O Estado de São Paulo, n.46210, 24/04/2020. Política, p.A7

 

Supremo cobra Maia sobre pedido de impeachment

Rafael Moraes Moura

24/04/2020

 

 

Autores da ação acusam presidente da Câmara de ser omisso na análise do tema; Planalto vê andamento do caso com preocupação

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, decidiu ontem fixar um prazo de 10 dias para que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), apresente informações sobre um pedido de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro que não foi apreciado até hoje.

Maia é acusado por dois advogados, autores da ação, de ser omisso na análise do tema. O Palácio do Planalto acompanha com preocupação o andamento do caso na Suprema Corte.

Integrantes do STF ouvidos reservadamente pelo Estado avaliam que pedidos dessa natureza costumam ser arquivados de prontidão pelos relatores, já que cabe à Câmara decidir sobre afastamento de presidente.

Apontam que, ao pedir informações a Maia e incluir formalmente Bolsonaro no processo, Celso de Mello deu sinais de que pode dar prosseguimento à ação, cujo desfecho tem potencial de imprevisibilidade.

A expectativa é a de que o decano utilize o caso para mandar duros recados ao Planalto, após Bolsonaro ter participado de ato antidemocrático no último domingo – convocado contra o STF e o Congresso. Para um ministro, o caso pode servir até mesmo para pavimentar eventualmente o impeachment do presidente da República.

Crítico. O decano é uma figura muito respeitada entre os colegas e se tornou uma das vozes mais contundentes do tribunal contra o comportamento de Bolsonaro. Celso já disse que o presidente “transgride” a separação entre os Poderes, “minimiza” a Constituição e não está “à altura do altíssimo cargo que exerce”. O ministro se aposenta em novembro, quando completará 75 anos, abrindo a primeira vaga na Corte para indicação de Bolsonaro.

“Entendo prudente solicitar, no caso, prévias informações ao senhor presidente da Câmara dos Deputados, que deverá manifestar-se, inclusive, sobre a questão pertinente à cosgnoscibilidade da presente ação”, escreveu o decano, em sua decisão pontuada por grifos, palavras em negrito, frases sublinhadas e referência a entendimentos da Corte, como é de seu costume.

Autores de um pedido de impeachment protocolado na Câmara, os advogados José Rossini Campos (ex-conselheiro da OAB) e Thiago Santos de Pádua (ex-assessor da ministra Rosa Weber, do STF) acionaram o Supremo para que Rodrigo Maia analise imediatamente a abertura de um processo contra Bolsonaro. O presidente da Câmara tem se esquivado sobre o assunto.

Na Corte, Corrêa e Pádua pedem liminar para obrigar Maia a considerar o pedido. Cobram, ainda, a divulgação do exame de covid-19 feito por Bolsonaro. Ao menos 23 pessoas da comitiva que acompanhou o presidente em viagem aos Estados Unidos, no mês passado, já foram infectadas pelo novo coronavírus. Bolsonaro informou em redes sociais que o resultado de seus exames deu negativo, mas até hoje ainda não divulgou os laudos. O governo se recusou a divulgar os dados ao Estado via Lei de Acesso à Informação.

Os advogados acusam Bolsonaro de praticar crime de responsabilidade e querem que o presidente fique impedido de publicar nas redes sociais qualquer conteúdo que contrarie as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Bolsonaro defende um afrouxamento do distanciamento social para a retomada da atividade econômica no País.

Segundo os advogados, Bolsonaro teria cometido supostos crimes de responsabilidade em diversas ocasiões: a divulgação da campanha “O Brasil Não Pode Parar”, suspensa por ordem judicial; a ida a manifestações com pedidos pró-intervenção militar; a demissão do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta – em meio à crise sanitária do novo coronavírus –, e a falta de transparência em relação ao seu próprio teste para a covid-19, que não foi publicamente divulgado.

Informações

“Entendo prudente solicitar, no caso, informações ao presidente da Câmara, que deverá manifestar-se sobre a questão.”

Celso de Mello

MINISTRO DO SUPREMO