Correio braziliense, n. 20529, 07/08/2019. Economia, p. 10

 

Para Febraban, custos são altos

Hamilton Ferrari

Thaís Moura

07/08/2019

 

 

Correio debate » Presidente da entidade que representa os bancos afirma ser a favor de maior competição no mercado de crédito, mas diz que é preciso atacar itens que encarecem a intermediação financeira para fazer os juros caírem mais rapidamente no Brasil

O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, afirmou que a entidade é “100% a favor” de elevar a competição no sistema financeiro — considerada como fundamental para reduzir as taxas de juros no país —, mas que são necessárias medidas adicionais para diminuir o custo do crédito no Brasil. Para ele, reformas microeconômicas são fundamentais para remover obstáculos que impedem a queda mais rápida dos juros e do spread bancário, além de aumentar a produtividade no país.

Em palestra no seminário Correio debate: Como fazer os juros caírem no Brasil?, Portugal enfatizou que “é preciso mais do que crédito para fazer a economia crescer”. “É importante persistir na agenda de reformas macroeconômicas, como vemos agora o governo e o Congresso fazendo no caso da reforma da Previdência”, disse. Apesar de o Banco Central ter reduzido a taxa básica (Selic) para 6% ao ano, os encargos cobrados nos empréstimos continuam altos para os clientes dos bancos. Segundo o presidente da Febraban, a queda dessas taxas  pode ser acelerada por uma maior competitividade no mercado bancário, mas outros custos também influenciam os percentuais.

“Cerca de 85% do spread bancário é custo de intermediação financeira, como custos de inadimplência, tributários, administrativos e regulatórios. Nós temos que trabalhar em todos os elementos, tanto nos 15% que refltem o lucro dos bancos quanto nos 85% que correspondem aos vários custos envolvidos na atividade do emprestador”, disse Murilo Portugal.

O presidente da Febraban vê a recuperação da economia como mais lenta do que o esperado, mas está otimista quanto aos próximos anos. “Nos últimos dois anos, a economia cresceu 1,1%, e este ano possivelmente vai avançar também em torno de 1%. Mas nossa expectativa é de que haja uma aceleração no ano que vem. O mercado estima crescimento de 2%, com o processo continuando nos anos seguintes”.

Contribuição

Murilo Portugal, porém, criticou a intenção do Congresso Nacional de aumentar a Contribuição Sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos bancos de 15% para 20%. A medida foi incluída na reforma da Previdência como forma de aumentar a arrecadação do governo federal. “Não será respeitado o princípio de que quem tem mais paga mais. Será: quem é banco paga mais. Tem banco que tem R$ 10 milhões de lucro por ano. Vai pagar 45% de Imposto de Renda, enquanto empresas com o mesmo lucro anual pagam 35%”, afirmou. Na prática, segundo ele o aumento da CSLL poderá aumentar o custo do crédito, além de prejudicar as instituições financeiras de menor porte.

Questionado sobre possível insegurança política decorrente das declarações polêmicas do presidente Jair Bolsonaro, o presidente da Febraban disse acreditar que o contrário deve ocorrer. “Na minha opinião, houve uma redução da incerteza política que existia no Brasil sobre o rumo da política econômica. Entramos no rumo positivo, com uma reforma (da Previdência) muito importante, que vinha se tentando fazer no Brasil há décadas”, avaliou.

Livro discute como reduzir taxas

 

 

A Febraban está lançando a segunda edição do livro Como fazer os juros serem mais baixos no Brasil. “A primeira edição foi lançada no ano passado, quando estávamos no fim da campanha eleitoral, num quadro de indefinições na economia e na política”, afirmou o presidente da entidade, Muirilo Portugal. De acordo com o executivo, a continuidade na redução dos juros é um tema urgente para o país, mas deve ser perseguida mediante medidas que respeitem a racionalidade econômica. O livro defende ações como redução da tributação sobre o crédito e maior facilidade para recuperação de valores emprestados em caso de inadimplência dos clientes.

