Correio braziliense, n. 20789 , 23/04/2020. Política, p.4

 

Ibaneis se alinha ao tom palaciano

Ingrid Soares

Augusto Fernandes

23/04/2020

 

 

De crítico de Bolsonaro por pregar o fim do isolamento social, governador do DF passa a aliado do Planalto e pede união entre os entes federativos para o combate à Covid-19

Um dos primeiros gestores do Brasil a decretar medidas de isolamento e paralisação de comércio e escolas, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), procurou colocar panos quentes nas relações com o Palácio do Planalto e se alinhou ao presidente Jair Bolsonaro. Tanto que foi convidado a participar da coletiva de ontem — em que foi anunciado o Plano Pró-Brasil — e falar da sua estratégia para flexibilizar o isolamento social no DF. O presidente, por sua vez, espera que outros governadores se espelhem em Ibaneis.

Por causa das medidas restritivas que tomaram, chefes de Executivo de todo o país têm sido alvo de ataques de Bolsonaro, que cobra um afrouxamento no distanciamento social para que as pessoas voltem ao trabalho. Os mais hostilizados são os governadores de São Paulo, João Doria (PSDB), e do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). O presidente disse esperar que o isolamento horizontal termine ainda nesta semana.

O alinhamento de Ibaneis com Bolsonaro ocorre após uma série de críticas que o governador fez diretamente ao presidente, por causa das medidas de isolamento social. Três semanas atrás, o chefe do Executivo do DF chegou a colocar um carro de som de frente para o Palácio do Buriti, com trechos de Bolsonaro defendendo a reabertura do comércio e, na sequência, o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, rebatendo as falas do presidente. Mandetta acabou demitido da pasta após desavenças com o chefe do Planalto sobre medidas de distanciamento social e a eficácia da cloroquina no tratamento da Covid-19.

“O momento é de muita parceria. Temos que nos unir neste momento. Não adianta Brasília se recuperar, e São Paulo continuar como está. É momento de união e respeito de todas as instituições”, disse Ibaneis, primeiro governador a comparecer à coletiva de imprensa do Executivo sobre a pandemia. Ibaneis foi um dos sete, entre 27 gestores estaduais, que não assinaram a carta aberta conjunta contra as declarações e críticas feitas por Bolsonaro referentes ao Congresso.

Antes de mudar o tom de discurso, o governo do DF acionou a Justiça Federal para obter a relação completa dos exames de novo coronavírus realizados no Hospital das Forças Armadas (HFA). Os exames de Bolsonaro e de outras autoridades do governo federal foram realizados na unidade, em parceria com um laboratório privado. O presidente afirmou que os testes dele resultaram negativo para o novo coronavírus, mas até hoje não divulgou o exame. A ação do governo do DF acabou arquivada. (com Agência Estado)

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Pandemia deixa de lado a "nova política"

Jorge Vasconcellos

Luiz Calcagno

23/04/2020

 

 

Defensor de uma “nova política” durante a campanha eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro se viu obrigado a recorrer à conhecida prática do toma-lá-dá-cá na tentativa de construir uma base aliada no Congresso. Em meio à crise da pandemia, o chefe do Executivo negocia cargos aos partidos, na intenção de enfraquecer o principal desafeto no Congresso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Depois de conversar com líderes do chamado centrão, Bolsonaro recebeu, ontem, o presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), e, hoje, o do DEM, ACM Neto, prefeito de Salvador (BA).

Ao menos oficialmente, os parlamentares que conversaram com Bolsonaro negam qualquer tipo de oferecimento de cargos no governo federal ao MDB. O senador Eduardo Braga (MDB-AM), líder da maioria no Senado, frisou que o presidente não conversou sobre o assunto com a legenda, mas de toda forma, ele garantiu que o partido “não solicita, não reivindica e não indica nomes para cargos no governo”. De acordo com o senador, o encontro no Palácio do Planalto foi uma tentativa de “pacificação para enfrentar o coronavírus”. “Nós estamos tentando fazer um esforço de união para que a gente possa enfrentar esse coronavírus. Seja os efeitos dele na economia ou na área social. Queremos fazer com que o país possa se reestruturar para vencer esse desafio”, comentou Braga.

O presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), afirmou que Bolsonaro pediu o apoio do partido para a implementação de uma “agenda pós-pandemia” do novo coronavírus. Segundo Rossi, o presidente disse que gostaria de “contar com o apoio do MDB nessas questões que são importantes para o enfrentamento da pandemia e, depois, para uma agenda pós-pandemia de recuperação da economia. Está todo mundo preocupado”. Ao menos oficialmente, os parlamentares negaram qualquer tipo de oferecimento de cargos no governo federal ao MDB. “O MDB não tem nenhuma intenção de indicar qualquer cargo no governo. Esse tema não deve nem circular neste momento, porque estamos no meio de uma pandemia”, afirmou Baleia.

Para o líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB), a aproximação do presidente da República com os partidos é importante para restabelecer o diálogo entre as instituições em um momento de grave crise. “Agora, é o momento de quebrar o retrovisor, de olharmos para a frente, mirarmos o futuro. O Brasil precisa de uma agenda mínima nacional, e devemos pensar o país como um país só”, disse o líder, que se disse otimista com a reunião entre Bolsonaro e o presidente do DEM, ACM Neto.

 O presidente também se reuniu nas últimas semanas com lideranças do PL, PP, Republicanos e PSD. Ele prometeu ao PP, por exemplo, uma das vice-presidências da Caixa e o comando do Fundo Nacional de Desenvolvimento para Educação (FNDE), órgão do Ministério da Educação. Mas as articulações envolvem também o primeiro escalão do governo. Uma das hipóteses em discussão é a possível recriação do Ministério do Trabalho e a oferta da pasta ao PTB, presidido pelo ex-deputado Roberto Jefferson (RJ).