Correio braziliense, n. 20830 , 03/06/2020. Saúde, p.14

 

Adiar o isolamento ajuda o vírus a se espalhar

03/06/2020

 

 

Cada dia de atraso na adoção de medidas de distanciamento social aumenta em 2,4 dias a duração do surto da covid-19, mostra estudo americano. Segundo cientistas, o fenômeno ocorre tanto em cidades que não registram mais infecções quanto nas que enfrentam o problema

Postergar a adoção de medidas de distanciamento social tem influência direta no tamanho do impacto do novo  coronavírus em uma comunidade, alertam cientistas estadunidenses. A equipe analisou dados de 58 cidades chinesas e chegou à conclusão de que aquelas que demoraram mais tempo para implementar iniciativas do tipo, como o fechamento de escolas e do comércio, enfrentam um período maior de disseminação do Sars-CoV-2 entre os seus habitantes.

Em média, cada dia a mais sem as medidas de proteção social acrescenta 2,4 dias à duração do surto. Dessa forma, esperar uma semana após os primeiros sinais da doença para adotar essas práticas pode exigir mais 17 dias de distanciamento social. “Cada dia (a mais de isolamento) economiza esforços, economiza pessoas infectadas e, provavelmente, salva vidas. Isso é particularmente importante, pois precisamos pensar nas próximas semanas e nos próximos meses”, alerta Lauren Ancel Meyers, professora de biologia integrativa e líder do consórcio de estudos sobre a covid-19 da Universidade do Texas em Austin.

Os resultados foram publicados na última edição da revista Emerging Infectious Diseases e, segundo Meyers, são aplicáveis para os diversos contextos da pandemia: cidades que venceram o surto, aquelas com risco de enfrentar novamente o Sars-CoV-2 e comunidades que lidam, agora, com os casos de infecção. “Nossas descobertas têm implicações no atual momento das intervenções em cidades dos Estados Unidos”, ilustra a cientista.

Contenção

Para determinar quando um surto foi contido, a equipe analisou a contagem de casos das cidades chinesas e determinou o tamanho da disseminação do patógeno, uma medida que mostra quantas pessoas podem ser infectadas a partir de um indivíduo que tenha o coronavírus.  Quando o número ficava abaixo de 1, considerava-se que o surto havia sido contido na comunidade.

A partir das informações obtidas no estudo, não se pode determinar quais medidas de distanciamento social são as mais eficazes. Mas, segundo Lauren Ancel Meyers, é possível afirmar que o momento de adoção da primeira medida de distanciamento social, independentemente do tipo, tem um grande impacto sobre o controle do Sars-CoV-2. “Fornecemos evidências diretas, baseadas em dados, de que o momento das intervenções tem um impacto substancial sobre a duração de um surto, sobre a eficácia de nossas intervenções e, finalmente, sobre quantas pessoas podem estar infectadas e morrerem”, enfatiza.

A cientista aponta ainda contextos específicos em que a implementação imediata de medidas protetivas pode ter efeitos ainda mais significativos. “O impacto dos atrasos pode ser particularmente importante para comunidades propensas à transmissão rápida, como casas de repouso, faculdades, escolas e cadeias. Precisamos de planos concretos para quando e como responder a casos crescentes e, dessa forma,  evitar restrições desnecessariamente longas e caras”, defende.

Simulação

Diferentemente do estudo americano, a maioria dos estudos que têm sido conduzidos sobre consequências da interrupção ou da adoção de medidas de isolamento é feita a partir de modelagens computacionais. Recentemente, pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts e da Georgia Tech, ambos nos Estados Unidos, apresentaram um simulador capaz de revelar como medidas de distanciamento poderão afetar estados do país.

A ferramenta usa os dados mais recentes de cada comunidade e modelagem de doenças infecciosas. Os cálculos mostram cenários que combinam com os apresentados pela equipe liderada pela Universidade do Texas em Austin:  interromper as restrições muito cedo pode resultar em uma segunda onda de infecções e mortes.

“Os formuladores de políticas precisam tomar decisões rapidamente. Nossa análise mostra que mesmo uma semana pode ter um enorme impacto na trajetória futura da covid-19. Desenvolvemos o simulador para informar essas decisões importantes nesse ambiente altamente incerto”, enfatiza Jagpreet Chhatwal, cientista sênior do Instituto de Avaliação de Tecnologia do Hospital Geral de Massachusetts e professor-assistente da Harvard Medical School.

Frase

"Cada dia (a mais de isolamento) economiza esforços, economiza pessoas infectadas e, provavelmente, salva vidas”

Lauren Ancel Meyers, líder do consórcio de estudos sobre a covid-19 da Universidade do Texas em Austin

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Teste genético em 10 minutos

03/06/2020

 

 

Um teste genético — ou seja, com acurácia semelhante à do padrão ouro, o PCR — que fica pronto em 10 minutos. E que, além disso, dispensa o uso de técnicas laboratoriais avançadas, reduzindo não só o tempo, mas o custo. Foi o que conseguiram cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, em um exame experimental, descrito na revista de nanotecnologia da Sociedade Norte-Americana de Química.

O teste detecta visualmente a presença do vírus — e não apenas dos anticorpos, como os sorológicos — em menos tempo que os mais rápidos disponíveis hoje, e que têm a desvantagem de não fazerem o diagnóstico da doença, mas apenas indicar se houve contato com o patógeno. Diferentemente do PCR e de outros métodos de análise genômica, não é preciso converter o RNA viral em DNA e, em seguida, amplificá-lo. Basta expor a amostra a uma solução com nanopartículas de ouro plasmônico. Se o Sars-CoV-2 estiver presente, a substância muda de cor.

O teste é feito com amostra coletada do nariz ou da saliva. Um processo que leva cerca de 10 minutos extrai o material genético do vírus, comprovando a sua presença. Para isso, entra em ação uma molécula altamente específica que, conectada às nanopartículas de ouro, consegue identificar uma proteína que existe apenas no Sars-CoV-2. O exame permite visualizar o patógeno porque, quando a molécula se liga ao RNA viral, as nanopartículas de ouro transformam a cor do reagente de roxo para azul.

Acessível

“A precisão de qualquer teste para a covid-19 depende da capacidade de detectar o vírus com segurança. Ou seja, não fornecer um resultado falso negativo se o vírus realmente estiver presente, nem um resultado falso positivo se ele não estiver lá”, diz o líder do estudo, Dipanjan Pan, professor de radiologia diagnóstica da instituição. “Muitos dos testes de diagnóstico disponíveis no mercado não conseguem detectar o vírus até vários dias após a infecção. Por esse motivo, eles têm uma taxa significativa de resultados falso negativo”, diz. Embora admita que sejam necessários mais estudos, o cientista acredita que o novo exame seja capaz de identificar o Sars-CoV-2 no primeiro dia de contágio.

Pan ressalta que o teste poderá ser mais barato tanto para produção quanto no processamento do resultado. “Ele não requer equipamento de laboratório ou pessoal treinado para ser executado e analisado”, diz. Segundo o pesquisador, se o novo método teste atender às expectativas da Food and Drug Administration (FDA), poderá ser usado em creches, lares de idosos, campus universitários e locais de trabalho, para monitorar as infecções.