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É preciso atacar os verdadeiros vilões

Simone Kafruni

Gabriel Pinheiro

07/08/2019

 

 

 

 

 

A concentração bancária e a falta de concorrência não são vilãs dos juros altos. Os maiores responsáveis pelas taxas elevadas cobradas pelos bancos são a inadimplência, a complexa tributação e o custo Brasil. As constatações são do ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, que participou ontem do painel Quanto custa o dinheiro: mitos e verdades, realizado durante seminário promovido pelo Correio.

“Temos que fazer a distinção entre três tipos de vilões: os grandes, os pequenos e os falsos”, destacou. Os grandes são inadimplência elevada, excessiva e complexa tributação na intermediação financeira e o custo Brasil, que atinge todas as atividades econômicas. Os pequenos são os compulsórios e custos regulatórios. “Os falsos são concentração bancárias e falta de concorrência. Se focarmos nos falsos ou nos menores, não vamos resolver o problema.”

Loyola ressaltou a dificuldade da recuperação de créditos e da execução das garantias. “O país parte do princípio que tem que favorecer o devedor, ou seja, a insegurança jurídica permeia o processo. E é impressionante que o Brasil não tenha legislação boa a respeito de crimes eletrônicos e digitais. As perdas que os bancos têm com fraudes é uma coisa impressionante”, assinalou.

Para Loyola, é preciso ter clareza para combater o inimigo certo na busca da diminuição das taxas de juros. “É importante a construção de um ambiente jurídico que faça as garantias valerem. O Brasil é o único país do mundo que conseguiu destruir o valor da hipoteca”, afirmou. O ex-presidente do BC também disse que é uma “burrice” onerar quem está tomando crédito com imposto.

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Mercado eficiente é fundamental

Rosana Hessel

07/08/2019

 

 

 

Uma economia precisa de um mercado de crédito funcionando bem para conseguir crescer. E uma coisa depende da outra, na avaliação da economista Ana Carla Abrão, sócia da consultoria Oliver Wyman. Para ela, a correlação entre crescimento e crédito é muito clara. “Crédito causa crescimento. Se queremos aumentar a taxa de expansão e a produtividade da economia, precisamos ter um mercado de crédito eficiente e ativo”, disse.

A economista ressaltou que a cadeia de crédito precisa funcionar bem, desde a concessão até a recuperação do crédito, para reduzir os componentes que pesam na formação do spread bancário. “Se tivermos um processo que não funciona bem, o país não consegue aumentar a produtividade da economia porque aloca recursos de forma ineficiente”, explicou.

Ana Carla considerou positivo o atual potencial do mercado, que segundo ela, está “na faixa de 50% do Produto Interno Bruto (PIB) em crédito”, uma taxa parecida com os países de renda média. Ela avaliou que, neste ano, o crescimento do PIB será pequeno, mas elogiou a agenda do Banco Central para a democratização do crédito, a BC#, citada pelo presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto.

Ela destacou o cadastro positivo e o open banking como medidas que devem ajudar na redução dos juros. “O open banking tira a assimetria e permite que outros participantes tenham acesso a informações que, hoje, apenas os bancos com estrutura grande possuem”, afirmou. (TM)

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Diagnóstico complexo

Cláudia Dianni

Ingrid Soares

07/08/2019

 

 

 

 

Para o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, os bancos vão ganhar mais quando os juros caírem, porque vão emprestar mais — e com menor risco. “Não há nada parecido com a taxa de recuperação de crédito no Brasil, de apenas 13%”, disse. De acordo com o economista, os bancos brasileiros levam quatro anos para recuperar créditos, enquanto no Reino Unidos a taxa média de recuperação é de 89%, em um ano e meio.

“É muito difícil explicar para as pessoas que a Selic é 6%, mas que elas vão pagar 320% de cheque especial”. Segundo Maílson, os altos custos administrativos representam apenas 15% do spread cobrado pelos bancos (diferença entre o custo de captação e o dos empréstimos). “O resto são custos trabalhistas, tributários e regulatórios, entre outros”, afirmou.

Para Maílson, outras razões explicam a dificuldade de reduzir juros, como o baixo nível de poupança, de 16% do Produto Interno Bruto (PIB), além do risco fiscal do país, ou seja, a possibilidade de calote do setor público.

