O globo, n. 31686, 08/05/2020. Especial Coronavírus, p. 10

 

Ex-subsecretário estadual de saúde é preso no rio

Chico Otávio

08/05/2020

 

 

Gabriell Neves é suspeito de ter comprado mil respiradores, essenciais para pacientes graves da Covid-19, com sobrepreço

REPRODUÇÃO DE TV/REDE GLOBODetido. Gabriell Neves já havia sido afastado do cargo após auditoria interna

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) apreendeu ontem 25 respiradores na operação Mercadores do Caos, desencadeada contra uma organização criminosa formada para obter vantagens em contratos emergenciais, com dispensa de licitação, para a compra destes equipamentos, essenciais para pacientes em estado grave, infectados pelo novo coronavírus. Um dos presos foi o ex-subsecretário executivo de Saúde do estado, Gabriell Neves Franco, responsável pelas compras.

Em reportagem publicada em 20 de abril, O GLOBO mostrou o envolvimento de Gabriell na compra emergencial de mil ventiladores pulmonares. O negócio, com dispensa de licitação, envolve o empenho de R$ 183,5 milhões em recursos do Fundo Estadual de Educação (FES) direcionados para três contratos de fornecimento junto a distribuidoras sem tradição no mercado, a ARC Fontoura Indústria, Comércio e Representações, a MHS Produtos e Serviços e a A2A Comércio Serviços e Representação.

Além de Gabriell, afastado do cargo por conta de uma auditoria interna, foram presas outras três pessoas até o fim da tarde de ontem, de um total de 13 mandados: Gustavo Borges da Silva, que substituiu interinamente o subsecretário e que hoje era coordenador de logística da secretaria; Cinthya Silva Neumann,

sócia da ARC Fontoura, e Aurino Batista de Souza Filho, dono da A2A. Glauco Octaviano Guerra, proprietário da MHS, encontra-se foragido.

 ENTREGUES A HOSPITAIS

Os 25 respiradores foram encontrados na sede da ARC Fontoura , e, após autorização judicial, entregues à Secretaria estadual de Saúde. De acordo com o MP, o secretário da pasta, Edmar Santos, será comunicado para imediata efetivação dos aparelhos na rede pública.

Dados extraídos do site Transparência.RJ mostram que o governo fluminense antecipou pelo menos R$18 milhões pelos equipamentos. Uma comparação feita pelo GLOBO, com a ajuda de um especialista, entre os valores pagos às três fornecedoras e as cotações de mercado sinaliza que houve sobrepreço. Ventiladores pulmonares do mesmo modelo dos 300 comprados da MHS custam em torno de R$ 21 mil (quase nove vezes mais barato). No caso dos 400 aparelhos fornecidos pela ARC, um contrato firmado no mesmo período pelo Hospital Universitário Pedro Ernesto (Uerj) pagou à fornecedora Magnamed

Tecnologia por 10 ventiladores semelhantes R$ 37,4 mil a unidade (cerca de um quarto do preço). No caso da A2A, o Blog do Berta revelou que cada aparelho adquirido pelo governo saiu por R$ 198 mil, mas o valor cobrado pelo mercado, para cada unidade, fica entre R$ 70 mil e R$ 80 mil.

A investigação contou com o apoio do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Sonegação Fiscal e aos Ilícitos contra a Ordem Tributária, de agentes da Coordenadoria de Segurança e Inteligência e da Delegacia Fazendária.

A Secretaria de Saúde informou que “aguarda o fim da investigação para aplicar as sanções cabíveis a pessoas e empresas” e que “já havia cancelado o contrato com a A2A”. Afirmou ainda que “adotará medidas pertinentes caso haja irregularidades ou descumprimento em qualquer um dos contratos realizados durante a pandemia”.