Correio braziliense, n. 20831 , 04/06/2020. Política, p.8

 

Menos dinheiro contra covid-19

Alessandra Azevedo

04/06/2020

 

 

PODER » Bolsonaro barra repasse de R$ 8,6 bilhões para o combate à pandemia, que viria do Fundo de Reserva Monetária, extinto por uma lei. Entre as justificativas, o desrespeito ao teto de gastos, pois cria despesa obrigatória sem demonstrar qual o impacto no orçamento

O presidente Jair Bolsonaro barrou o repasse de R$ 8,6 bilhões ao combate à pandemia do novo coronavírus no país. O dinheiro viria do Fundo de Reserva Monetária (FRM), extinto pela lei 14.007/2020, originária da Medida Provisória (MP) 909/2019, aprovada pelo Congresso em 13 de maio. Ao sancionar a matéria, ontem, o presidente vetou o trecho que assegurava que o valor seria usado no enfrentamento da crise da covid-19.

Quando aprovaram o projeto, os parlamentares garantiram, no texto, que o dinheiro do fundo seria transferido integralmente, em 2020, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios “para a aquisição de materiais de prevenção à propagação da covid-19”. Ao assinar a matéria, no entanto, Bolsonaro retirou essa obrigação. O dinheiro, portanto, não tem mais uma destinação definida.

O objetivo do presidente, quando enviou a MP ao Congresso, era acabar com o fundo e usar os recursos para financiar a dívida pública federal. Mas, como o texto foi avaliado no meio da pandemia, as prioridades no Congresso eram outras. Os parlamentares acharam melhor aplicar os recursos em ações para diminuir os impactos da crise do novo coronavírus, uma pauta emergencial. O presidente e a equipe econômica não concordaram com a mudança.

No veto, publicado no Diário Oficial da União (DOU) de ontem, Bolsonaro argumenta que a matéria violava os princípios da reserva legal e do poder geral de emenda, que proíbe que parlamentares aumentem, por emenda, despesa prevista em projeto de iniciativa exclusiva do presidente da República, como MPs. Ele também justifica que a mudança desrespeita o teto de gastos, porque cria despesa obrigatória sem demonstrar o impacto orçamentário. 

Surpresas

Como o texto tinha apoio de aliados do governo, o veto pegou parlamentares e parte do Executivo de surpresa. O ministro da Secretaria-Geral, Jorge de Oliveira Francisco, comemorou a sanção, no Twitter, sem levar em conta o veto. Com a extinção do fundo, “serão transferidos (recursos) para Estados, Municípios e Distrito Federal combaterem a covid-19”, escreveu. Alertado por usuários da rede, ele apagou a publicação em seguida.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também mostrou perplexidade. “A informação que eu tinha, dos deputados, é que tinha ocorrido um acordo para a destinação desses recursos”, observou Maia.

“É o direito do presidente (o veto). Cabe ao Parlamento chamar uma sessão do Congresso e decidir pela manutenção ou pela derrubada”, acrescentou.

A proposta dos parlamentares era de que metade do dinheiro do FRM fosse para os estados e a outra parte, para os municípios. Nos dois casos, o valor deveria ser usado exclusivamente para compra de materiais para prevenir a propagação da covid-19.

Quando propôs a MP, em dezembro do ano passado, o governo queria destinar todo o dinheiro ao pagamento da dívida pública federal. Mas, diante da pandemia da covid-19, que já matou mais de 30 mil pessoas no Brasil, o Parlamento considerou mais justo usar a verba para reforçar a saúde pública.

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Redivisão do MJ no radar

Sarah Teófilo

04/06/2020

 

 

Jair Bolsonaro afirmou ontem que existe a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança Pública. A pasta foi unida ao Ministério da Justiça, no começo do governo, e entregue ao ex-juiz Sérgio Moro para comandá-la –– que, aliás, conseguiu impedir seu desmembramento, como o próprio presidente defendeu durante algum tempo. E, como no ano passado, novamente o ex-deputado Alberto Fraga é cotado para assumi-la.

“Eu sou amigo do Fraga desde 1982. Não vou dizer que seja ele e nem que não seja. Ele está livre de todos os problemas que teve aí. É um grande articulador. Ele é cotado aí, mas nada de bater martelo”, afirmou. Os “problemas” aos quais Bolsonaro se referiu é um processo contra Fraga, por acusações de recebimento de propina, na época em que era secretário de Transporte do Distrito Federal, no governo de José Roberto Arruda. Em março passado, o ex-líder da chamada “bancada da bala” no Congresso foi absolvido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal das acusações de concussão. Mas o ex-deputado não está sozinho na disputa, como deixou claro o próprio Bolsonaro.

“A tal bancada da segurança tem essa intenção (de recriar o ministério). Talvez eu converse com o (deputado federal) capitão Augusto (PL-SP) esta semana. Se a gente decidir voltar, já vou dar o nome do ministro antes de começar a tramitar o projeto, para evitar especulações”, garantiu.

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Indicado do Centrão entrou e saiu

Augusto Fernandes

Ingrid Soares

04/06/2020

 

 

A permanência de Alexandre Borges Cabral à frente do Banco do Nordeste (BNB) durou poucas horas. Indicado para o governo federal pelo Centrão, ele havia assumido o cargo há dois dias, mas foi exonerado ontem devido a uma investigação em curso no Tribunal de Contas da União (TCU), que apura suspeitas de irregularidades em contratações feitas pela Casa da Moeda durante o período em que esteve à frente da estatal, em 2018. O prejuízo é estimado em R$ 2,2 bilhões, de acordo com o jornal O Estado de S.Paulo, que revelou o caso.

O BNB confirmou a saída de Cabral via nota . O superintendente responsável pelas relações com investidores do banco, Sérgio Brito Clark, disse que a instituição soube do inquérito “somente por meio da mídia” e que a instituição “assim sendo, reitera seu compromisso de transparência e tempestividade de comunicação dos fatos aos seus acionistas”.

“O Conselho de Administração tem pautado suas deliberações de forma diligente, rigorosamente em conformidade com as boas práticas de governança corporativa e em estrita observância da legislação vigente”, frisou Clark. No lugar de Cabral, assumirá interinamente Antônio Jorge Pontes Guimarães Júnior, atualmente diretor financeiro e de crédito, cargo que ele acumulará até que seja eleito um novo presidente definitivo para o BNB.

A investigação cai como um balde de água fria para o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política do Palácio do Planalto com o Congresso. Na semana passada, ele elaborou uma carta aos “companheiros de farda” do Exército para justificar que a aproximação com o Centrão é “necessária para a aprovação dos inúmeros projetos clamados pela sociedade e é parte importante da minha missão, que será cumprida”.

Ontem, Bolsonaro se esquivou da responsabilidade das negociações com o Centrão. Ao conversar com apoiadores, comentou que não é ele quem coordena as indicações do grupo. “Sou responsável por 30 mil servidores que são comissionados pelo Brasil”, saiu-se.