Valor econômico, v.21, n.5004, 20/05/2020. Política, p. A6

 

Saída de Moro abre caminho para criação do Ministério da Segurança

Fabio Murakawa 

Isadora Peron

20/05/2020

 

 

A saída de Sergio Moro do governo fez ressurgirem, no Palácio do Planalto, conversas para a recriação do Ministério da Segurança Pública, separando-o da pasta da Justiça. Segundo fontes ouvidas pelo Valor, a mudança não é iminente. Mas o caminho está aberto para que aconteça em um processo gradual, conduzido pelo presidente Jair Bolsonaro e os ministros Jorge Oliveira (Secretaria-Geral), e André Mendonça, sucessor de Moro.

A arquitetura da criação do novo ministério envolve, além disso, a dança de cadeiras prevista para ocorrer em novembro, quando o ministro Celso de Mello se aposentar e deixar vaga uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF).

Mendonça é hoje o favorito à indicação de Bolsonaro para a vaga. Jorge, por sua vez, deixaria o posto atual para ir ao Ministério da Justiça. E indicaria um nome para ocupar a pasta da Segurança Pública, que ele já começa a formatar.

Atualmente, o favorito para essa posição é o secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, um aliado do ministro da Secretaria-Geral.

Oliveira e Mendonça vêm se encontrando com frequência diária. Desde que assumiu o cargo, em 29 de abril, o ministro da Justiça não se reuniu com Oliveira em apenas um dia - quarta-feira, dia 13. Em todos os outros dias úteis, manteve encontros oficiais registrados em agenda com o colega no Planalto.

Oliveira tem atuado como uma espécie de conselheiro de Mendonça para as indicações na área da Segurança. As trocas ainda não foram efetivadas, mas os titulares da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) e da Secretaria de Operações Integradas (Seopi) já deixaram os cargos. Na prática, é Oliveira quem está montando o "subministério" da Segurança Pública dentro da pasta da Justiça.

Para a Senasp, o general Guilherme Theophilo seria substituído pelo coronel da Polícia Militar Carlos Alberto de Araújo Gomes, ligado a Oliveira. Gomes, porém, começou a ser atacado pelos seguidores de Olavo de Carvalho, guru da área ideológica do governo, e, até agora, não foi nomeado.

Diferentemente do antecessor, Mendonça não resiste à ideia do fracionamento do ministério em dois. Advogado e pastor presbiteriano, ele não tem na segurança pública uma bandeira. Também é visto como um ministro "supremável" e, por isso, transitório, dado o seu favoritismo à vaga de Celso de Mello. Mesmo assim, dizem interlocutores, avalia que é preciso debater melhor a ideia e escolher o momento certo para a cisão.

Oliveira, por sua vez, trabalha para que isso aconteça o mais rápido possível. Ex-major da PM do Distrito Federal, e um dos ministros mais próximos de Bolsonaro, ganhou ainda mais poder com a saída de Moro. Ele tentará emplacar Anderson Torres para capitanear o futuro ministério.

Torres esteve no Palácio duas vezes na semana passada, nos dias 14 e 15, quinta e sexta-feira, segundo a agenda de Oliveira. O tema principal das conversas com Torres, segundo fontes, foi o reajuste dos policiais do Distrito Federal. A questão do ministério foi abordada, mas ficou em segundo plano.

Assim que Moro deixou o governo, a "bancada da bala", um dos principais esteios de apoio de Bolsonaro, fez chegar ao Planalto um pedido pela recriação do Ministério da Segurança Pública.

Aliado do presidente Jair Bolsonaro, o ex-deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF) tem dito a interlocutores que se considera um "nome natural" para o posto. Ele, porém, ainda não foi consultado a respeito do tema.

Segundo o presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado Capitão Augusto (PL-SP), nome oficial da bancada, essa é uma demanda antiga do grupo, mas foi deixada de lado para não enfraquecer ainda mais o ex-juiz da Lava-Jato, que já colecionava uma série de derrotas no governo.

Capitão Augusto diz que deve ter uma reunião ainda nesta semana com Mendonça para discutir o assunto e apresentar os argumentos a favor da proposta. "A gente está prevendo que, junto com a crise econômica, vá vir uma crise da segurança", disse o deputado em relação às consequências da pandemia do novo coronavírus.

Em entrevista ao programa "Poder em Foco", do SBT, Mendonça confirmou que Bolsonaro já falou com ele sobre os planos de dividir a pasta. Mas disse que ainda é preciso fazer uma análise sobre o assunto para definir "qual modelo trará mais efetividade". "E o que eu disse a ele [Bolsonaro] foi que essa análise tem que ser técnica. Tem que ser uma análise imparcial e buscar encontrar a melhor forma de organização para os melhores resultados", afirmou.

O ministro, entretanto, argumentou que devido à pandemia essa não é uma decisão que será tomada agora, pois precisa acontecer "dentro de um contexto de mais normalidade social".

"Estamos no meio de uma crise grave que assola o país", disse. "Precisamos assentar a poeira, fazer o melhor trabalho possível já nesse início de gestão, com os melhores resultados, e, enquanto fazemos esse trabalho, ter uma análise permanente de qual a melhor estrutura e organização para a entrega da Segurança Pública e da Justiça".