O Estado de São Paulo, n.46173, 18/03/2020. Política, p.A4

 

Bolsonaro agora fala em "união" contra coronavírus

17/03/2020

 

 

Após citar ‘luta pelo poder’ com o Congresso, criticar governadores e ver cair apoio das redes, presidente muda tom sobre pandemia e anuncia reunião com chefes dos Poderes

O dia em que o Brasil confirmou a primeira morte por coronavírus começou com o presidente Jair Bolsonaro insistindo nas afirmações de que há uma “histeria” na forma como a pandemia está sendo tratada no País. Em entrevista a uma rádio popular, ele criticou governadores que estão determinando o fechamento de repartições públicas e recomendando que a população fique em casa para evitar o contágio em massa.

No fim da tarde, porém, o presidente adotou outro tom. Pressionado pela falta de apoio nas redes socias e pelo seu isolamento na condução da crise, o presidente disse que é preciso “somar esforços” com os outros Poderes. As mudanças aconteceram um dia após o presidente deixar de comparecer a um encontro com outras lideranças da América Latina para debater ações coordenadas para tratar a crise e a assistir os chefes do Legislativo e do Judiciário se reunirem para debater o novo coronavírus.

Ontem Bolsonaro afirmou que irá se reunir com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli.

A mudança de tom, segundo integrantes do Palácio do Planalto, é creditada à avaliação de que a narrativa de que Bolsonaro estava sendo vítima de uma “luta pelo poder” com a cúpula do Congresso não emplacou. Também pesou o fato de que monitoramento de redes sociais mostram que o presidente está enfrentando uma queda de popularidade. Segundo a empresa AP Exata, a avaliação negativa do presidente, que já vinha em queda desde janeiro, se acentuou em fevereiro e prosseguiu em março. No sábado, 62% das menções a Bolsonaro e coronavírus foram negativas. Domingo, 55% das menções foram contrárias ao presidente. Ontem, o presidente foi alvo de um panelaço em ao menos três capitais.

Desde domingo, Bolsonaro tem sido criticado por ter descumprido recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), do Ministério da Saúde e dos seus próprios médicos e ter ido a uma manifestação contra o Congresso e do Supremo no Palácio da Alvorada. O presidente recebeu ontem o resultado do segundo exame que deu negativo para coronavírus.

“Superar este desafio depende cada um de nós. O caos só interessa aos que querem o pior para o Brasil. Se, com serenidade, população e Governo, junto com os demais poderes, somarmos os esforços necessários para proteger nosso povo, venceremos não só este mal como qualquer outro!”, escreveu o presidente no Twitter. Apesar do tom mais moderado do que o utilizado nos últimos dias, em que foi criticado por médicos e políticos por ter minimizado o efeito da pandemia, o presidente chegou a comparar o coronavírus com gravidez em uma transmissão ao vivo, também feita ontem: “Vai passar, desculpa aqui, é como uma gravidez, um dia vai nascer a criança. E o vírus ia chegar aqui um dia e acabou chegando”, declarou.

Governadores. Governadores reagiram ontem à declaração de que eles podem prejudicar a retomada econômica com suas medidas para evitar a transmissão do covid-19. “Esse vírus trouxe uma certa histeria e alguns governadores, no meu entender, eu posso até estar errado, estão tomando medidas que vão prejudicar e muito a nossa economia”, disse Bolsonaro.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), disse que o presidente deveria fazer dos chefes do Executivo estadual seus aliados. “E não tratá-los como inimigos e adversários nas causas do Brasil”. O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), disse, em entrevista à CNN Brasil, que ainda não recebeu nenhum convite para conversar com o Planalto. Rui Costa, da Bahia, afirmou que Bolsonaro abriu mão de “liderar o país”. “Ele não tem uma palavra que busque unir o Brasil em torno de uma solução. Só ataca as instituições, a imprensa, os governadores. A sociedade está à beira de um colapso e o presidente disparando a metralhadora contra todo mundo.” /AMANDA PUPO, BRUNO NOMURA, CAIO SARTORI,  EMILLY BEHNKE, GREGORY PRUDENCIANO, JUSSARA SOARES, MATHEUS LARA e RICARDO GALHARDO

‘Serenidade‘

“Se, com serenidade, população e Governo, junto com os demais poderes, somarmos os esforços necessários para proteger nosso povo, venceremos não só este mal como qualquer outro!”

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE, EM UMA REDE SOCIAL

“(O coronavírus) vai passar, desculpa aqui, é como uma gravidez, um dia vai nascer a criança. E o vírus ia chegar aqui um dia e acabou chegando.”

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE, EM UMA LIVE