O globo, n. 31684, 06/05/2020. País, p. 7

 

Guerrilhas virtuais

Naira Trindade

Natália Portinari

06/05/2020

 

 

Grupos organizaram ataques nas redes contra Moraes e stf

Mensagens mostram que houve uma ação coordenada nos grupos bolsonaristas de Telegram e WhatsApp para impulsionar as interações contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF, logo após ele determinar a suspensão da nomeação de Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal.

Enquanto a Polícia Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) apuram em um inquérito aberto desde o ano passado a autoria de disparos de mensagens com ataques à Corte, a militância continua atuante na ponta. Mensagens às quais o GLOBO teve acesso mostram que houve uma ação coordenada em grupos no Telegram e no WhatsApp, que reúnem dezenas de milhares de membros, para impulsionar as interações contra Alexandre de Moraes, na semana passada.

Os grupos operam como espaços de distribuição de conteúdos e também de instrução sobre o que e como compartilhar em redes sociais como o Twitter. Era de lá que partiam ordens com o objetivo de convocar a militância a usar as hashtags #STFditador e #STFVergonhaNacional. Com a mobilização, rapidamente as palavras ganharam destaques nos trending topics, os assuntos mais comentados no Twitter. As ações coordenadas nesses grupos são, na maioria das vezes, comandadas por perfis fictícios.

Tão logo o ministro do STF determinou a imediata suspensão da nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal, grupos bolsonaristas deram início a uma campanha difamatória contra o magistrado nas redes sociais. Na tentativa de tirar a credibilidade do ministro, cards — como são chamados os cartões produzidos para viralizar —mostravam Alexandre de Moraes com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), desafeto do presidente Jair Bolsonaro, e também com o deputado federal Aécio Neves (PSDB), flagrado em um áudio com o empresário Joesley Batista, da J&F, acertando o recebimento de R$ 2 milhões para pagar advogados.

O GLOBO teve acesso a mensagens de seis grupos diferentes de apoiadores no Telegram e outros três no WhatsApp. No Telegram, o Exército Bolsonaro, com 31.715 membros, movimenta diariamente cerca de 10 mil mensagens. Há outros com nome de Bolsonaro Presidente, com 12.354 membros, ou Bolsonaro Guerreiro, um grupo menor, com 989 membros. E até mesmo Bolsonaro 24horas, com 912. Segundo interlocutores, esses grupos impõem regras de participação e param de funcionar de madrugada, retomando as postagens às 6h. Ao contrário do WhatsApp, que limitou o encaminhamento de mensagens e o número de participantes dos grupos para evitar o compartilhamento de desinformação, o Telegram não tem essas restrições.

MILHARES DE MEMBROS

Caso mais recente, Alexandre Moraes não é o único alvo dos militantes. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), são vítimas frequentes da militância bolsonarista. Além de Congresso e Supremo, ministros do governo Bolsonaro também já entraram na mira da militância, como é o caso de Tereza Cristina (Agricultura), que virou alvo por ser filiada ao DEM. Nem mesmo Paulo Guedes (Economia), Walter Braga Netto (Casa Civil) ou Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) se livraram do assédio de militantes. Esses últimos sofreram ataques de olavistas após ganharem título de “conselheiros” do presidente.

Nas últimas duas semanas, os ex-ministros Luiz Henrique Mandetta (Saúde) e Sergio Moro (Justiça) também foram bombardeados nos grupos de apoiadores do presidente. Moro postou nas redes sociais após deixar o governo estar assistindo a “uma campanha de fake news nas redes sociais e em grupos de Whats App para me desqualificar” e afirmou “não se preocupar”, pois já passou pelo mesmo durante a Operação Lava-Jato.