Correio braziliense, n. 20831 , 04/06/2020. Política, p.6

 

Bolsonaro reafirma: protestos terroristas... 

Ingrid Soares

Augusto Fernandes

04/06/2020

 

 

Os protestos antifascismo e contrários ao governo do presidente Jair Bolsonaro receberam fortes críticas do Planalto. Na terça-feira à noite, o chefe do Executivo chamou os manifestantes de “terroristas e marginais” e, ontem, reafirmou sua declaração: “Quem promove o caos, queima a bandeira nacional e usa da violência como uma forma de ‘protestar’ é terrorista, sim! Manifestante, contra ou a favor do governo, é outra coisa”, tuitou. Já o vice-presidente Hamilton Mourão tachou os integrantes dos movimentos de “delinquentes e baderneiros”.

Os dois repudiaram os episódios de violência e depredação de patrimônios públicos, no domingo, pelo país e afirmaram que as manifestações não são atos em defesa da democracia. Eles também temem que as cenas voltem a acontecer, pois protestos estão agendados para o fim de semana.

“São marginais, no meu entender, terroristas. Têm ameaçado, no domingo, fazer movimentos pelo Brasil, em especial aqui no DF. Não podemos deixar que o Brasil se transforme no que foi há pouco tempo o Chile. Não podemos admitir isso”, refutou Bolsonaro, na noite de terça-feira. “Isso não é democracia nem liberdade de expressão. Isso, no meu entender, é terrorismo.”

Mourão reforçou as palavras do presidente. “Aonde querem chegar? A incendiar as ruas do país, como em 2013? A ensanguentá-las, como aconteceu em outros países? Isso pode servir para muita coisa, jamais para defender a democracia”, argumentou o vice, em artigo publicado, ontem, no jornal O Estado de S. Paulo. “E o país já aprendeu quanto custa esse erro. A legítima defesa da democracia está fundada na prática existencial da tolerância e do diálogo.”

Além disso, ambos sinalizaram com a possibilidade de o governo atuar com mais rigidez no combate a futuros protestos. Bolsonaro, por exemplo, comentou que policiais necessitam de respaldo para poder trabalhar com mais truculência: “Nós precisamos de uma retaguarda jurídica para que nosso policial possa bem trabalhar em se apresentando um crescente este tipo de movimento que não tem nada a ver com democracia”.

Já Mourão destacou que “baderneiros são caso de polícia, não de política”. “Não é admissível que, a título de se contrapor a exageros retóricos impensadamente lançados contra as instituições do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, assistamos a ações criminosas serem apoiadas por lideranças políticas e incensadas pela imprensa”, criticou. “A prosseguir a insensatez, poderá haver quem pense estar ocorrendo uma extrapolação das declarações do presidente da República ou de seus apoiadores para justificar ataques à institucionalidade do país.”

...E parlamentares repudiam declarações

O posicionamento do presidente Jair Bolsonaro e do vice Hamilton Mourão, que chamaram manifestantes de “terroristas” e “delinquentes”, foi entendido pelo Congresso como uma tentativa de o Executivo ter justificativas para promover processos de escalada autoritária e de esvaziamento da democracia no país. “Ele (Bolsonaro) quer que esse clima de caos social se instale na oposição para ter o pretexto de implementar um golpe ditatorial e de que é preciso colocar ordem. Temos que denunciar essa fala como mais uma demonstração de que ele quer, de fato, endurecer o regime. Bolsonaro não tem nenhum apreço pela democracia”, alertou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Parlamentares chamaram Bolsonaro de terrorista por causa do episódio que antecedeu a saída dele das Forças Armadas no fim da década de 1980: teria elaborado um plano de explodir bombas em quartéis do Exército para reivindicar um salário maior. “Se, quem luta pela democracia é terrorista, quem é expulso do Exército por planejar explodir um quartel com bombas é o quê?”, tuitou a deputada Sâmia Bonfim (PSol-SP).

Deputados e senadores lamentaram que os protestos do fim de semana tenham registrado conflitos entre manifestantes e policiais e disseram ser contra qualquer tipo de ataque ao patrimônio público. No entanto, frisaram que foi Bolsonaro quem instaurou o clima de revolta na população. “A inversão de fatos se tornou política de governo. O presidente não tem exageros retóricos. Ele comete crimes contra a Lei de Segurança Nacional e crimes de responsabilidade todos os dias, insuflando o ódio da população brasileira contra o Judiciário, contra o Congresso Nacional, contra a imprensa, contra a própria democracia”, ponderou o líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ).