O Estado de São Paulo, n.46201, 15/04/2020. Economia, p.B4

 

‘Salário de servidor deve ser congelado’

Francisco carlos de Assis

Eduardo Rodrigues

15/04/2020

 

 

Para Adolfo Sacshida, secretário da Economia, congelamento deveria ser por dois anos; Maia quer que a proposta venha do Executivo

Opinião. ‘O exemplo tem de vir de cima’, defende Sacshida

O secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sacshida, defendeu o congelamento do salário de servidores públicos por dois anos porque o “exemplo tem de vir de cima”.

Para ele, a medida teria um aspecto moral ao demonstrar que todos estão dando sua parcela de contribuição neste momento de crise. “Não é tão complicado assim você passar um ou dois anos sem reajuste. E a inflação está baixa”, disse ontem. “O desemprego está subindo a passos largos. Será que está correto algumas pessoas manterem seus empregos e não perderem salário?”, questionou o secretário durante uma transmissão da XP Investimentos.

O questionamento de Sacshida coincide com o momento em que mais de 1 milhão de trabalhadores da iniciativa privada já tiveram redução de jornada e salários ou os contratos suspensos. Essas medidas foram permitidas pelo governo para que as empresas mantenham fôlego para atravessar este momento de crise, acentuado pela pandemia do novo coronavírus.

“O exemplo tem de vir de cima, temos de ter ajustes além dos econômicos”, criticou o secretário de Acompanhamento Econômico. Para ele, não se trata de cortar salários dos servidores, mas que não é complicado um funcionário que inicia na carreira ganhando R$ 30 mil por mês ficar dois anos sem reajuste salarial.

À noite, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, afirmou que que os servidores públicos federais “aceitarão o sacrifício” de ficar sem reajuste num momento de crise. Segundo ele, não haverá queda de salário, mas freio em qualquer aumento nominal.

“Estamos em crise muito séria, mais de um milhão de trabalhadores no setor privado já foram afetados (por medidas de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato). No setor privado está tendo queda salarial”, disse Mansueto em transmissão promovida pelo portal Jota.

Ele lembrou ainda que os servidores das categorias com salários mais elevados tiveram reajustes entre 2016 e 2019 mesmo com um cenário já de crise.

No início do mês, o ministro da Economia, Paulo Guedes, também defendeu o congelamento dos salários dos servidores por dois anos, em videoconferência com parlamentares da bancada do DEM. Antes, no Fórum Econômico de Davos, em janeiro, disse que a iniciativa, que consta da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) emergencial, que tramita no Congresso, seria importante para controlar a situação fiscal.

Embora integrantes do governo defendam publicamente a ideia, o Executivo ainda não enviou ao Congresso uma proposta nesse sentido.

Barriga de alguel. Ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), disse que o Congresso aceita discutir a proposta desde que seja de iniciativa do Executivo. Para o presidente da Câmara, o presidente Jair Bolsonaro não quer enviar a proposta ao Congresso. “Isso tem de ficar claro para a sociedade”.

“Há uma medida provisória dando recursos a Estados e municípios sobre o FPE (Fundo de Participação dos Estados) e FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Não tem nenhuma contrapartida aqui. Por que o presidente da República não assinou o congelamento de salário dos servidores públicos? Estamos prontos para votar a proposta do governo. O que o governo não pode é tratar o Parlamento como barriga de aluguel.”

Antes de falar em congelamento de salários, o governo prometeu enviar proposta para reformular o RH do Estado, com redução no salário de entrada dos funcionários e corte no número de carreiras, entre outros pontos. Bolsonaro chegou a pedir que o texto fosse “light” e que as novas regras só valessem para os futuros servidores. A chamada reforma administrativa, porém, foi colocada de lado pelo governo em meio ao agravamento da crise.