Correio braziliense, n. 20808 , 12/05/2020. Saúde, p.14

 

Covid no Brasil desde o início de fevereiro

12/05/2020

 

 

Estudo divulgado ontem pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) revelou que o Sars-CoV-2 circulou por até quatro semanas sem ser detectado em países da Europa e das Américas. A partir da análise de registro de óbitos, a pesquisa concluiu que, no Brasil, a transmissão comunitária do novo coronavírus começou no início de fevereiro, bem antes do anúncio oficial do primeiro caso da covid-19.

Nas análises, os pesquisadores da Fiocruz usaram um método chamado de estatística de inferência para analisar registros de mortes. Por meio da técnica, eles constataram que, enquanto os países monitoravam os viajantes e confirmavam os primeiros casos importados da doença, a transmissão comunitária da doença estava em curso.

Na Europa, de acordo com o estudo, a circulação do novo coronavírus teve início em meados de janeiro, na Itália. Entre o fim daquele mês e o início de fevereiro, desembarcou na Bélgica, na França, na Alemanha, na Holanda, na Espanha e no Reino Unido, segundo a pesquisa publicada na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz.

Os pesquisadores constataram que na cidade de Nova York, nos Estados Unidos, o vírus estava em circulação na primeira semana de fevereiro, mesma época em que começou a se espalhar pelo território brasileiro. Pelos cálculos da Fiocruz, pelo menos 20 dias antes do diagnóstico do homem que havia retornado a São Paulo de uma viagem à Itália, em 26 de fevereiro. E quase 40 dias antes das primeiras confirmações oficiais de transmissão comunitária, em 13 de março.

Rastreamento

Também na Itália, na Holanda e nos Estados Unidos, assinalam os especialistas, a disseminação comunitária estava ocorrendo havia duas a quatro semanas quando os primeiros casos importados do Sars-CoV-2 foram identificados pela confirmação de testes laboratoriais entre viajantes. Os autores do estudo destacam que, em todos os países analisados, o novo coronavírus começou a proliferar antes da implementação de medidas de controle, como restrições de viagens aéreas e distanciamento social.

“Esse período bastante longo de transmissão comunitária oculta chama a atenção para o grande desafio de rastrear a disseminação do vírus e indica que as medidas de controle devem ser adotadas, pelo menos, assim que os primeiros casos importados forem detectados em uma nova região geográfica”, destacou, em um comunicado divulgado pela FioCruz, Gonzalo Bello, pesquisador do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular da instituição e coordenador da pesquisa, que contou com a participação de cientistas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e Universidade da República (Udelar), no Uruguai.

Os especialistas destacam que os resultados do estudo reforçam a importância da adoção de ações permanentes de vigilância molecular, uma vez que o vírus pode voltar a circular e causar surtos ao longo dos próximos anos. “A intensa vigilância virológica é essencial para detectar precocemente a possível reemergência do vírus, informando os sistemas de rastreamento de contatos e fornecendo evidências para realizar as medidas de controle apropriadas”, ressaltou Gonzalo Bello.