O Estado de São Paulo, n. 46146, 20/02/2020. Política, p. A8

 

Cid Gomes é atingido por 2 tiros no Ceará

Marco Antônio Carvalho

Isaac Oliveira

Isabela Palhares

Lôrrane Mendonça

Marcelo Godoy

Paula Reverbel

Priscila Mengue

Tulio Kruse

20/02/2020

 

 

Senador licenciado foi baleado quando tentava passar, dirigindo um trator, por portão de quartel com PMs em greve na Cidade de Sobral 

Tiros. Cid Gomes foi socorrido ao Hospital do Coração de Sobral; segundo boletim médico, ele está consciente e estável

O senador licenciado Cid Gomes (PDT-CE), de 56 anos, foi atingido por dois tiros de pistola durante um protesto de policiais militares em greve em Sobral, no interior do Ceará, ontem à tarde. No momento em que foi baleado, Cid dirigia um trator e tentava derrubar o portão de um quartel da Polícia Militar ocpupado por agentes grevistas e seus familiares. Cid foi operado no Hospital do Coração de Sobral. Até as 23h, ele estava consciente e respirava sem ajuda de aparelhos, segundo boletim médico.

O Estado apurou que Cid foi atingido por dois tiros de pistola calibre .40, arma padrão das Polícias Militares, que atingiram a região do tórax. O comando da PM do Ceará está tratando o caso como tentativa de homicídio.

No Twitter, o ex-ministro Ciro Gomes disse que seu irmão não corre risco de morte. “Espero serenamente, embora cheio de revolta, que as autoridades responsáveis apresentem prontamente os marginais que tentaram este homicídio bárbaro às penas da lei”, afirmou.

Salário. A tensão com os policiais militares e bombeiros do Ceará começou por uma demanda de reajuste salarial em dezembro. Quatro batalhões da PM foram atacados, segundo o governador do Estado, Camilo Santana (PT). As ações foram feitas por pessoas encapuzadas, mas o governo suspeita de que os responsáveis sejam policiais. Por isso, Santana solicitou ontem o apoio de tropas federais para reforçar a segurança (mais informações nesta página).

De acordo com o deputado Soldado Noelio (PROS), representante das categorias da segurança pública na Assembleia Legislativa, muitos policiais se manifestam com o rosto coberto. “Não temos como afirmar quem é o responsável por essas ações de vandalismo. Eles estão cobrindo os rostos, temendo punições por parte do governo.” Os policiais optaram por não comentar a paralisação.

Apoio. Por volta das 14h, homens que foram identificados como policiais encapuzados circularam pelo centro de Sobral ameaçando comerciantes com armas de fogo para fecharem seus estabelecimentos. O senador usou suas redes sociais para criticar os policiais em greve. “Estou chocado ao ver cenas de quem deveria dar segurança para o povo e está promovendo a insegurança, a desordem. Não consigo me conformar com isso”, disse. Em seguida, no vídeo, pediu que eleitores o recebam no aeroporto da cidade.

Ao chegar em frente ao quartel, Cid pediu que os manifestantes deixassem o prédio, usando um megafone. “Esse movimento é ilegal. Vocês tem cinco minutos para pegarem seus parentes e saírem daqui em paz. Cinco minutos.” Houve confusão. Enquanto Cid e seus apoiadores estavam de um lado do portão, homens encapuzados ficavam do outro lado.

Cid, então montou no trator e avançou contra o quartel para derrubar o portão. Os encapuzados tentaram segurar o avanço do veículos. Pedras foram atiradas e disparos ouvidos. Andando, o senador licenciado foi levado ao hospital.

O ataque ao senador gerou repercussões no governo e no mundo político. O Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que “está acompanhando a situação no Ceará”. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), divulgou nota em que disse acompanhar “com preocupação” os desdobramentos do caso.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou em uma rede social que Cid não teve “o mínimo de inteligência” para lidar com os policiais grevistas. Logo depois, a postagem foi apagada. Procurado, o deputado não respondeu porque apagou a mensagem em sua rede social.

Em nota, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública condenou o confronto. “É igualmente condenável que viaturas policiais circulem com agentes mascarados aterrorizando a população e ordenando o fechamento de estabelecimentos comerciais”, diz a nota.  

PARA LEMBRAR

POLÊMICAS NA VIDA PÚBLICA

Os 32 anos de vida pública de Cid Gomes são marcados por polêmicas. Em 2013, quando era governador do Ceará, foi filmado mergulhando em uma adutora de Itapipoca durante uma crise de falta d’água. Dois anos depois, como ministro da Educação, disse que a Câmara possuía “de 300 a 400 achacadores”. Nas últimas eleições, também criou tumulto ao dizer a um militante petista: “O Lula tá preso, ô babaca”.

