Correio braziliense, n. 20795 , 29/04/2020. Política, p.4

 

Depoimento à PF de Ramagem

Jorge Vasconcellos

29/04/2020

 

 

PODER » Sergio Moro vai ser ouvido pela corporação, já sob o comando do nomeado de Bolsonaro, no inquérito que apura as acusações que ele fez contra o chefe do Executivo. Gilmar Mendes estima que apurações levarão ao menos 90 dias

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu prazo de 60 dias para que o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro seja ouvido pela Polícia Federal e apresente provas das acusações que fez contra o presidente Jair Bolsonaro. A ordem está no inquérito aberto na segunda-feira, pela Corte, para apurar se o chefe do governo tentou interferir politicamente na PF para ter acesso a investigações e a relatórios de inteligência do órgão. Caso sejam confirmadas as denúncias, o comandante do Planalto poderá responder por uma série de crimes, entre eles o de obstrução de Justiça. Moro, por sua vez, estará passível de indiciamento por denunciação caluniosa e crime contra a honra se não conseguir comprovar as acusações.

A PF vai ouvir o ex-juiz já sob o comando do novo diretor do órgão, Alexandre Ramagem. Delegado federal, ele coordenou a segurança de Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018 e se tornou amigo próximo da família do presidente. Além disso, há outra pessoa próxima dos Bolsonaro em uma posição estratégica: André Mendonça, novo ministro da Justiça.

No pedido de abertura de inquérito, aceito pelo STF, o procurador-geral da República, Augusto Aras, indicou que a investigação teria como objetivo apurar o possível cometimento de uma série de crimes. Entre os delitos indicados pelo PGR estão falsidade ideológica (Sergio Moro negou ter assinado a exoneração do então diretor da PF, Maurício Valeixo, publicada no Diário Oficial); coação no curso do processo (ameaça para interferir em processo em interesse próprio); advocacia administrativa (patrocinar interesse privado diante da administração pública); prevaricação (faltar ao cumprimento do dever por interesse ou má-fé); obstrução de Justiça (tentar impedir investigação) e corrupção passiva privilegiada (deixar de denunciar um ato ilegal de autoridade superior para auferir de sua proteção).

Sem complicação

O ministro Gilmar Mendes, do STF, disse, ontem, que o inquérito sobre o caso deve ficar pronto em 90 dias. Entretanto, segundo ele, se a investigação demorar até novembro, poderá ficar sob a relatoria do ministro que Bolsonaro indicará para a Corte. Nesse mês, o atual relator, Celso de Mello, vai se aposentar. A avaliação de Mendes foi feita durante uma live.

“São depoimentos que podem ser colhidos rapidamente, eventualmente juntada de provas, comunicações… Não me parece algo que exija perícias, algo extremamente complicado, de modo que pode ser que em 90, 120 dias, isso já esteja concluído”, enfatizou o ministro.

Ao fim das investigações, se a PGR denunciar criminalmente Bolsonaro, a Câmara dos Deputados precisa autorizar o avanço do processo. Se os deputados derem o aval, o STF decidirá se recebe ou não a denúncia. Em caso de recebimento, o presidente é afastado por 180 dias, se torna réu e passa a responder a um processo criminal. Já no caso de a Câmara não autorizar o prosseguimento do processo, a denúncia fica suspensa até o fim do mandato do presidente.

Produção de provas

A fase inicial do inquérito inclui atividades como produção de provas, coleta de documentos, quebra de sigilos, oitivas de testemunhas, perícias e todas as medidas necessárias para esclarecer os fatos narrados.

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MPF pede afastamento de subprocurador

Augusto Fernandes

29/04/2020

 

 

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou, ontem, o subprocurador-geral da República Moacir Guimarães Morais Filho pelos crimes de calúnia e coação no curso de processo administrativo. O nome dele foi confirmado à reportagem por fontes junto à cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Além das denúncias dos dois crimes, apresentadas pelo MPF ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o órgão quer o afastamento imediato de Morais Filho e que ele seja proibido de se comunicar com funcionários da instituição ou de acessar as dependências da sede da PGR, em Brasília.

Segundo a instituição, ambas as denúncias narram condutas do subprocurador-geral da República que foram investigadas em inquéritos administrativos que seguem em curso. O MPF acusa Morais Filho de cometer calúnia ao imputar a uma funcionária os crimes de invasão de dispositivo informático e modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações.

Conforme essa denúncia, em pelo menos duas oportunidades ele mentiu ao dizer que a servidora utilizou indevidamente a senha funcional de uma chefe para fazer ajustes em seu próprio ponto eletrônico. “As calúnias foram apresentadas em documentos oficiais enviados pelo denunciado à Comissão de Inquérito Administrativo do MPF”, informou o MPF.

Já na denúncia por coação, de acordo com os depoimentos e documentos reunidos pelo órgão, Morais Filho teria tentado intimidar testemunhas no curso de processo administrativo por, pelo menos, seis vezes. “Nesse caso, o subprocurador-geral coagiu, mediante grave ameaça, uma ex-servidora de seu gabinete a prestar depoimento que o favorecesse em uma investigação. A pressão exercida pelo denunciado sobre a vítima foi tamanha que resultou em graves problemas psicológicos, comprovados por relatórios médicos apresentados pela então servidora”, alertou o Ministério Público. Ainda de acordo com a instituição, o inquérito administrativo investiga outras condutas de Morais Filho.

O MPF pede ao STJ, além da condenação, que o subprocurador perca a função pública. Como Morais Filho já havia sido condenado anteriormente pelo tribunal, em setembro de 2018, pelo crime de falsificação de sinal público, o MPF frisou nas novas denúncias que “é incabível a propositura de acordo de não persecução, em razão de o denunciado já ter sido condenado em outra ação penal no STJ”. Procurado pela reportagem, Morais Filho não retornou as ligações.

Frase

“As medidas cautelares são determinantes para evitar que o denunciado continue a cometer crimes dentro da instituição, utilizando-se da estrutura e dos bens públicos de forma indevida”

Trecho da denúncia do MPF