Correio braziliense, n. 20838 , 11/06/2020. Política, p.8

 

MPF vai investigar anúncios do governo

Augusto Fernandes

11/06/2020

 

 

O Ministério Público Federal (MPF) vai investigar se a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) cometeu atos de improbidade administrativa por ter financiado cerca de 2 milhões de anúncios publicitários que foram divulgados em sites pornográficos, páginas que difundem fake news e jogos de azar e em endereços eletrônicos que promovem o presidente Jair Bolsonaro. As informações são do jornal O Globo.

O MPF pediu à secretaria a lista das páginas que divulgaram as propagandas oficiais. Além disso, o órgão vai apurar o contrato entre a Secom e a plataforma AdSense, serviço de publicidade oferecido pelo Google, responsável por ter direcionado os anúncios do governo. O secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, terá prazo de 10 dias para se manifestar ao MPF sobre o caso.

As informações sobre as peças publicitárias foram reveladas em um relatório produzido pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News. Segundo o documento, a maior parte dos anúncios estava relacionada à campanha do governo para promover a reforma da Previdência, aprovada no ano passado no Congresso.

A verba da Secom foi distribuída por meio do Google AdSense, que paga um valor ao site a cada vez que um usuário clica na publicidade ou apenas visualiza. No topo da lista dos que mais receberam verba pública para divulgar a publicidade oficial está o site “Resultados Jogo do Bicho”, com 319.082 impressões — a quantidade de vezes que o anúncio foi exibido aos usuários do site. O jogo do bicho é proibido no Brasil e sua prática é considerada uma contravenção.

No total, o governo bancou 653,4 mil anúncios em 47 sites de fake news. O que mais recebeu dinheiro, com 66.431 peças veiculadas em pouco mais de um mês, foi o portal Sempre Questione, que publica conteúdos falsos  como textos sobre múmias alienígenas e portais para o inferno.

Na semana passada, a Secom eximiu-se da responsabilidade e culpou o Google. “A Secom não fará nenhum investimento no blog A ou B ou Z. Na Secom do presidente Bolsonaro não há desvios, não há favorecimento de A, B ou Z. A Secom preza a tecnicidade e a economicidade”, disse Wajngarten.

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Edson Fachin pede ajustes em inquérito

Jorge Vasconcellos

11/06/2020

 

 

Com uma série de recados à cúpula do governo, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou, ontem, pela constitucionalidade do inquérito que investiga a divulgação de notícias falsas e ataques a ministros da Corte, desde que, segundo ele, comprovado “risco efetivo à independência do Poder Judiciário”. O magistrado é o relator da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), de autoria do partido Rede Sustentabilidade, que questiona a legalidade da apuração.

A sigla contesta o fato de o inquérito das fake news ter sido instaurado de ofício pelo presidente do STF, Dias Toffoli, ou seja, sem a provocação do Ministério Público Federal (MPF). O partido reclamou, também, da indicação do ministro Alexandre de Moraes como relator da investigação, sem que tenha havido sorteio entre os magistrados, como ocorre normalmente.

Em seu voto, Fachin considerou constitucional o artigo 43 do Supremo, que autoriza a abertura de inquérito pela própria Corte em caso de ameaça a seus membros. Segundo o ministro, o STF tem competência para adotar essa medida sempre que houver omissão de outros órgãos de controle em relação às ameaças ao tribunal.

O relator também enviou um recado às autoridades e às manifestações que pregam a desobediência às decisões do STF e o fechamento da Corte. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, já ameaçou descumprir ordens do Supremo e participou de manifestações que pediam uma intervenção militar com o fechamento do Congresso e da Corte. “Desobediência à ordem de tribunal, por exemplo, é tão grave, que, a depender do sujeito ativo, configura crime de responsabilidade. É o que se colhe do inciso sétimo do artigo 85 da Constituição”, disse.

Fachin também observou que o inquérito deve abrir espaço para a participação efetiva do Ministério Público Federal e deixar fora da investigação “matérias jornalísticas e postagens, compartilhamentos ou outras manifestações, inclusive pessoais, na internet, feitas anonimamente ou não, desde que não integrem esquemas de financiamento e divulgação em massa nas redes sociais”.

Antes do voto do relator, o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu a continuidade da investigação, mas cobrou uma participação efetiva do MPF. Já o advogado-geral da União, José Levi, embora tenha considerado o inquérito constitucional, fez sugestões de aprimoramentos, entre os quais, o respeito à liberdade de expressão.

Após o voto de Fachin, o presidente do STF, Dias Toffoli, suspendeu o julgamento da ação e agendou o prosseguimento para a próxima semana.

Rejeição

Recentemente, a Rede pediu ao ministro Edson Fachin para desistir da ação, mas o magistrado rejeitou a solicitação a partir do entendimento de que a matéria é altamente relevante, além do fato de que, nesse tipo de caso, não pode haver desistência.