Valor econômico, v.21, n.4993, 05/05/2020. Política, p. A8

 

Câmara deve votar socorro aos Estados sem alteração

Raphael Di Cunto

Lu Aiko Otta

05/05/2020

 

 

Após embates com o ministro da Economia, Paulo Guedes, a cúpula da Câmara dos Deputados agora trabalha para aprovar o projeto de socorro financeiro aos Estados e municípios sem mudanças em relação ao texto do Senado e, com isso, permitir que a proposta vá direto para sanção presidencial e os repasses comecem rapidamente. A decisão, contudo, encontra resistências entre os governadores.

O Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) divulgou nota ontem dizendo que o repasse aprovado pelo Senado é R$ 23,7 bilhões menor se comparado à versão inicial da Câmara. Das perdas, 80% ficaram com os Estados. O cálculo considera uma queda no ICMS e ISS na ordem de 30% - a proposta da Câmara era que o governo federal compensasse essa queda na arrecadação.

Essa fórmula desagradou ao governo, que viu nela um "cheque em branco", e negociou alterações no Senado. Com as modificações, o projeto passou a contemplar um valor fixo para a ajuda: R$ 60 bilhões em transferências por quatro meses e mais R$ 60 bilhões em suspensões e renegociações de dívidas (grande parte delas, já em vigor por outras leis ou decisões judiciais).

Para o Comsefaz, o projeto, tal como aprovado pelo Senado, é insuficiente para fazer frente à queda de receita e às novas despesas em função da pandemia causada pela covid-19. Os secretários de Fazenda também discordaram da fórmula de divisão dos recursos: 60% para os Estados e 40% para os municípios. Hoje, a divisão do bolo do ICMS e do ISS é 67% para Estados e 33% para os municípios.

Apesar das reclamações, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que ele e a maioria dos líderes defendiam votar o projeto sem alterações. A ideia era votar ontem à noite, mas isso ainda não tinha ocorrido até o fechamento desta edição porque a Câmara estava concentrada em outros projetos. Era possível que o texto fosse adiado para hoje.

"O projeto avançou no Senado. O governo não queria dar nenhum centavo para os governadores e prefeitos e agora aceitou fazer um repasse num montante parecido com o que a Câmara propôs", disse. Nas contas dele, o repasse de R$ 60 bilhões por quatro meses é próximo dos R$ 83 bilhões por seis meses, se considerado o repasse mensal.

O grande embate ainda é a forma de distribuição dos recursos, que privilegiou Estados e municípios menos desenvolvidos, ignorando qual a perda de arrecadação de cada um - o que, na opinião dos entes mais ricos, pode gerar distorções, de cidades com mais dinheiro em meio à pandemia do que tinham no ano passado. Mais para a frente, afirmou Maia, será possível discutir outro projeto para compensar os Estados, como os do Sul, que perderam recursos com a nova forma de distribuição. Mas o "ping-pong" da proposta, que teria que ser votada de novo no Senado se houvesse alterações, "não interessa a ninguém". "Não devemos ter conflito entre Câmara e Senado e nunca teremos", disse Maia.

O deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) deve ser indicado novamente relator no plenário. "Estamos trabalhando para não ter alterações", afirmou.