Correio braziliense, n. 20816 , 20/05/2020. Negócios, p.13

 

Socorro chega ao setor elétrico

Simone Kafruni

20/05/2020

 

 

Governo baixa decreto que pode injetar até R$ 14 bilhões para evitar um buraco no caixa das distribuidoras de energia. Inadimplência deu um salto de 3% para 12%, depois que uma MP isentou os consumidores de baixa renda de pagarem a conta de luz durante a pandemia

A ajuda ao setor elétrico deve adiar a necessidade de reajuste nas tarifas de energia. Na noite da segunda-feira, o governo publicou decreto que regulamenta a Medida Provisória 950/2020, em edição extra do Diário Oficial da União (DOU). O socorro pode chegar a R$ 14 bilhões para evitar um rombo no caixa das distribuidoras, uma vez que a inadimplência saltou de 3% para 12%, depois que a MP isentou os consumidores de baixa renda de pagarem a conta de luz durante a pandemia e permitiu atraso sem corte. As concessionárias também tiveram perda de receita com a queda na demanda por eletricidade.

O objetivo do Decreto 10.350 é diminuir os efeitos da crise sobre o setor como um todo, explicou Mario Menel, presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase). Conforme disse, a regulamentação sinaliza uma divisão de responsabilidades, diferentemente das ajudas anteriores às distribuidoras, quando toda a conta recaía sobre os consumidores.

 Apesar de o governo não ter divulgado o valor dos empréstimos, que serão capitaneados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), junto ao sindicato dos bancos, Menel estima algo em torno de R$ 14 bilhões. “A necessidade é bilionária. O faturamento do setor é de R$ 240 bilhões por ano e há uma inadimplência que chega a 12% e queda de carga de 15%”, explicou.

Segundo Menel, está para sair uma nova medida provisória para dar um comando legal de uso dos fundos setoriais, como Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), Proinfra e de eficiência energética, para abater a conta a ser paga pelas empresas e pelos consumidores.

Liquidez

No entender de Marcos Madureira, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), grande parte remete à Aneel regulações, possibilita a criação da conta-covid para cobrir a redução de mercado de 18% e o aumento da inadimplência. “O decreto tem um efeito diferente: usa ativos que já estão dentro das distribuidoras. Ou seja, tomam-se esses valores, antecipando que serão pagos pelo consumidor no próximo ano”, explicou.

 Para Charles Lenzi, presidente da Associação Brasileira das Geradoras de Energia Limpa (Abragel), o decreto é uma medida fundamental para todo o setor. “A Abragel sempre apoiou a ideia de uma injeção de liquidez no caixa das distribuidoras tendo em vista seu papel estrutural. O decreto também fortalece as premissas de respeito aos contratos”, opinou.

Alexei Vivan, presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (ABCE), disse que vê com bons olhos o decreto. “As distribuidoras tiveram brusca redução do seu mercado consumidor. Mas a situação extrema e fora de parâmetros autoriza a adoção dessa medida. Foi uma forma de os bancos se sentirem confortáveis em dar empréstimos às distribuidoras”, analisou.

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Castello: crise do petróleo é a pior em 100 anos

Simone Kafruni

20/05/2020

 

 

A indústria do petróleo está passando pela maior crise dos últimos 100 anos, com queda na demanda e nos preços internacionais, e o cartel da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) não funciona, senão teria evitado o colapso do setor em 2014. As afirmações são do presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, que participou, ontem, de uma videoconferência ao vivo promovida pelo Banco Safra. “Com respeito a Arábia Saudita, sou cético sobre o poder do cartel. Há evidência empírica que isso é ilusório. A maior das evidências foi a guerra de preços com a Rússia”, destacou.

Segundo Castello Branco, ao longo da história da Opep, não houve punição nem compliance. “O grupo não cumpre as metas estabelecidas. A própria Arábia Saudita, após a covid-19, e após o acordo com a Opep+ (o cartel mais alguns produtores aliados), estava vendendo petróleo com desconto”, observou. O comentário foi feito como análise da drástica redução nos preços do produto, que estava sendo provocada pelo cartel antes mesmo da queda brusca na demanda com a chegada da pandemia.

Segundo Castello Branco, a Petrobras ainda tem “sequelas do assalto de que foi vítima”. E, por isso, tem que apostar nos ativos que podem render o máximo retorno. “Existem outros operadores que conseguem extrair performance melhor em alguns ativos Temos um plano de desinvestimento grande, que estamos executando desde o ano passado. Nada mudou, apesar das dificuldades da grave recessão global”, ressaltou.

O presidente da estatal repetiu o que tinha comentado durante o anúncio do prejuízo de R$ 48,5 bilhões da Petrobras no primeiro trimestre de 2020. “Acreditamos que haverá recuperação da economia mundial, mas será lenta, assim como a recuperação da indústria do petróleo. Temos que nos preparar para preços mais baixos”, reformou. As projeções da estatal começam em US$ 25 este ano, reagindo lentamente até se acomodar em US$ 50, em 2025. “O capital está mais escasso e temos que aprovar apenas os projetos que resistam a isso”, acrescentou.

Sobre o prejuízo bilionário da companhia, bem absorvido pelo mercado, Castello Branco afirmou que não houve surpresa nenhuma. “A baixa de ativos foi de US$ 13,2 bilhões. Temos que trabalhar com a realidade. Não queremos trazer informações falsas para o investidor. Não tínhamos obrigação de fazer isso agora, mas o mercado entendeu e valorizou isso”, explicou.