O globo, n. 31655, 07/04/2020. Especial Coronavírus, p. 13

 

Nova confusão com a China

07/04/2020

 

 

Embaixada acusa weintraub de comentário ‘racista’

A Embaixada da China no Brasil respondeu na madrugada de ontem a comentários do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que acusou Pequim, sem embasamento, de esconder informações sobre o coronavírus do resto do mundo para posteriormente lucrar com leilões de equipamentos médicos. A embaixada afirmou que as postagens têm “cunho fortemente racista”, causando “influências negativas” nas relações bilaterais. O governo chinês instou, ainda, “alguns indivíduos do Brasil” a pararem com “acusações infundadas”.

Em resposta, o ministro negou ter sido racista, afirmando “ter um monte de amigos chineses e conhecer a cultura” do país. Ele disse, ainda, que pedirá desculpas se o país oriental vender mil respiradores a preço de custo para o Brasil.

A nova crise diplomática, desencadeada menos de um mês após a polêmica deputado federal Eduardo Bolsonaro( PSL-SP), teve origem em uma postagem já deletada no Twitter de Weintraub, em que o personagem Cebolinha, dos gibis da Turma da Mônica, era utilizado para fazer comentários o país oriental, maior parceiro comercial do Brasil e marco zero do novo coronavírus. Segundo o ministro, a pandemia seria parte de um “plano infalível” chinês para dominar o mundo.

“Geopoliticamente, quem pode Lá saiL foLtalecido, em teLmos Lelativos, dessa cLise mundial? PodeLia seL o Cebolinha? Quem são os aliados no BLasil do plano infalível do Cebolinha paLa dominaL o mundo? Se Lia o Cascão ou há mais amiguinhos?”, escreveu o ministro, trocando aletra“r” por “l”, tal qual o personagem de Mauricio de Sousa.

Em resposta, a embaixada chinesa disse que o ministro, “ignorando a posição defendida pela parte chinesa em diversas gestões, fez declarações difamatórias contra o país em redes sociais, estigmatizando Pequim ao associá-lo à origem da Covid-19”:

“Deliberadamente elaboradas, tais declarações são completamente absurdas e desprezíveis, que têm cunho fortemente racista e objetivos indizíveis, tendo causado influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais China-Brasil ”, continua a nota, afirmando que o lado chinês manifesta“forte indignação e repúdio”à atitude. Procurado pelo GLOBO, o Itamaraty disse que não ia comentar.

‘GABINETE DE ÓDIO’

A embaixada disse ainda que a maior urgência neste momento, frente à proporção da pandemia de Covid-19, é unir os países em uma “proativa cooperação internacional para acabar com a pandemia com a maior brevidade, com vistas a salvaguardar a saúde pública mundial e o bem-estar da Humanidade”. O comunicado cita também as recomendações da OMS que se opõem à associação de vírus a um certo país ou uma certa região.

Mesmo tom foi adotado pelo embaixador chinês, Yang Wanming, que disse aguardar “uma declaração oficial do lado brasileiro” sobre as palavras de Weintraub.

Respondendo aos chineses em entrevista a José Luiz Datena, da Rádio Bandeirantes, Weintraub rebateu as acusações de racismo, afirmando não considerar que sua publicação tenha sido ofensiva. O ministro vinculou um pedido de desculpas à venda dos aparelhos por preço de custo.

— Dado que a embaixada chinesa ficou tão ofendida, e e usei como é a negociação dos chineses, esse processo cultural (...) eu vou fazer o seguinte, meu acordo: eu vou lá, eu peço desculpas e falo “por favor, me perdoem pela minha imbecilidade”. A única condição que eu peço é dos 60 mil que eles já estão disponível, os respiradores, eles vendam mil respiradores para o MEC para salvar vida de brasileiro pelo preço de custo —disse Weintraub.

O presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara, o deputado federal Fausto Pinato (PP-SP) repudiou as declarações de Weintraub.

“Trata-se de uma pessoa despersonalizada que se presta ao papel de postar em rede social o que manda o gabinete do ódio do Planalto. Eis aí mais uma delas”, disse o deputado.

‘INSULTO MALÉFICO’

Este é o segundo impasse diplomático em menos de um mês gerado por representantes do governo brasileiro com a China. No dia 18 de março, Eduardo Bolsonaro fez postagens em que responsabilizava o governo chinês pela pandemia de coronavírus, comparando-o com o governo soviético no desastre nuclear de Chernobyl, em 1986, quando as autoridades esconderam inicialmente o desastre. Em resposta, o embaixador Yang disse que Eduardo “contraiu um vírus mental” durante a viagem do presidente Jair Bolsonaro à Flórida e chamou as postagens de um “insulto maléfico contra a China e o povo chinês”.

“Tais declarações são absurdas e desprezíveis, com cunho fortemente racista e objetivos indizíveis”

Embaixada da China, em resposta a Weintraub