“Além disso, a segmentação do crédito reduz a potência da política monetária do Banco Central. Metade do crédito no Brasil não sofre qualquer influência da Selic”, explicou. Na opinião do economista, os juros poderiam cair à metade se não houvesse tantas modalidades de crédito com taxas tabeladas, como habitacional, rural e empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômicos e Social (BNDES).

Para ele, a insegurança jurídica é outro fator que encarece o crédito. “É difícil fazer cumprir contrato com um sistema judiciário que é pró-devedor e contra o credor. E a tributação das transações financeiras é muito alta. Não tem paralelo no mundo”.O ex-ministro se referia à cobrança de IOF, PIS e Cofins. “E o governo está sugerindo o retorno da CPMF justamente no momento em que há mais liberais por metro quadrado no Ministério da Economia. Isso é incrível”, ironizou.

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Uma injeção de competitividade, defende Barreto

 

 

Simone Kafruni

Thaís Moura

07/08/2019

 

 

 

Correio debate » Presidente do Cade é contra intervenção do Estado na economia. Para ele, a dinâmica do mercado é capaz de equalizar preços

Não há evidências de que a concentração do setor financeiro é responsável pelos altos juros praticados pelos bancos no Brasil, afirmou ontem Alexandre Barreto, presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão responsável por garantir a livre concorrência no país. Palestrante no Correio Debate sobre juros, Barreto participou do painel Concentração e competição, como ampliar a oferta a um custo menor e ressaltou que o setor precisa de uma injeção de competitividade. “Não há solução mágica”, disse.

“Não há que se falar em preços altos ou baixos, mas preço justo, que é dado pela dinâmica do mercado. Todas as tentativas do Estado de intervir na economia, por meio de tabela, congelamento, deram com os burros n’água a médio ou a curto prazo. Precisamos de competição para que a dinâmica de mercado equalize os preços”, afirmou.

Hoje, livre iniciativa e livre competição são princípios basilares, complementares, mas não andam juntos necessariamente, de acordo com Barreto. “Haverá situações em que vão entrar em choque. São situações que justificam a interferência do Estado na dinâmica de mercado”, assinalou. Entre os exemplos, ele citou a cartelização, aquisições e fusões e quando uma companhia é grande demais e pode interferir no mercado, de forma a não haver formação natural de preços.

Alguns mercados, como o setor financeiro, exigem regulação pelo Banco Central. “É uma forma do Estado intervir para fazer modulação entre livre iniciativa e o interesse público”, ressaltou. Segundo ele, Cade e BC devem trabalhar de forma coordenada, o que não ocorreu nos últimos anos. Só no ano passado, um memorando de cooperação foi assinado. “Tenho convicção de que vai render frutos daqui para frente, porque a atuação do Cade foi prejudicada, por conta da possibilidade de contestação judicial”, afirmou.

“Resolvido esse problema, acredito que haverá complementaridade dos dois órgãos. A união das duas instituições é fundamental para garantir uma injeção de competitividade no setor. Os últimos processos já indicam que Cade e BC estão mais rigorosos. Os últimos processos de grande concentração foi aquisição do HSBC pelo Bradesco e aquisição da operação de varejo do Citibank pelo Itaú. Os remédios impostos foram bem amargos”, disse.

Apesar disso, Barreto considerou que não há correlação entre concentração e nível de spread. “Não temos provas disso, mas sabemos que a redução de barreiras para entrada de novos agentes vai promover a competição. O cenário em 20 anos será completamente distinto do que o de hoje”, estimou. Ele defendeu maior inserção de fintechs no sistema financeiro nacional. “É uma tendência ultimamente. Tenho convicção de que será ainda maior ano que vem.”

O presidente do órgão recordou, ainda, a ampliação dos meios de pagamento. “Antigamente, havia duas máquinas para duas bandeiras. Hoje, há uma infinidade, uma profusão de prestadores, com custos cada vez menores para quem usa esse serviço”, ressaltou. Esse mercado, completou, mudou radicalmente por atuação do Cade e do BC, que levou à redução de custos e à melhora para o consumidor. “Na questão dos juros, vamos pelo mesmo caminho, mas repito, não há fórmula mágica.”

