Valor econômico, v.20, n.4977, 08/04/2020. Política, p. A7

 

Câmara troca Plano Mansueto por auxílio emergencial

Raphael Di Cunto

Marcelo Ribeiro

Fabio Graner

08/04/2020

 

 

A tentativa dos governadores de aproveitar o Plano Mansueto para ampliar a ajuda do governo federal aos Estados e liberar a securitização de suas dívidas como forma de compensar o impacto econômico das medidas de combater ao coronavírus levou a Câmara dos Deputados a decidir adiar a votação da proposta para depois que a crise passar e trabalhar outro projeto para um auxílio emergencial e de curto prazo aos governos locais.

O projeto, elaborado pelo secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, inicialmente era voltado a adoção pelos Estados com dificuldades financeiras de medidas de corte de gastos, como congelamento da folha e salários e privatizações, em troca da ampliação da capacidade de empréstimos. Eram propostas "estruturantes" para melhorar a situação fiscal dos Estados.

O relator, deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), ampliou o projeto para abranger também o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), de modo a permitir que Goiás, Rio Grande do Sul e Minas Gerais possam aderir e suspender o pagamento de suas dívidas com a União, e que o Rio de Janeiro possa permanecer por mais tempo no programa. Além disso, permitiu que os governos com melhor situação financeira também fossem beneficiados com ampliação da capacidade de crédito.

Já havia insatifação com esses pontos, mas uma nova mobilização surgiu após o Tesouro autorizar na semana passada a securitização das dívidas dos Estados, que poderão repassar aos bancos o direito sobre esses recebíveis em troca do pagamento de um percentual. Essa autorização, porém, foi limitado a R$ 20 bilhões, cerca de 7,6% do total de dívida garantida pela União, e vinculado a renegociações de passivos, com prazo máximo de 20 anos.

Os governadores, que há anos tentam aprovar no Congresso regras para esse tipo de operação, mas esbarram na resistência do governo federal, se juntaram para pedir a inclusão do tema dentro do Plano Mansueto, com modificações em relação ao "projeto piloto" do Tesouro. Enviaram ao relator emenda para ampliar o prazo de renegociação, de 20 para 35 anos, autorizar a securitização de toda a dívida e mudar as taxas de juros mínimas.

O Tesouro Nacional é contra a proposta dos governadores. Historicamente, a secretaria resiste à ideia de securitização por motivos como o pouco desenvolvimento do mercado, que não permitiria que a modalidade gerasse redução de custos para os governos locais, e o risco de esse tipo de título derivado de uma operação de crédito concorrerem em condições privilegiadas com os papéis comercializados pelo Tesouro em mercado. Pedro Paulo também resiste à emenda.

Os governadores continuaram pressionando por mais modificações e ontem o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), decidiu suspender a votação até o fim da crise com medo de que votar o projeto agora acabasse por "distorcer as medidas estruturais e endividar os Estados no longo prazo". "Essa decisão unifica o Parlamento e dá solução de curto prazo para todos os Estados brasileiros", afirmou.

No lugar, será votado projeto emergencial, que ainda é negociado com o Ministério da Economia. A ideia é diminuir a queda na arrecadação de ICMS, principal tributo estadual, por causa da paralisação das empresas, e permitir que os governos contraíam novas dívidas para custearem o combate ao coronavírus. Vários governadores estão renegociando empréstimos ou novos financiamentos com bancos internacionais, mas dependem do aval do Tesouro para isso.

Esses percentuais ainda não estão fechados, mas Pedro Paulo sugeriu à equipe econômica que a complementação do ICMS considere a arrecadação em relação ao ano anterior e o valor da dívida de cada um dos Estados com a União que foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O governo já liberou um valor adicional para o Fundo de Participação dos Estados (FPE), mas que beneficia os menores, com menor atividade econômica local.