaro não sabe que tipo de informação pode sair de uma eventual delação premiada do ex-assessor. O medo evidente é que as falas dele prejudiquem o filho, mas a relação de décadas pode levar a outros assuntos, como o envolvimento com grupos milicianos. Queiroz poderia explicar, por exemplo, o porquê de Flávio ter empregado no gabinete o miliciano Adriano da Nóbrega, morto em fevereiro deste ano, que era acusado de chefiar um grupo criminoso suspeito de participar do assassinato da vereadora Marielle Franco.

Desde que entrou na mira do Ministério Público, o ex-assessor já deixava claro que o ponto fraco seria a família. “Podem me prender, mas não podem prender minha mulher nem minha filha”, dizia. As investigações, no entanto, chegaram à esposa, Márcia Aguiar. Com prisão decretada, ela, hoje, é considerada foragida e pode ser detida a qualquer momento. A possível prisão aumenta o grau de preocupação de Bolsonaro com a reação do ex-assessor.

Mesmo que tente, agora, se descolar da imagem de Queiroz, Bolsonaro fez questão de mantê-lo por perto nos últimos 30 anos. Como amigo, assessor, motorista ou, mais recentemente, hóspede do sítio do advogado da família, Frederick Wassef, em Atibaia, onde foi encontrado na semana passada. Sem ter como fugir das ligações, o Planalto fica atento, na espera dos próximos passos da Justiça, e ainda mais apreensivo em um cenário de brigas constantes com o Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, em mais um desdobramento da crise, Flávio Bolsonaro anunciou, no Twitter, que Wassef deixou de defendê-lo no processo “por decisão dele e contra a minha vontade (…), mesmo ciente de que não fez nada errado”.

De todo modo, parlamentares pró-governo tentam passar a impressão de que o presidente não será o maior impactado nessa história. De acordo com a base do governo no Congresso, a agenda de Bolsonaro tende a seguir o ritmo normal, a despeito de o caso Queiroz envolver o núcleo familiar dele. “O essencial é que o presidente está articulado com a base do governo. O Centrão, que deu governabilidade a todos os presidentes anteriores, está comprometido em dar ao Brasil condições de retomada do crescimento. É isso que nós vamos assistir daqui para a frente. Eu não acredito que nenhum desses fatos, que já estavam precificados, vai mudar isso. Se tivermos fatos novos, então vamos avaliar. Mas, por enquanto, tudo o que aconteceu já era previsto”, analisa o vice-líder do governo no Congresso, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

Saída turbulenta

Nem mesmo a turbulenta saída de Abraham Weintraub do Ministério da Educação e a “fuga” dele para os Estados Unidos, ainda sob o cargo na pasta, podem atrapalhar o desempenho do presidente, dizem os bolsonaristas. Pelo contrário. Para os congressistas, com o ex-ministro fora do governo, Bolsonaro tende a ter um pouco mais de paz.

“Com o Weintraub, nós da base do governo já vínhamos discordando das posições dele, que são páginas passadas e nem deveriam mais alimentar discussão. Ao mudar de ministro, acredito que Bolsonaro vai escolher alguém com outro estilo. Vai optar por uma pessoa que, realmente, possa ajudar o governo. Certamente, o novo ministro deve adotar um discurso mais ameno.”, diz o vice-líder do governo no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR).

O senador reconhece que tanto a demissão de Weintraub quanto a prisão de Queiroz são “fatos desagradáveis” para o governo. No entanto, ele diz que ambos  acontecimentos servirão mais para a oposição reforçar os ataques a Bolsonaro do que para prejudicar o presidente, de fato.

A deputada Alê Silva (PSL-MG) reforça que “as críticas sempre existiram e sempre vão existir” e que “cabe a cada um analisar se elas têm fundamento ou não”. De todo modo, ela frisa que a discussão criada em torno das recentes polêmicas não vão interferir. “A oposição propriamente dita no Congresso é muito pequena, não temos uma oposição ferrenha.”

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Fazendeiro dava apoio a grupo radicais

22/06/2020

 

 

A Polícia Civil do Distrito Federal desarticulou mais um acampamento de grupos extremistas de apoio ao presidente Jair Bolsonaro. Os grupos 300 do Brasil, Patriotas e QG Rural estavam alojados em uma chácara de Arniqueira (leia mais na página 14). De acordo com a corporação, segundo o programa Fantástico, o endereço pertence ao fazendeiro André Luiz Bastos Paula Costa, que já era investigado pela Delegacia de Repressão a Crimes Cibernéticos por ter feito ameaças ao governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB).

No último dia 13, quando o governador ordenou que a Polícia Militar do DF retirasse da Esplanada dos Ministérios um acampamento formado por simpatizantes do presidente, André Luiz gravou um vídeo para ameaçar Ibaneis. A filmagem, divulgada em primeira mão pelo blog CB.Poder, mostra o fazendeiro enfurecido.

“Pois é, governador, o senhor derrubou o acampamento de todos os produtores rurais do Brasil. Somos nós que estamos mantendo esse país e nós não vamos a aceitar a truculência, a forma como o senhor agiu, senhor Ibaneis. Nós vamos mostrar pro senhor com quem que o senhor mexeu”, disse ele.

Com dedo em riste, André Luiz reforça as ofensas a Ibaneis. “Nós sabemos seus podres, sabemos que você foi o líder dos 20 governadores em Brasília que tentaram derrubar o presidente. E nós estamos aqui pra defender o presidente e vamos defendê-lo. O recado está dado”, esbravejou.

“Agora, é conosco. Nós vamos mostrar pro senhor, dia 21, com quem que o senhor mexeu. O senhor mexeu com o povo brasileiro. É uma falta de respeito, seu agiota safado, nós vamos te pegar, seu safado. Você vai ver, vamos descobrir seus podres e colocar você no seu devido lugar igual a todos os governadores que traíram o presidente”, concluiu o fazendeiro.

Ataque

Ainda naquela data, a ativista Sara Fernanda Giromini, mais conhecida por Sara Winter, líder do grupo 300 do Brasil, mobilizou os integrantes do acampamento que acabara de ser desmontado a tentar invadir o Congresso, além de desacatar policiais. Mais tarde, a ativista também participou do ataque a fogos de artifício feito pelo grupo de bolsonaristas ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em um dos vídeos feitos durante o ato, um ativista diz: “(Estamos) em frente aos bandidos do STF. Isso é para mostrar para eles e para o bandido do GDF: não vamos arregar”.

Dois dias depois, a Polícia Federal prendeu Winter, em um desdobramento do inquérito da Suprema Corte que apura a realização de movimentos antidemocráticos no país — organizados por apoiadores de Bolsonaro e políticos próximos a ele —, que defendem pautas como o fechamento do Congresso e do Supremo. Devido aos episódios, o Governo do Distrito Federal passou a adotar algumas medidas para monitorar mais de perto apoiadores radicais do presidente na área central de Brasília.