O globo, n. 31674, 26/04/2020. País, p. 13

 

Centrão amigo

Leandro Prazeres

Aguirre Talento

26/04/2020

 

 

Tão logo o ministro Sergio Moro pediu demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, na última sexta-feira, o presidente Jair Bolsonaro e seus ministros receberam mensagens de dirigentes partidários do chamado centrão — bloco da Câmara que reúne legendas como PP, PL, Republicanos, PSD e PTB — parabenizando o governo pela saída do ex-juiz da Lava -Jato. Foi o resultado das iniciativas de aproximação entre Bolsonaro e figuras batizadas de “velha política”, tanto pela longevidade na carreira, quanto pelas denúncias e investigações criminais contra elas.

Bolsonaro fez acenos a lideranças do centrão nas últimas semanas, abrindo espaço no seu governo para indicações do bloco. O presidente também se aconselhou com dirigentes ligados ao centrão, como o presidente nacional do PP, Ciro Nogueira (PI) e o deputado federal Arthur Lira (PP-AL), para quem gravou até um vídeo em tom amistoso. A aproximação tem o objetivo de construir uma base no Congresso Nacional, ponto frágil do governo desde o início da atual legislatura, em janeiro de 2019, e que foi aprofundada em meio ao racha no PSL —sigla abandonada pelo presidente em outubro passado — e à perda de popularidade de Bolsonaro nas ruas, segundo pesquisas de opinião.

Lira, aliás, é visto como um dos candidatos favoritos de Bolsonaro para suceder Rodrigo Maia (DEM-RJ) no comando da Câmara. Segundo aliados do presidente, veio de Lira a ideia de devolver ao Palácio do Planalto as negociações sobre os comandos dos cargos do governo.

No passado, os então articuladores do governo Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Joice Hasselmann (PSL-SP) distribuíram os cargos em reuniões na casa de Maia. Agora, o governo volta a redistribuir os mesmos postos, mas em negociações dentro do Palácio do Planalto, em movimento que tem o objetivo de enfraquecer o presidente da Câmara. Lira tenta se fortalecer na disputa pelo comando da Casa e enfraquecer o nome apoiado por Maia, de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). O alinhamento de Bolsonaro a políticos do centrão, porém, abre um flanco na narrativa adotada pelo presidente de ser um político “contra o sistema” e intolerante à corrupção. Líderes que vêm mantendo contato com Bolsonaro, como o deputado federal Marcos Pereira (Republicanos-SP), o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o presidente do PSD, Gilberto Kassab, tiveram amplo trânsito nos governos do PT e do MDB nos últimos anos.

— Estou lutando contra o establishment. Continua não sendo fácil, mas hoje em dia já conto com muitos parlamentares dentro do Congresso que comungam desta tese, de vários partidos — disse Bolsonaro em pronunciamento na sexta. Após o discurso, uma das manifestações de apoio veio do ex-deputado Roberto Jefferson, cassado em 2005 por conta do mensalão e atual presidente nacional do PTB. Jefferson elogiou a demissão de Moro e afirmou que o exministro cometeu uma “traição” a Bolsonaro.

NOVOS ALIADOS DO PRESIDENTE

 Roberto Jefferson

Presidente nacional do PTB. Foi condenado pelo STF a sete anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso conhecido como "mensalão", além de ter perdido seus direitos políticos. Em 2018, foi denunciado pela PGR por um esquema de concessão fraudulenta de registros sindicais no Ministério do Trabalho. A denúncia foi recebida pela Justiça Federal do Distrito Federal e está em tramitação

Valdemar da Costa Neto

Foi condenado a sete anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo STF no caso do "mensalão". Ele foi acusado de receber R$ 8,8 milhões em troca do apoio do extinto PL (atual PR) ao governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

Arthur Lira

Deputado federal (PP-AL), Lira é um dos principais cotados para assumir a presidência da Câmara dos Deputados quando Rodrigo Maia (DEM-RJ) terminar o seu mandato. Ele é réu em dois casos que tramitam no STF. Em um deles, é acusado de fazer parte do "quadrilhão do PP", assim como Ciro Nogueira. Em outro, é acusado de ter recebido R$ 106 mil em propina para manter apoio político ao ex-presidente de uma estatal.

Gilberto Kassab

Foi prefeito de São Paulo, ministro das Cidades durante a gestão de Dilma Rousseff (PT) e ministro da Ciência e Tecnologia de Michel Temer (MDB), além de atual presidente nacional do PSD. Réu em duas ações que tramitam na Justiça de São Paulo. Em uma delas, é acusado de ter recebido R$ 21 milhões da Odebrecht. Também é investigado em caso referente a delações de executivos da J&F, que relataram R$ 58 milhões pagos em vantagens indevidas a Kassab