Correio braziliense, n. 20796 , 30/04/2020. Economia, p.7

 

Rombo de R$21,2 bi em março e piora em abril

Rosana Hessel

30/04/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Governo central registra declínio expressivo nas contas de março, resultado R$ 10 bilhões menor porque foi adiado o pagamento de precatórios. Secretário Mansueto Almeida alerta para o próximo balanço, pois constarão os gastos extras para conter a pandemia

O governo central registrou um rombo de R$ 21,2 bilhões nas contas de março e esse número só não foi pior porque adiou o pagamento de R$ 10 bilhões com precatórios, de acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. Ele ainda fez um alerta: em abril, o resultado será bem pior.

“O deficit primário de abril será maior do que o de todo ano de 2019”, antecipou, durante videoconferência com jornalistas, ontem. Em todo o ano passado, o buraco das contas públicas do governo central ficou em R$ 95 bilhões.

De acordo com Mansueto, as despesas extraordinárias para o combate à pandemia da Covid-19 vão começar a aparecer a partir deste mês. Ele lembrou que o resultado do mês passado foi um pouco melhor do que o de 2019, porque o cronograma de pagamentos de precatórios está diferente do de 2019. Ou seja, se essa despesa tivesse sido incluída nos resultados, o saldo negativo das contas públicas saltaria para R$ 31,2 bilhões. A previsão do governo para o pagamento de precatórios em 2020 é de R$ 52 bilhões.

No acumulado em 12 meses até março, o resultado primário do governo central ficou negativo em R$ 90,2 bilhões, abaixo da meta fiscal para este ano, de um deficit de até de R$ 124 bilhões. Entretanto, Mansueto lembrou que esse objetivo não será mais perseguido devido ao decreto de calamidade pública, que permitirá o aumento de gastos emergenciais para conter os efeitos da crise da pandemia. “Vamos ter uma piora fiscal temporária”, afirmou.

Ao apresentar os dados fiscais do primeiro trimestre do ano, Mansueto adiantou que prevê um rombo de R$ 550 bilhões nas contas do governo central, que inclui Tesouro, Previdência Social e Banco Central, em 2020. Até hoje, as despesas emergenciais aprovadas pelo Congresso para o combate ao coronavírus somam R$ 253 bilhões, de acordo com os dados do Tesouro. Desse total, R$ 59,8 bilhões foram pagos pela União.

Mansueto admitiu que esses gastos podem crescer. Mas, por enquanto, a previsão dele é de um deficit primário de R$ 600 bilhões para o setor público consolidado –– ou seja, incluindo estados, municípios e estatais, “o equivalente a 8% do Produto Interno Bruto (PIB)”.

O secretário do Tesouro evitou fazer estimativas sobre nova previsão para o PIB brasileiro, mas admite que haverá queda, apesar de a estimativa oficial do Ministério da Economia ainda ser de um crescimento de 0,02% no PIB deste ano. Mansueto acredita que a nova projeção poderá ficar “muito próxima” da mediana das previsões do mercado, de -3,3%, mas evitou dar números.

Encolhimento

A receita líquida encolheu 6%, para R$ 91,7 bilhões, em março, valor que não foi suficiente para cobrir as despesas, que somaram R$ 112,9 bilhões. Mansueto admitiu que a perda de arrecadação, ao longo de 2020, deverá ser “significativa”, principalmente porque haverá frustração na receita com tributos devido à atividade econômica fraca, assim como com dividendos de estatais e com royalties de petróleo. Ele lembrou que o barril do óleo está abaixo de US$ 20, mas, nas contas do governo, ainda está estimado perto de US$ 50.

Ao ser questionado pelo Correio, o secretário do Tesouro negou qualquer tentativa do governo de tentar compensar a perda de receita com aumento de impostos. “Claramente, agora, o governo não trabalha com nenhuma estimativa ou proposta de aumento de imposto”, garantiu.

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Dinheiro da saíde não vai para empresa

Marina Barbosa

30/04/2020

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ontem que o governo não vai usar o dinheiro público que falta para a saúde e para a educação para socorrer as grandes empresas brasileiras que foram afetadas pela pandemia. É por isso que a linha de crédito esperada por essas companhias, sobretudo as aéreas e as automotivas, virá, segundo ele, dos bancos privados.

“O governo não pegará o dinheiro público, que falta para a saúde e para a educação, e simplesmente salvará as grandes empresas. Vamos tentar salvar, mas dentro de um mecanismo de mercado”, disse o ministro, em live realizada com empresários do setor varejista, ontem.

Guedes lembrou que, por conta disso, o governo se uniu a um consórcio de bancos (formado por Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Santander, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e Banco Central) para poder oferecer uma linha de crédito às grandes empresas, com faturamento anual superior a R$ 10 milhões, que tiveram forte perda de receita durante o coronavírus. Esse grupo de instituições deve atender a empresas dos setores aéreo, automotivo, energia, sucroalcooleiro e varejo não alimentício, não farmacêutico e não automotivo.

Apesar de não estar disposto a tirar dinheiro da saúde e da educação para essa linha de crédito, o governo vai oferecer uma garantia de 20% para os bancos que realizarem esses empréstimos. É uma forma, segundo Guedes, de incentivar o sistema financeiro a dar um combustível a essas empresas, que precisam de ajuda agora para se manterem vivas e poderem voltar a operar no pós-coronavírus.

No final da tarde, Guedes e Braga Netto apareceram lado a lado e se esforçaram para negar que haja conflito entre eles. “É o homem que tem que compatibilizar todos os programas setoriais. Independentemente dessa crise, todo ministério tem projeto setorial. Ele (Braga Netto) tem que compatibilizar esses projetos”, afirmou Guedes, reconhecendo que a apresentação do Pró-Brasil, sem a presença de nenhum membro da equipe econômica, “pegou mal” no mercado financeiro.

O ministro reforçou que conhece o “caminho da prosperidade”. “O caminho da retomada é pela simplificação e pela redução de impostos. E não cavando um buraco mais fundo ainda em um governo quebrado”, sentenciou.