Valor econômico, v.20, n.4951, 03/03/2020. Política, p. A8

 

Alcolumbre cobra Bolsonaro, mas veto presidencial pode ser mantido

Vandson Lima

Renan Truffi

Matheus Schuch

Marcelo Ribeiro

Raphael Di Cunto

03/03/2020

 

 

Um encontro privado entre o Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o presidente da República, Jair Bolsonaro, buscou ontem reduzir a tensão entre o Executivo e o Legislativo desencadeada pelo vídeo em que o ministro do Gabinete da Segurança Institucional, Augusto Heleno, criticou o Congresso, e do vazamento de mensagens de Bolsonaro apoiando manifestações marcadas para o dia 15. Foi o primeiro encontro entre os dois depois da crise que gerou o impasse sobre a manutenção ou não do veto presidencial ao dispositivo que reforça o caráter impositivo do Orçamento.

O tom da conversa foi direto: Alcolumbre disse ao presidente que arcou com pesadas críticas de seus pares ao decidir não se manifestar publicamente sobre dois ataques diretos de membros do Palácio do Planalto ao Congresso. Heleno disse que o Parlamento faz “chantagem” com o Executivo e as manifestações previstas para o dia 15 tem o Congresso como alvo. “Essas atitudes não serão mais toleradas. O Congresso é independente e não aceitará esses ataques. Não se faz democracia pelo Twitter”, teria reclamado o senador. Bolsonaro teria ficado algo surpreso com o tom da cobrança, mas não rebateu e disse não ter intenção de esgarçar as relações com o Legislativo.

Bolsonaro conta com a vantagem, entretanto, de ser crescente o número de deputados e senadores que, mesmo não fazendo parte da base aliada do governo, anunciaram que votarão para manter a decisão presidencial de evitar que o Congresso controle mais R$ 30,1 bilhões do Orçamento - casos da presidente de Simone Tebet (MDB-MS), que preside a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, do ex-presidente da Casa, Renan Calheiros (MDB-AL) e dos líderes do Podemos, Alvaro Dias (PR) e da Rede, Randolfe Rodrigues (AP).

Nos bastidores, aumentou a percepção de que colocar sob domínio do Congresso mais uma fatia do Orçamento só interessa aos planos de poder de Alcolumbre e do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Maia, aliás, cancelou agendas que teria em uma viagem oficial a Espanha e antecipou a volta ao Brasil.

A interlocutores, afirmou que trabalhará para que o acordo celebrado, de derrubada dos vetos dentro de um acordo com o governo, seja mantido.

Em sua avaliação, uma eventual quebra do compromisso poderia gerar “novas turbulências” na relação entre os Poderes, o que poderia empacar votações de propostas consideradas prioritárias pelo Palácio do Planalto, pelo Congresso e pela equipe econômica, como as reformas tributária e administrativa.

No Senado, principalmente, não há segurança de que haja votos para reverter a decisão presidencial. No entorno de Alcolumbre, o cálculo é de que pelo menos 25 senadores querem manter o veto. Além desses, haveria entre cinco e sete senadores que não comparecerão ao Congresso essa semana por motivos diversos - alguns em missão oficial, como os que estão Fórum dos Jovens Parlamentares do Brics na Rússia. A margem assim estaria pequena para garantir ao menos 41 dos 81 votos do Senado para derrubar o veto - além dos 257 entre os 513 votos da Câmara.

Hoje, às 11h30, a bancada do MDB, a maior do Senado com 14 integrantes, reúne-se para tratar do tema. Uma posição do MDB pela manutenção do veto praticamente sepulta qualquer chance de mudança.

Na conversa com Bolsonaro, Alcolumbre questionou se os ministros não estavam comunicando o presidente dos acordos fechados, pois entendia que, ao tratar com os ministros, estava negociando com o próprio Bolsonaro. Especificamente sobre o veto do Orçamento Impositivo, Alcolumbre perguntou se o governo teria recuado do acordo para derrubada de parte dos vetos. Bolsonaro disse não haver recuo, mas que encarregou os ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, da negociação.

A cúpula do Congresso acredita que um eventual entendimento poderia representar uma “virada de página” em relação à crise entre poderes, diminuindo a força das manifestações pró-governo do dia 15.

Interlocutores do presidente avaliam que ele sofrerá desgaste independentemente da posição que adotar. Se cumprir o acordo com o Congresso, o presidente irá decepcionar seus apoiadores que consideram os parlamentares “chantagistas”. A ideia de testar forças com o Congresso não está descartada, mas auxiliares d e Bolsonaro já o alertaram para o risco disso comprometer projetos futuros que são fundamentais para o desenvolvimento do governo.