O globo, n. 31637, 20/03/2020. Especial Coronavírus, p. 8

 

Fronteiras fechadas

Leandro Prazeres

Gustavo Maia

Renata Mariz

André de Souza

20/03/2020

 

 

 Recorte capturado

Casos crescem 45%, e país veta entrada por vias terrestre e aérea

 No dia em que o país chegou à sétima morte de infectados por coronavírus e 640 casos confirmados — um aumento de 45% em relação à quarta-feira —, o governo anunciou mais medidas restritivas na tentativa de conter o avanço da doença no país. A principal foi o fechamento para estrangeiros das fronteiras terrestres com oito países vizinhos na América do Sul.

Foi definida também a proibição à entrada de estrangeiros nos aeroportos brasileiros, a partir de segunda-feira, vindos da China, da Europa e de mais países Os Estados Unidos não estão na lista. Segundo a portaria publicada pelo governo federal na noite de ontem, esse fechamento das vias aéreas tem duração de 30 dias e não vale para cidadãos brasileiros e outras exceções.

Já a entrada de estrangeiros vindos da Argentina, Bolívia, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, do Paraguai, Peru e Suriname pelas vias terrestres está proibida. Essa restrição já estava valendo para a Venezuela e deve ser estendida ao Uruguai. O fechamento das fronteiras terá prazo de 15 dias, que pode ser prorrogado mediante recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A decisão foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) ontem e é assinada pelos ministros Moro, Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde). A portaria aponta que haverá outra medida específica com relação à fronteira com o Uruguai.

O AVANÇO DA DOENÇA

A proibição não se aplica a brasileiros natos ou naturalizados, imigrantes com prévia autorização de residência definitiva no Brasil, profissionais estrangeiros em missão a serviço de organismo internacional e funcionários estrangeiros acreditados junto ao governo brasileiro. Também está liberado o tráfego de pessoas que vivem nas chamadas “cidades-gêmeas” com linha de fronteira exclusivamente terrestre.

A medida também não impede o livre tráfego do transporte rodoviário de cargas e a execução de ações humanitárias transfronteiriças previamente autorizada pelas autoridades sanitárias locais. Ao anunciar o fechamento em suas redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que há “mais ações a caminho pensando também no inevitável impacto financeiro das famílias envolvidas”, mas não detalhou quais seriam.

Em entrevista ontem, o ministro Mandetta, junto a secretários, reforçou a necessidade de isolamento para tentar conter o coronavírus. Ontem, houve a confirmação de uma quinta morte em São Paulo. Somando as duas no Rio, são sete no país. Apenas os estados do Amapá, Mato Grosso, Paraíba, Piauí, Rondônia e Roraima não têm casos confirmados.

Mandetta fez um apelo apelo à população que fique em casa por 14 dias caso apresente sinais da doença:

—Quando a gente fala: está gripado, está com sintomas, (vá para o) isolamento domiciliar com a sua família. E isolamento domiciliar não é assim: eu vou descer para tomar banho de piscina e vamos dar uma festa no play. Isolamento domiciliar é isolamento domiciliar. E repetiu:

— Vamos primeiro na educação e consciência. Vamos medir esta semana. Por favor, brasileiros: caso de gripe, recolha sua família e fiquem em isolamento — completou o ministro.

CONTÁGIO COMUNITÁRIO

Ontem, a pasta decidiu também orientar que médicos deem atestados também aos familiares do doente com síndrome gripal sem necessidade de presença dele na consulta, em locais que registram transmissão sustentada. Isso ocorre quando não é mais possível identificar a origem da infecção e já atinge, segundo o ministério, os estados de São Paulo e Pernambuco, as cidades do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre, e na região do município de Tubarão, em Santa Catarina.

O secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Erno Harzheim, explicou o que o aumento de casos de transmissão comunitária vai significar na prática: se houver sintomas parecidos aos da gripe, a pessoa será tratada como se tivesse o novo coronavírus, independentemente de teste.

O ministro Mandetta disse que inevitavelmente o número de casos ainda vai subir bastante:

— Estamos no pé da montanha. Vamos começar a subir a montanha —afirmou.