O globo, n. 31686, 08/05/2020. Especial Coronavírus, p. 9

 

Rede privada em colapso

Renata Mariz

08/05/2020

 

 

Seis estados já têm 90% ou mais de utis ocupadas

MÁRCIA FOLETTAlerta. Presidente do setor afirma que já faltam leitos de UTI na rede privada

O presidente da Confederação Nacional de Saúde, Breno Monteiro, afirmou que seis estados já vivem situação de colapso até na rede particular no que se refere à disponibilidade de leitos em UTI devido à pandemia do coronavírus. Segundo ele, que representa a iniciativa privada do setor da saúde no país, o problema foi identificado no Amazonas, no Pará, no Ceará, em Pernambuco, no Maranhão e no Rio de Janeiro.

—Nesses estados temos um colapso nos dois sistemas. Contratar leitos de UTI privados,nesses locais,já não é mais uma saída —alertou.

Segundo Monteiro, a Covid-19 levou a uma necessidade elevada de UTIs que nem mesmo a rede privada, acostumada a trabalhar com um nível de ociosidade maior do que o SUS, consegue atender.

De acordo com ele, ter 90% ou mais de UTIs ocupadas, com pacientes disputando leitos que vão sendo vagos, já configura colapso, sobretudo em meio a uma pandemia.

Médico, o presidente da confederação afirma estar vivendo os “piores dias” de sua vida. Ele mora em Belém, um dos locais com estrutura de saúde mais afetados:

— É muito triste ver as pessoas implorando por leitos, seja na rede pública ou privada.

IBGE APONTA SATURAÇÃO

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) detalhou ontem a distribuição de insumos médicos essenciais para pacientes graves e do efetivo de profissionais de saúde pelos municípios do Brasil. No momento em que o coronavírus avança para as periferias, o número de leitos do SUS nas cinco capitais mais afetadas chama a atenção.

São Paulo, Rio e Fortaleza, que lideram o ranking de casos e óbitos, não passaram da marca de dez leitos a cada 100 mil habitantes. A capital paulista, com população de 12,2 milhões, tem 3.504 ao todo, dos quais 1.226 no SUS. No Rio, são 515 leitos públicos em um universo de 2.517 unidades.

— Há várias regiões com mais de 200 mil habitantes que não têm leito de UTI. Essas pessoas vão às capitais, pressionando o sistema de saúde — avalia Claudio Stenner,coordenador de Geografia e Meio Ambiente do IBGE.

No Ceará, a cidade vizinha a Fortaleza é Caucaia. São 360 mil habitantes e nenhum leito de UTI. No estado do Rio, Belford Roxo tem mais de meio milhão de habitantes e também não conta com sequer um leito de terapia intensiva.

No sistema público, as estatísticas mais confortáveis são as de Recife — 992 leitos, dos quais 460 do SUS. A cidade, no entanto, já registra 3.069 casos e 337 óbitos.

Os dados de leitos não levam em conta os hospitais de campanha, mas trazem um amplo panorama. Manaus tem 291 leitos de UTI, incluindo privados. É o equivalente a 11 a cada 100 mil habitantes. A OMS recomenda que haja de dez a 30.

Se analisados os números estaduais, incluindo SUS e setor privado, o DF lidera o ranking nacional, com 30 leitos por 100 mil habitantes, mas é apenas o 14º mais afetado do país, segundo o Ministério da Saúde. O Rio de Janeiro,que já está com o sistema saturado, aparece em segundo, com 25 leitos por 100 mil habitantes.

São Paulo, Pernambuco e Ceará têm, respectivamente, 19, 16 e 9 leitos a cada 100 mil habitantes. O Amazonas, que vive uma situação dramática, tem apenas sete. Roraima é o estado menos assistido, com quatro leitos de UTI a cada 100 mil habitantes. O tempo de recuperação dos doentes, que gira em torno de duas semanas, é um dos principais desafios. Na prática, cada leito só pode ser ocupado por dois pacientes ao mês.