Correio braziliense, n. 20845 , 18/06/2020. Cidades, p.21

 

Covid-19 avança nas cidades periféricas

Walder Galvão

18/06/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Com o crescimento acelerado do novo coronavírus no Distrito Federal, especialistas alertam que, caso a capacidade de resposta do sistema de saúde seja comprometida, a volta do isolamento social será necessária. No total, são 330 mortes na capital

Em meio ao aumento dos casos do novo coronavírus, o Distrito Federal passou pela retomada de uma série de atividades suspensas devido à pandemia. Uma das consequências dessa medida é o crescimento diário de diagnósticos, o que pode impactar na resposta do serviço de saúde — as UTIs das redes pública e privada, por exemplo, chegaram a 70% da capacidade. Além disso, a doença migrou da região central e passou a ter maior incidência nas cidades consideradas de periferia (veja mapa). Especialistas alertam que o relaxamento no isolamento social pode atrapalhar a melhora do quadro. Hoje, a capital tem 27.140 infectados e 330 mortos pela doença.

No início da pandemia, Lago Sul, Plano Piloto e Águas Claras lideravam o ranking da covid-19 no DF. Mas o perfil mudou. Atualmente, Ceilândia, a cidade mais populosa da capital, tem a maior quantidade de pessoas com coronavírus. Apenas a região contabiliza 3.455 casos confirmados. Em seguida, aparecem Plano Piloto (2.036), Taguatinga (1.898), Samambaia (1.709), Gama (1.339) e Guará (985).

Pesquisa divulgada na terça-feira pela Companhia de Planejamento (Codeplan) reforça a mudança no perfil das vítimas da covid-19. De acordo com o estudo, as regiões mais pobres passaram a concentrar o maior número de óbitos. Por exemplo, Ceilândia tem 81 moradores mortos pelo coronavírus, seguido por Samambaia, onde 37 pessoas faleceram.

Em dados proporcionais, à exceção do Lago Sul, regiões fora da área central da capital também estão na frente no número de infectados. Em primeiro lugar está o Riacho Fundo 1, com 1.330 diagnosticados a cada 100 mil habitantes. O Lago Sul, com 1.260, ocupa a segunda posição. Em seguida, estão Estrutural (1.212), Sobradinho (1.184) e Paranoá (1.130).

O diretor científico da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, José David Urbaez, explica que essa mudança do quadro de diagnosticados, além da quantidade populacional de cada localidade, também se deve à falha do isolamento social estabelecido na capital. “Podemos interpretar esse contexto como uma falta de planejamento nacional. O país está abrindo as atividades econômicas enquanto há aumento de casos. Em outros países, como na Europa, China e Nova Zelândia, isso só aconteceu quando houve queda franca de diagnósticos”, frisou.

De acordo com o especialista, o vírus passou a atingir os segmentos mais vulneráveis, que são as periferias, pelas ausências de isolamento adequado, de acesso aos serviços de saúde e de sustento socioeconômico. “A União não ofereceu dispositivos para garantir que essas pessoas ficassem em casa”, explicou. Urbaez reforçou que promover a circulação de pessoas enquanto retoma-se as atividades econômicas impacta na propagação do vírus de forma irreversível.

O infectologista reconhece que o DF, na saúde, tem capacidade superior às demais unidades federativas. Porém, com o avanço, o sistema sofre sobrecarga. “O distanciamento, o uso correto de máscaras e ficar atento aos sintomas são pressupostos que a gente tem certeza de que a população vulnerável não consegue cumprir. Portanto, Brasília deve seguir os passos de Curitiba, onde abriram tudo e, depois, correram para fechar”, alertou.

Capacidade

Em nota, a Secretaria de Saúde justificou o aumento de casos nas regiões distantes do centro pela densidade populacional. “Como o coronavírus tem alta transmissibilidade, em áreas com maior número de pessoas, a transmissão também é mais rápida. As regiões periféricas registram significativa aglomeração de pessoas nos espaços urbanos e em ambientes domiciliares”, alegou.

Questionada sobre medidas de enfrentamento à disseminação da doença, a pasta informou que a primeira ação tomada foi o início da testagem em massa. Segundo a Secretaria de Saúde, todo caso notificado como coronavírus passa por investigação epidemiológica. Além disso, os diagnósticos feitos no modelo drive-thru são orientados a permanecer em quarentena, e as equipes das unidades básicas de saúde fazem o acompanhamento dos pacientes e monitoram a evolução da doença.

De acordo com o órgão, a orientação é de que a população siga as normas sanitárias a fim de evitar a disseminação da doença. “No momento, especialistas apontam como principais medidas para evitar o contágio o uso de máscara, a higienização frequente das mãos e manter o distanciamento social, evitando aglomerações”, ressaltou.