O globo, n.31459, 24/09/2019. País, p. 04

 

Recado do Congresso

Amanda Almeida 

Natália Portinari 

24/09/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Alcolumbre antecipa análise de vetos à lei de abuso de autoridade

Em um gesto para demonstrar a insatisfação com o mandado de busca e apreensão contra o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), pressionar o governo pela quitação de promessas e deixar a pauta limpa para votar eventuais vetos à lei que altera leis eleitorais e partidárias, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), convocou, às pressas, reunião do Congresso. O plano é tratar hoje de uma série de vetos, incluindo os feitos à lei do abuso de autoridade. Com isso, a votação da reforma da Previdência foi adiada em um dia, para amanhã.

A articulação foi feita no fim de semana, quando Alcolumbre ligou para colegas em busca de consenso sobre a derrubada de parte dos vetos à lei aprovada pelo Congresso em agosto e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no início do mês.

O presidente vetou 36 dos 108 dispositivos da norma. Entre os trechos cortados por Bolsonaro, há um artigo que torna crime decretar prisão em casos não previstos na lei, e um que prevê punição por fotografar, filmar ou permitir o registro de imagens de preso, internado, investigado, indiciado ou vítima sem consentimento, por meio de constrangimento ilegal.

Os vetos criaram polêmica no Congresso. Na Câmara, líderes do centrão pregam abertamente a derrubada desde que eles foram anunciados. O clima azedou de vez depois do mandado de busca e apreensão contra Bezerra. A ação foi autorizada pelo ministro do Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). Bezerra e seu filho, o deputado Fernando Coelho Filho (DEM-PE), foram alvo da Operação Desintegração. Os dois são suspeitos de terem recebido propina de empreiteiras por obras no período em que Bezerra foi ministro da Integração Nacional no governo Dilma Rousseff (PT).

Alcolumbre anunciou no mesmo dia, quinta-feira passada, que questionaria a ação no STF, sob o argumento de que “há um entendimento na Corte de que a operação realizada precisa ter conexão com o mandato”.

— Houve determinação de um ministro do Supremo de entrar no gabinete da liderança do governo no Senado. A liderança é um espaço do governo federal. Entre 2012 e 2014, ele não era senador, muito menos líder do governo — disse Alcolumbre, na ocasião.

LIMITE ÀS AUTORIDADES

Para além do questionamento ao Supremo, ganhou força, nos corredores do Congresso, o discurso de que é necessário um limite às autoridades, especialmente do Judiciário.

A derrubada dos vetos mira também o ministro Sergio Moro (Justiça), que, segundo Bolsonaro, o orientou sobre quais artigos deveria cortar da lei. Para parlamentares, a ação contra Bezerra contou com o apoio de Moro, que tem a Polícia Federal sob sua alçada.

Alcolumbre passou a segunda-feira tentando um consenso com líderes da Câmara e do Senado sobre quais vetos derrubar. Isso porque, para a rejeição de um veto, é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados (257) e senadores (41). E se for registrada uma quantidade inferior de votos pela rejeição em uma das Casas, o veto é mantido. No Senado, há um grupo de parlamentares que defende a manutenção dos vetos de Bolsonaro.

—A Lei de Abuso de Autoridade foi votada em 2017, em um momento tenso, conturbado, logo depois do impeachment da presidente Dilma. O Ministério Público estava denunciando mais de 20 senadores. Então aquela aprovação foi uma resposta daquela tensão — diz Otto Alencar (BA), líder do PSD no Senado, que acrescentou:

— Na minha opinião, esses vetos dão um equilíbrio.

O senador defende manter sete dos 36 vetos. Um deles é o artigo que impõe reclusão de até dois anos a quem usar algemas em um detento que não ofereça resistência à prisão, nem ameace fugir ou prejudicar sua própria integridade física.

CRÉDITOS

Ao marcar a sessão do Congresso para hoje, Alcolumbre atrasou em pelo menos um dia o calendário da reforma da Previdência. A previsão era a de que as mudanças seriam votadas hoje na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e no plenário do Senado. O adiamento para amanhã não teve como intenção única a análise dos vetos. O objetivo é também pressionar o governo a cumprir promessas feitas aos parlamentares pela aprovação da reforma.

Na mesma pauta do Congresso com o veto à lei de abuso, há um projeto apresentado pelo Executivo em agosto que abre um crédito de R$ 3 bilhões no Orçamento. O montante deve ser usado para pagar emendas e verbas extraorçamentárias prometidas a deputados pela aprovação da reforma da Previdência. Entre os senadores, a avaliação é que, para confiarem em promessas do governo, é preciso que pelo menos a fatura da Câmara seja quitada antes da votação no Senado.

Um terceiro motivo ainda levou Alcolumbre a convocar a sessão: limpar a pauta para quando Bolsonaro enviar para o Congresso eventuais vetos à reforma eleitoral, aprovada na semana passada. Isso porque os parlamentares terão tempo exíguo para análise. Para valer nas próximas eleições, a votação deve ocorrer até 4 de outubro, um ano antes.

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Em sabatina, Aras será questionada sobre Lava-Jato

Naira Trindade 

Marco Grillo 

24/09/2019

 

 

A atuação de procuradoras da Operação Lava-Jato e as diretrizes para a área ambiental estão na pauta dos senadores que vão participar, amanhã, da sabatina do subprocurador Augusto Aras, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo de procurador-geral da República. Aras será instado a responder sobre atitudes do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa em Curitiba, e a respeito de declarações, quando ainda pleiteava a indicação, de que o respeito ao meio ambiente não deve ser “radicalizado”.

Ele será ouvido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) disse que, quando conversou com Aras, ouviu que seu interesse é fortalecer a Lava-Jato. O senador, no entanto, diz que está “preocupado” com sinalizações de que a atuação da Procuradoria-Geral da República (PGR) em temas ambientais seria enfraquecida:

— Ele, mais do que ninguém, tem que sair em defesa do meio ambiente. É garantia constitucional. Isso me assusta, como senador e cidadão, quando vejo uma fala dessa (sinalizando uma flexibilização) — disse Contarato, que citou uma carta de intenções assinada por Aras, proposta pela Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure).

O documento elenca argumentos contra o aborto, em defesa da “instituição familiar heterossexual” e a favor de que registros públicos contemplem apenas os gêneros masculino e feminino.

O senador Otto Alencar (PSD-BA) afirmou que está preparando perguntas sobre a atuação dos procuradores da Lava-Jato:

—Vou perguntar o que ele acha do ativismo político do Dallagnol, de querer fazer 20 senadores no Brasil (referência a uma das conversas atribuídas ao procurador pelo The Intercept).

O líder do PT, Humberto Costa (PE), também adiantou alguns assuntos:

—Vamos questioná-lo sobre temas em que o Ministério Público (MP) tem muita presença, como a área de direitos humanos e as questões ambientais, indígenas e da terra.

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) acredita que a sessão na CCJ será tranquila:

— Não vejo sinalização de nenhuma dificuldade. A trajetória dele parece ser muito correta, de muito equilíbrio, sensatez, ponderação.