Bolsa fecha em alta de 2,06%

 

A sinalização de que os Estados Unidos seguirão negociando com a China, ontem, impulsionou as bolsas norte-americanas e influenciou o fechamento da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), que encerrou o pregão em alta de 2,06% aos 102.163 pontos. No mercado de câmbio a reação também foi imediata, com redução da queda. O dólar fechou praticamente estável, cotado a R$ 3,955. A expectativa de votação do segundo turno da reforma da Previdência na Câmara também influenciou positivamente o mercado.

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Concentração é considerada mito

Cláudia Dianni

Ingrid Soares

07/08/2019

 

 

 

 

Sócio da GO Associados, o economista Gesner Oliveira disse que, no Brasil, há três mitos com relação ao mercado bancário: que há excesso de concentração, que a concentração decorre dos custos de operação e que há verticalização exagerada (quando o setor é responsável pela oferta de todas a etapas da produção ou serviço). Gesner foi um dos palestrantes do painel Concentração e Competição, como ampliar a oferta a um custo menor.

“Se pegarmos um conjunto de indicadores e classificar, o Brasil está em posição média, nunca entre os mais concentrados. A concentração bancária é menor do que em vários outros setores na economia”, disse. “A participação dos três maiores setores, em segmentos, é bem mais concentrada do que no setor bancário”, afirmou.

Na avaliação do economista, o argumento, segundo o qual, a concentração no setor bancário estaria associada a custos, preços elevados e abuso de poder não é real, já que, segundo afirmou, no Brasil, o padrão não está discrepante em relação ao resto do mundo. Segundo ele, a discussão sobre concentração de mercado será mais complexa na economia digital, sobretudo no setor financeiro, o que aumenta a importância da regulação e de autorregulação, como forma de superar as falhas de mercado.

Sobre a possível verticalização, na opinião de Gesner, não há indícios de anomalia. “É natural ter um conjunto de serviços abrigado em uma instituição financeira. Estruturas verticais são presentes em vários setores, como o ferroviário, por exemplo, além do caso das petroquímicas, onde há clara necessidade de verticalização para redução de custo”, disse.

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Sem solução fácil para baixar o spread

 

 

Rosana Hessel

Gabriel Pinheiro

07/08/2019

 

 

 

Em um ambiente em que a taxa básica de juros (Selic) se encontra no menor patamar da história, 6% ao ano, o spread bancário — diferença cobrada entre a taxa de captação e os juros cobrados pelos bancos nos empréstimos — é um dos maiores desafios do governo. No spread, estão embutidos os custos administrativos, operacionais, tributários e a margem de lucro dos bancos.

Para trazer os juros no mercado brasileiro para níveis equivalentes aos praticados em países emergentes, o spread precisa ser reduzido e, de acordo com o Angelo José Alverne Duarte, chefe do Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro do Banco Central, não há uma solução fácil nessa empreitada.

“Não existe bala de prata para reduzir o spread bancário”, afirmou. Segundo ele, é necessário um conjunto de medidas e um “trabalho longo de aperfeiçoamento de regras” nessa direção. E isso, segundo ele, vem sendo feito pela autoridade monetária junto aos órgãos reguladores do mercado de capitais, do governo e do Legislativo. “É um trabalho de formiguinha”, resumiu.

O técnico citou como exemplo desse trabalho a aprovação do cadastro positivo pelo Congresso  cujo projeto foi defendido pelo BC desde a concepção. A medida, lembrou Duarte, tem como objetivo reduzir as taxas de juros no mercado para os bons pagadores. O executivo do BC reconheceu que o aumento da concorrência é importante para que os juros caiam no mercado. Ele lembrou que a concorrência bancária vinha aumentando desde 2005, 2006, porém, com a crise a partir de 2014, esse processo foi interrompido.

Segundo o executivo, naquela época, muitos bancos tiveram que sair do mercado, mas a tendência é melhorar. O surgimento de bancos digitais e fintechs, “dada a devida regulamentação”, devem contribuir para que os juros caiam no país, no entender de Duarte.