O Estado de São Paulo, n.46180, 25/03/2020. Política, p.A5

 

Bolsonaro ataca medidas restritivas e é alvo de panelaço

Daniel Galvão

Felipe Frazão

25/03/2020

 

 

Em pronunciamento na TV, presidente critica imprensa e ações como fechamento de escolas e comércio; capitais registram novos protestos

Durante pronunciamento em rede nacional de TV ontem, o presidente Jair Bolsonaro criticou o fechamento de escolas e comércio, além de atacar outras medidas adotadas por Estados e municípios. Ele citou a cloroquina como um possível remédio para o coronavírus, embora sua eficácia não tenha sido confirmada. Bolsonaro ainda afirmou que a imprensa é responsável por disseminar “histeria” sobre a doença e disse que, por seu histórico de atleta, não sentiria nada caso pegasse o coronavírus. “Quando muito, seria acometido de uma gripezinha, ou resfriadinho.”

Moradores de pelo menos nove capitais fizeram um panelaço durante a fala do presidente, acompanhados de gritos de “Fora, Bolsonaro”. Também houve reações no mundo político. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou que o pronunciamento foi grave e cobrou uma liderança “séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população”.

No começo da fala, Bolsonaro citou as primeiras ações do governo para proteger os cidadãos, como o resgate feito aos brasileiros na China. Disse que o que precisava ser contido naquele momento “eram o pânico e histeria e, ao mesmo tempo, traçar a estratégia para salvar vidas e evitar o desemprego em massa”. Segundo ele, essa tarefa foi cumprida “quase contra tudo e contra todos”.

O presidente acusou a imprensa de ir na contramão e espalhar “a sensação de pavor, tendo como grande carro-chefe o grande número de vítimas na Itália, um país com um grande número de idosos e com um clima totalmente diferente do nosso”. “Contudo, percebe-se que de ontem para hoje parte da imprensa mudou seu editorial. Pede calma e tranquilidade. Isso é muito bom. Parabéns imprensa brasileira, é essencial que o equilíbrio e a verdade prevaleçam entre nós”, disse.

Bolsonaro elogiou as ações do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, no planejamento estratégico de esclarecimento e atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Ao se usar como exemplo, o presidente disse que, caso ele contraísse o coronavírus, ele não sentiria nenhum efeito dado o seu histórico de atleta. Ele completou 65 anos no último sábado, faz parte do grupo de risco da enfermidade e viajou com ao menos 23 pessoas que receberam diagnóstico positivo para a doença. Há duas semanas, o Estado pede os resultados dos seus exames para covid-19, mas não obtém resposta.

De acordo com o presidente, o coronavírus “em brevemente passará”. Por isso, ele pregou o fim de restrições impostas por estados, mesmo com recomendação contrária do Ministério da Saúde. “Nossa vida tem que continuar, os empregos devem ser mantidos o sustento das famílias deve ser preservado. Devemos voltar à normalidade. Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada: a proibição de transportes, o fechamento de comércio e o confinamento em massa”.

O presidente defendeu também a reabertura das escolas, já que o principal grupo de risco é de pessoas acima de 60 anos. “Então, porque fechar escolas? São raros os casos fatais de pessoas sãs com menos de 40 anos e 90% de nós não teremos qualquer manifestação caso se contaminem”. No pronunciamento, Bolsonaro ainda citou estudos feitos pelos Estados Unidos e no Brasil com o uso da cloroquina no tratamento da covid-19.

Panelaços contra Bolsonaro foram registrados em São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Curitiba, Fortaleza e Porto Alegre.