Valor econômico, v.21, n.5018, 09/06/2020. Política, p. A6

 

Senado posterga votação de projeto sobre 'fake news'

Renan Truffi 

09/06/2020

 

 

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), decidiu adiar, mais uma vez, a votação do projeto de combate à disseminação das "fake news", de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). A explicação é que o relator da proposta, senador Angelo Coronel (PSD-BA), pediu mais tempo para formatar o seu parecer. Nos bastidores, no entanto, Alcolumbre tem defendido que o Congresso deve aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre um inquérito relacionado ao assunto, para que, enfim, o Legislativo avance na deliberação do tema.

"Meu relatório não ficou pronto. Solicitamos mudança da pauta para próxima semana. [É uma] matéria complexa onde todas as arestas devem ser aparadas", disse o senador Angelo Coronel.

Além disso, o governo Jair Bolsonaro entrou nas articulações para ajudar a construir um entendimento sobre o assunto. O Executivo teme que a proposta tenha como alvo aliados, como é o caso do chamado "gabinete do ódio", grupo que atuaria dentro do Planalto para produzir "fake news" contra opositores. Essa acusação é refutada pelo presidente Jair Bolsonaro. "[Estamos] Tentando construir um acordo. Importante aguardar decisão do STF", defendeu o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, marcou para amanhã o julgamento de uma ação que questiona a validade do inquérito das "fake news". A investigação foi aberta em 2019 para apurar ameaças a ministros do tribunal e a disseminação de conteúdo falso na internet. Com isso, o projeto de Alessandro Vieira não deve voltar à pauta em menos de duas semanas.

Nos últimos dias, a cúpula do Congresso passou a defender que os parlamentares construam um texto de consenso sobre a questão. O objetivo é passar uma imagem de união do Parlamento em torno da proposta, caso o Palácio do Planalto decida vetar algum dos dispositivos. Uma votação expressiva a favor do texto nas duas Casas anteciparia a Bolsonaro o sentimento dos congressistas. Caso vete, o presidente já saberia que há disposição no Parlamento para derrubar esses mesmos vetos.

Na prática, entretanto, pelo menos dois senadores estão trabalhando em propostas diferentes. O primeiro é Alessandro Vieira, autor do projeto, que tem diálogo direto com as plataformas e movimentos da sociedade civil. Ele elaborou um substitutivo da sua própria proposta. O segundo é o relator, Angelo Coronel, que ainda está trabalhando num relatório sobre o assunto. Por ser presidente da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) das "Fake News", Coronel tem o apoio de algumas bancadas, cujos integrantes participam do colegiado e têm auxiliado na coleta de depoimentos e nas investigações.

Já o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), escalou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) para fazer a interlocução com "think tanks" e especialistas em comunicação na web. A ideia é que ele apresente um substitutivo em nome da Câmara para que o texto seja levado à mesa de negociação com os senadores. O ponto de maior preocupação para as plataformas é o que trata da identificação do usuário. Isso porque um dos artigos sugere que as redes sociais passem a requerer documentos, como RG e CPF, dos internautas.