O globo, n. 31670, 22/04/2020. Especial Coronavírus, p. 7

 

Manaus pede ajuda

22/04/2020

 

 

Prefeito fala em caos funerário

MICHAEL DANTAS/AFPVista aérea. Área do Cemitério Parque Tarumã, em Manaus, construída para receber vítimas do novo coronavírus; prefeitura está fazendo valas comuns

 

 O colapso instalado no estado do Amazonas nas últimas semanas em função da pandemia de coronavírus agora não se limita mais aos hospitais e chegou ao sistema funerário.

Com o sistema público de saúde com mais de 90% de ocupação e um cemitério superlotado em Manaus, a prefeitura da capital amazonense anunciou ontem que está fazendo valas comuns para enterrar vítimas de coronavírus e que a presença nos enterros, realizados de maneira coletiva, está restrita a cinco familiares ou amigos de cada vítima.

De acordo com a administração municipal, o volume diário de enterros mais do que triplicou: eram 30, foram a 80 na semana passada e ultrapassaram cem no domingo. Em meio ao cenário devastador, o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), afirmou ontem que o Amazonas está pedindo socorro.

De acordo com dados divulgados ontem pelo Ministério da Saúde, o Amazonas tem 2.270 casos, com 193 mortes — 1.809 pacientes estão em Manaus, que já registrou 163 óbitos.

 ‘FALÊNCIA NO SISTEMA’

A taxa de letalidade no estado é de 8,5%, acima da média nacional, que está em 6,3%. O reflexo é observado no que Virgílio chamou, em declaração à TV Globo, de “caos funerário” e “falência no sistema de atendimento”.

Em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo”, o prefeito disse que há um percentual elevado de pessoas morrendo dentro em casa em Manaus, o que, para ele, é mais um sinal do colapso provocado no estado pela pandemia de Covid-19.

— O Amazonas pede socorro. SOS Amazonas. Aceitamos voluntários, médicos, aparelhos que estejam em bom funcionamento ou novos —disse o prefeito.

Em reunião com o vice presidente Hamilton Mourão, na segunda-feira, Virgílio pediu ao governo federal o envio de 15 aparelhos de tomografia, medicamentos e aparelhos de proteção individual, como máscaras. Segundo um comunicado da prefeitura de Manaus, Virgílio afirmou a Mourão que a situação do

Amazonas é de abandono e que não é possível mais aguardar “planejamentos para daqui a 15 dias”. O encontro aconteceu na capital do Amazonas.

À “Folha”, o prefeito se queixou ainda de uma declaração de Jair Bolsonaro, em que o presidente foi questionado sobre o número de vítimas do coronavírus e respondeu que não era coveiro.

— Não sei se ele serviria para ser coveiro. Talvez não servisse. Tomara que ele assuma as funções de verdadeiro presidente da República. Uma delas é respeitar os coveiros — afirmou Virgílio, que também se disse contrário à presença do presidente em aglomerações.

 PEDIDO DE INTERVENÇÃO

Segundo a Secretaria de Saúde do Amazonas, a rede pública está com 96% de ocupação, levando-se em consideração os leitos clínicos e intensivos. Em uma transmissão ao vivo numa rede social, a secretária de Saúde, Simone Papaiz, disse que o governo vai ampliar a cobertura de UTIs. Um hospital de campanha já foi erguido em Manaus.

— Para a abertura de leitos, são necessários recursos humanos, equipamentos e insumos. Temos dois desafios diariamente: trabalhar a contratação de equipe médica e, principalmente, de equipamentos, especialmente os respiradores —disse a secretária.

Em outro exemplo da situação de colapso, a Assembleia Legislativa do Amazonas aprovou um pedido de intervenção federal na saúde do estado. O documento, que tem valor simbólico, foi encaminhado a Bolsonaro, de acordo com o presidente da Assembleia, deputado Josué Neto.