O globo, n. 31649, 01/04/2020. Especial Coronavírus, p. 6

 

Alinhados

Thais Arbex

Gustavo Maia

Vinicius Sassine

Manoel Ventura

01/04/2020

 

 

Ministros apoiam mandetta contra divergência

Uma mesa formada pelos principais ministros envolvidos no combate ao coronavírus explicitou uma união em torno da posição de Luiz Henrique Mandetta pela necessidades de manutenção de medidas de distanciamento social. Coordenador do gabinete de crise, o titular da Casa Civil, Braga Netto, fez questão de destacar que a posição do colega era também a dele e a de Paulo Guedes (Economia) e Sérgio Moro (Justiça), considerados os mais poderosos auxiliares de Bolsonaro desde o início do governo.

— Os ministros concordam plenamente com a posição do ministro Mandetta — disse Braga Netto, depois de o titular da Saúde responder sobre orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) a respeito da prevenção à epidemia.

A cena ilustrou um apoio a Mandetta, desgastado pelas posições que o presidente Jair Bolsonaro vinha adotando a favor do isolamento vertical, que tem restrições mais brandas do que as recomendadas até aqui pelo Ministério da Saúde. A unidade dos ministros ocorre num momento em que a ascensão do vereador Carlos Bolsonaro (RepublicanosRJ), filho do presidente, tem incomodado o alto escalão da Esplanada dos Ministérios. Alguns ministros chegaram à avaliação de que, hoje, se criou um governo paralelo para a condução da crise, dada a influência do vereador sobre o presidente.

A decisão de Bolsonaro de instalar o filho em uma sala próxima a seu gabinete no Planalto, como antecipado pela colunista Bela Megale, deu força à avaliação de que a família tem tido mais influência sobre o presidente do que o próprio ministério.

Na tarde de ontem, enquanto Guedes, Moro, Mandetta e Braga Netto davam coletiva à imprensa no Planalto, o presidente gravava o pronunciamento exibido à noite em cadeia nacional de rádio e TV, no qual adotou um tom mais moderado em relação ao enfrentamento da epidemia no país.

Outro sinalização da divisão dentro do governo veio na elaboração do texto da proposta de emenda constitucional que vem sendo chamada de “Orçamento de guerra” no Congresso. A proposta previa antes que caberia a Mandetta comandar um comitê gestor dos recursos. Agora, o texto diz que isso fique concentrado nas mãos do presidente.

O ministro Braga Netto tem assumido a função de apaziguar o clima no governo. Embora a postura de Bolsonaro também esteja incomodando parte da ala militar, a avaliação é a de que, neste momento, é preciso agir para que se consiga, ao menos, passar à sociedade a imagem de que todos estão atuando em conjunto.

Segundo o GLOBO apurou, Bolsonaro mostrou irritação com os recentes gestos de Guedes e Moro a favor do isolamento social defendido por Mandetta. O presidente se sente desautorizado pelos auxiliares, mas, hoje, não teria condições políticas de aventar qualquer demissão em sua equipe.

Achegada de Carlos ao Planalto também reativou o clima de caça às bruxas. Assessores palacianos temem, inclusive, ser vistos pelo filho do presidente—orece i o éde qu evirem alvo de ataques e acabem sendo alijados do governo. Assessores temem estar sendo vigiados ou até gravados pelo filho do presidente. Alguns já relatam que vão tomar cuidado com quem atendem em seus gabinetes, parada conspiração sobre vazamento de informações.

A sala em que Carlos irá “despachar” — no terceiro andar, ao lado do gabinete presidencial —era ocupada pelo assessor especial de assuntos internacionais, Filipe Martins. Filipe sobe para o quarto andar. Segundo fontes, a sala do assessor foi esvaziada originalmente para atender à primeira-dama, Michelle Bolsonaro, no programa Pátria Voluntária, que também deve trabalhar de lá.

MILITARES DIVIDIDOS

Entre os militares, há divergências. Enquanto o vice-presidente Antônio Hamilton Mourão já se posicionou a favor do distanciamento social e o Ministério da Defesa e a Casa Civil têm atuado em parceria com a Saúde, as ideias até ontem expressadas pelo presidente pelo fim do isolamento eco entre generais da cúpula das Forças Armadas dão vazão à posição do presidente.

No Alto Comando do Exército, há entre os generais quem defende o mesmo que Bolsonaro vinha defendendo: a possibilidade de relaxamento do isolamento social, mesmo com indicadores mostrando o êxito da prática tanto em cidades brasileiras quanto em outros países. Segundo esses generais, as medidas de saúde pública não podem suplantar os efeitos negativos na economia. Militares que integram a cúpula decisória do Exército se mostram a favor de uma mudança “gradual” no tipo de isolamento necessário para lidar com a pandemia.