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Moro autoriza envio da Força Nacional

20/02/2020

 

 

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, autorizou ontem à noite o envio da Força Nacional de Segurança Pública para o Ceará. A decisão foi tomada após o senador licenciado Cid Gomes (PDT-CE) ter sido baleado ao tentar furar o bloqueio de policiais militares em greve em Sobral. A chegada da Força Nacional está prevista para a manhã de hoje.

“Recomendo que sejam tomadas as necessárias providências para que o movimento de paralisação seja encerrado o mais brevemente possível”, escreveu o ministro no despacho.

Segundo o governador Camilo Santana (PT), um grupo de “alguns policiais” e mulheres que se apresentam como “esposas de militares” atacou quatro batalhões da PM no Estado. O secretário de Segurança Pública do Ceará, André Costa, informou que três policiais militares foram presos em flagrante por estarem furando pneus de viaturas em Fortaleza, enquanto um oficial foi conduzido à delegacia em Juazeiro do Norte por estar com um capuz no bolso e armado.

Outros 261 policiais estão sendo investigados por suspeita de participação nas ações. “Temos, sim, grupos dentro da Polícia Militar que têm praticado crimes militares e atos de vandalismo. Com essas pessoas, o Estado vai agir com todo o rigor que a lei prevê”, disse Costa.

Na Assembleia Legislativa, uma CPI foi protocolada para avaliar supostas irregularidades por associações que representam os agentes da segurança pública do Ceará. Nos últimos seis anos, elas receberam R$ 126,7 milhões, mas apenas R$ 65 milhões foram movimentados.

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

PF investiga Lula por dizer que Jair Bolsonaro é 'miliciano'

Felipe Frazão

20/02/2020

 

 

Investigação aberta a pedido de Moro conclui que ex-presidente não se enquadra em Lei de Segurança Nacional   

Depoimento. Lula foi ouvido em Brasília na Operação Zelotes

Por determinação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, a Polícia Federal abriu um inquérito para apurar declarações feitas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra o presidente da República, no ano passado. Entre elas, a de que Jair Bolsonaro é ‘miliciano’. O objetivo era investigar o petista por calúnia com base na Lei de Segurança Nacional e no Código Penal.

Na noite de ontem, porém, a PF disse que, após depoimento do ex-presidente, concluiu que a conduta do petista não se enquadra na Lei de Segurança Nacional. “Resta demonstrada a inexistência de qualquer conduta praticada, por parte do investigado, que configure crime previsto na Lei de Segurança Nacional”, disse o órgão em nota. O caso foi remetido à Justiça.

Lula foi interrogado na manhã de ontem, no Aeroporto de Brasília, nesse inquérito. O delegado quis saber a respeito de discursos que fez ao deixar a prisão, em novembro de 2019, vinculando o governo e aliados à atuação de milícias.

O depoimento à PF foi revelado pelos deputados Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do PT, e Paulo Pimenta (RS), que acompanharam Lula. “Foi claramente uma tentativa de intimidação do ex-presidente Lula”, disse Pimenta. “Essa audiência não foi divulgada porque corre em segredo de Justiça. O ex-presidente respondeu tranquilamente”, disse Gleisi.

Segundo os deputados petistas, uma das declarações abordadas no interrogatório da PF foi um vídeo gravado por Lula como mensagem ao Movimento dos Atingidos por Barragens, em novembro do ano passado. Na gravação, Lula diz que Bolsonaro é miliciano e o vinculou ao assassinato da vereadora no Rio Marielle Franco (PSOL), ocorrido em março de 2018.

“Não é possível que um País do tamanho do Brasil tenha o desprazer de ter no governo um miliciano responsável direto pela violência contra o povo pobre, responsáveis (sic) pela morte da Marielle, responsável pelo impeachment da Dilma, responsável por mentirem a meu respeito”, afirma o ex-presidente, em vídeo gravado pelo fotógrafo oficial do Instituto Lula.

Em nota, o Ministério da Justiça informou que Moro requisitou a apuração por crime contra a honra de Bolsonaro e com base na Lei de Segurança Nacional. A legislação prevê prisão de 1 a 4 anos para quem caluniar ou difamar o presidente da República “imputando-lhe fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação”. Já o Código Penal prevê pena de reclusão entre 6 meses e 2 anos.

Zelotes. Também ontem, Lula prestou depoimento na 10.ª Vara Criminal Federal, em Brasília, como réu na Operação Zelotes. Na audiência, o petista protagonizou um embate com o procurador Igor Miranda. Exaltado, Lula disse que desafiava o Ministério Público a provar que ele recebeu propina. “Estou cansado de tanta mentira, de tanta leviandade, de tantas insinuações”, declarou, em tom ríspido. “Eu sou de uma terra onde a gente nasce pobre, mas aprende a ter caráter e dignidade.” O procurador rebateu: “Como o senhor percebeu, sou negro, cresci numa periferia, mas é meu dever institucional buscar a verdade”.

O depoimento de Lula ocorreu na ação penal sobre a “venda” de medida provisória que deu incentivos a montadoras. O petista negou ilegalidades.