O globo, n. 31679, 01/05/2020. Especial Coronavírus, p. 13

 

Combate à corrupção não é prioridade do governo, diz Moro

01/05/2020

 

 

Em entrevista à ‘Veja’, ex-ministro criticou aproximação com centrão 

PABLO JACOB/24-4-2020Saída. Moro no dia em que anunciou sua demissão do governo Bolsonaro

 O ex-ministro da Justiça Sergio Moro afirmou que “o combate à corrupção não é prioridade do governo” Jair Bolsonaro. Ele deu entrevista à revista “Veja”. Moro pediu demissão na sexta-feira passada com um discurso contundente, no qual acusou o presidente de ter tentado interferir indevidamente na atuação da Polícia Federal, o que motivou abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal. Moro disse que vai apresentar provas das suas acusações.

—Sinais de que o combate à corrupção não é prioridade do governo foram surgindo no decorrer da gestão. Começou com a transferência do Coaf para o Ministério da Economia. O governo não se movimentou para impedir a mudança. Depois, veio o projeto anticrime. O Ministério da Justiça trabalhou muito para que essa lei fosse aprovada, mas ela sofreu algumas modificações no Congresso que impactavam a capacidade das instituições de enfrentar a corrupção. Recordo que praticamente implorei ao presidente que vetasse a figura do juiz de garantias, mas não fui atendido — afirmou à revista, complementando:

— É bom ressaltar que o Executivo nunca negociou cargos em troca de apoio, porém mais recentemente observei uma aproximação do governo com alguns políticos com histórico não tão positivo. E, por último, teve esse episódio da demissão do diretor da Polícia Federal sem o meu conhecimento. Foi a gota d’água.

O ex-ministro reafirmou na entrevista que Bolsonaro não tinha motivos lícitos para afastar o diretor-geral da Polícia Federal Alexandre Valeixo.

Moro negou que tivesse interesse em trocar a substituição do diretor da PF por uma vaga no STF em novembro, quando Celso de Mello se aposenta. Afirmou também que nunca teve a intenção de ser algoz de Bolsonaro. O ex-ministro disse ainda que gosta pessoalmente do presidente e que há vários ministros técnicos no governo, tendo elogiado especialmente Paulo Guedes (Economia). O ex-ministro descartou novos projetos na política, neste momento.

— Não tenho nenhuma pretensão eleitoral. Não me filiei a partido algum. Nunca foi meu plano. Estou num nível de trabalho intenso desde 2014. Quero folga. E não quero pensar em política neste momento — afirmou, dizendo que pretende buscar emprego na iniciativa privada.

O ex-ministro da Justiça também reclamou de ataques recebidos por ele e por sua mulher depois de ter feito acusações contra o presidente. E lembrou que o mesmo expediente foi usado quando esteve à frente de processos que levaram a condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Um dos motivos do desgaste de Moro e da direção da PF foi a investigação do atentado que Bolsonaro sofreu durante a campanha. O presidente não acredita que Adélio Bispo de Oliveira agiu sozinho. À revista, Moro afirmou que a suspeita da existência de um mandante para o crime não pode ser descartada enquanto a investigação não for concluída.