Valor econômico, v.20, n.4953, 05/03/2020. Política, p. A15

 

Regina assume e prega 'pacificação'

Matheus Schuch

Fabio Murakawa

05/03/2020

 

 

Celebrada pelo presidente Jair Bolsonaro como "a pessoa certa" para comandar a cultura no país, a atriz Regina Duarte assumiu ontem a Secretaria da Cultura do Ministério do Turismo com discurso de conciliação. Após assinar o termo de posse, realçou que o convite que recebeu veio com a promessa de "carta branca" e "porteira fechada". Logo em seguida, no entanto, Bolsonaro rebateu dizendo que exercerá seu "poder de veto" quando considerar necessário.

A atriz aceitou o convite há mais de um mês e já estava coordenando a formação da equipe. "O convite que me trouxe até aqui falava em porteira fechada e carta branca. Não vou esquecer não, hein, presidente", disse, antes de bater continência para Bolsonaro e dizer que aceitava uma "missão".

Ao mesmo tempo em que elogiou a atriz, Bolsonaro fez questão de pontuar em seu discurso que, se julgar necessário, irá exercer seu "poder de veto" na pasta.

"Todos os meus ministros também receberam ministério com porteira fechada, no linguajar político, ou seja, têm liberdade para escolher seu time. Obviamente, em alguns momentos eu exerço poder de veto de alguns nomes, já o fiz em todos os ministérios", afirmou Bolsonaro. "Isso não é perseguir ninguém, é colocar os ministérios e secretarias na direção que foi tomada pelo chefe do Executivo".

As interferências do presidente já foram motivo de divergências na Cultura. O primeiro secretário a comandar a pasta, Henrique Pires, pediu demissão em agosto passado denunciando casos de censura. Ele não concordou, por exemplo, com a decisão do Planalto de suspender um edital para a TV pública com linha dedicada a produções sobre diversidade de gênero.

Depois de Pires, a pasta foi deslocada do Ministério da Cidadania para o Ministério do Turismo, onde foi assumida pelo dramaturgo Roberto Alvim. Próximo a Bolsonaro e frequentemente elogiado pelo presidente, ele foi demitido em janeiro após divulgar mensagens com apologia ao nazismo.

No discurso de posse, Regina Duarte pregou necessidade de "pacificação" com o setor cultural. Disse que sua decisão de integrar o governo teve apoio popular e prometeu empenho e criatividade para otimizar recursos e melhorar a área. "Vamos repartir com o equilíbrio as fatias do fomento [cultural]", disse. "Se a vontade de fazer é grande e os recursos são escassos, vamos passar o chapéu, sim."

Bolsonaro afirmou que "ao longo das últimas décadas, a Cultura esteve "longe de representar o que o povo queria" e "foi usada para interesses político-partidários".

A posse foi acompanhada por poucos artistas, entre elas a atriz e Maria Paula. "Ela (Regina) é uma pessoa que está certamente bem intencionada. E a gente vai ter alguma interlocução", afirmou. "A gente tem que criar pontes, ao invés de criar abismos, que é o que está acontecendo".