O Estado de São Paulo, n.46211, 25/04/2020. Política, p.A14

 

Políticos citam renúncia ou impeachment

Caio Sartori

Adriana Ferraz

25/04/2020

 

 

Fernando Henrique pede que presidente ‘renuncie antes de ser renunciado’; ontem, dois pedidos de impeachment foram protocolados

Perdizes. Capitais têm panelaços durante pronunciamento de Bolsonaro sobre a saída de Moro do Ministério da Justiça

O anúncio da saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública, ontem pela manhã, repercutiu imediatamente no meio político. Representantes de diferentes partidos e alas ideológicas, entre eles ex-presidentes da República, chegaram a defender publicamente o impeachment ou a renúncia do presidente Jair Bolsonaro. Após a fala de Moro, ao menos dois pedidos de impeachment de Bolsonaro foram protocolados ontem – um assinado pela antiga aliada, e hoje adversária, a deputada Joice Hasselman (PSL-SP), e o outro protocolado por parlamentares da Rede.

Em mensagem publicada no Twitter, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pediu a renúncia porque, segundo ele, a sociedade deve ser poupada de mais um processo de impeachment. “É hora de falar. Pr (presidente da República) está cavando sua fossa. Que renuncie antes de ser renunciado. Poupe-nos de, além do coronavírus, termos um longo processo de impeachment”, afirmou FHC. “Que assuma logo o vice para voltarmos ao foco: a saúde e o emprego. Menos instabilidade, mais ação pelo Brasil”, escreveu o tucano, fazendo referência ao vice-presidente Hamilton Mourão.

Por meio de nota, Michel Temer disse que o Brasil está atravessando “a maior crise da sua história”. Dilma Rousseff afirmou no Twitter que “se o sr. Moro tivesse 10% da sinceridade que tentou transmitir na entrevista-delação contra Bolsonaro, seu ex-chefe, teria aproveitado e pedido desculpas ao povo brasileiro por todas as mentiras que contou sobre Lula.” O senador e ex-presidente, Fernando Collor (PROS-AL), afirmou que Moro “fez revelações gravíssimas, que deixam o governo numa posição constrangedora e vulnerável. O quadro institucional é nebuloso.”

O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), disse ao Estado que as acusações de Moro a Bolsonaro “são graves” e podem configurar crimes como advocacia administrativa e abuso de autoridade. Segundo ele, a discussão sobre o impeachment do presidente se tornou “inevitável”. “Cabe agora o Supremo decidir essa questão”, disse.

O tucano João Doria, governador de São Paulo, limitou-se elogiar o agora ex-ministro. “Moro mudou a história do País ao comandar a Lava Jato e colocar dezenas de corruptos na cadeia. Deu sinal de grandeza ao deixar a magistratura, para se doar ainda mais ao nosso País como ministro.” Doria e Witzel são apontados como possíveis adversários de Bolsonaro na corrida presidencial de 2022.

Na Câmara, aliados de Bolsonaro se limitaram a reafirmar apoio ao presidente. O deputado Marco Feliciano (Podemos-SP) publicou mensagem apenas com a hastag #FechadoComBolsonaro e a mensagem “SEM MAIS!”. Já a oposição focou nos crimes supostamente cometidos por Bolsonaro. Marcelo Freixo (PSOL-RJ ) afirmou que o presidente “quer intervir na PF para ter acesso a todas as investigações, protegendo seus filhos, e para usar o aparato de inteligência da instituição em benefício de seu projeto de poder autoritário.”

No Senado, um dos maiores defensores de Moro e da operação Lava Jato na Casa, Alvaro Dias (Podemos-PR), disse ao Estado que seu partido voltará a convidar Moro para se filiar à legenda e disputar a Presidência”. “Ele seria o mais forte dos candidatos”, afirmou. Os presidentes das duas Casas, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) não comentaram.

Adversários de Bolsonaro na campanha presidencial de 2018 também repercutiram a mudança no ministério. O petista Fernando Haddad afirmou que Moro apontou diversos crimes de responsabilidade supostamente cometidos por Bolsonaro. Segundo ele, os ministros, especialmente os militares, deveriam renunciar a seus cargos e forçar a renúncia. “O impeachment é processo longo. A crise sanitária e econômica vai se agravar se nada for feito.”

Ciro Gomes (PDT) ironizou afirmando que na “confrontação chocante” entre Moro e Bolsonaro, o País “ganha muito com a briga em si”. “Só hoje já tivemos notícia de uma lista de artigos do código penal além de crime de responsabilidade.”

Normalmente discreta nas redes sociais, Marina Silva (Rede) publicou diversas mensagens sobre o assunto. Em uma delas, disse que “o rei está nu” “Sua máscara moralista acaba de ser publicamente arrancada.”

Apontado como eventual candidato em 2022, o apresentador de TV, Luciano Huck afirmou que, com a saída de Moro, “infelizmente desponta uma crise política, institucional e jurídica em meio a uma pandemia.”

Foco

“(O presidente da República) está cavando sua fossa. Que renuncie antes de ser renunciado. Poupe-nos de, além do coronavírus, termos um longo processo de impeachment. Que assuma logo o vice para voltarmos ao foco: a saúde.”

Fernando Henrique Cardoso

EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA